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Publicada em 03 de Outubro de 2024 às 21:53

Propósito do sommelier é ser elo entre produção e consumo

Caroline Dani está à frente da Associação Brasileira de Sommelier

Caroline Dani está à frente da Associação Brasileira de Sommelier

/Cesar Silvestro/Divulgação/JC
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Roberto Hunoff
Roberto Hunoff Jornalista
A biomédica Caroline Dani, que tem origem em família de vitivinicultores de Flores da Cunha, cidade onde nasceu e reside, está à frente, desde abril deste ano, da Associação Brasileira de Sommelier (ABS-RS). A entidade tem foco na formação de profissionais para atuar como elo entre produção e consumo, visando difundir conhecimentos para criar novos consumidores e contribuir no desenvolvimento do setor. Em média, forma quatro turmas de sommeliers por ano, duas no formato online e duas presenciais, totalizando em torno de 200 alunos. Também oferece edições de masterclass, módulos temáticos e, recentemente, criou um curso de harmonização.
A biomédica Caroline Dani, que tem origem em família de vitivinicultores de Flores da Cunha, cidade onde nasceu e reside, está à frente, desde abril deste ano, da Associação Brasileira de Sommelier (ABS-RS). A entidade tem foco na formação de profissionais para atuar como elo entre produção e consumo, visando difundir conhecimentos para criar novos consumidores e contribuir no desenvolvimento do setor. Em média, forma quatro turmas de sommeliers por ano, duas no formato online e duas presenciais, totalizando em torno de 200 alunos. Também oferece edições de masterclass, módulos temáticos e, recentemente, criou um curso de harmonização.
"O que mais se ouve quando as pessoas nos procuram para fazer o curso é que querem fazer por hobby. Ao final, 80% manifestam interesse em empreender na área, pois descobrem que são muitas as oportunidades", relata a sommelier.
"As pessoas dizem não gostar de vinho brasileiro porque não o conhecem, porque a nossa qualidade é muito boa. Temos a tarefa de levar o conhecimento para as pessoas e, dessa forma, ampliar o consumo."
Jornal do Comércio - Como avalias o potencial do mercado nacional para o profissional sommelier?
Caroline Dani - É um mercado muito promissor, porque a atividade vitivinícola no Brasil também é promissora. Mas tem muitos desafios. Um deles é o mercado compreender a importância deste profissional, que atua junto ao consumidor. É preciso sensibilizar o dono da vinícola, do hotel, do restaurante e das demais atividades envolvidas na cadeia que o sommelier auxilia o cliente a entender o porquê de consumir vinhos e ter a melhor experiência. Acredito muito no vinho nacional. A gente tem uma joia na mão, desde que saibamos lidar com isso tudo. Precisamos mudar algumas coisas, inovar em outras. Uma das principais mudanças é a cadeia como um todo entender a importância do sommelier.
JC - Já existe a compreensão da importância do sommelier na cadeia do vinho?
Caroline - Estamos começando a entender. Um avanço é que todo mundo já sabe o que é, mas ainda não tem a ideia consolidada da importância do profissional para a cadeia global. Alguns estabelecimentos têm isso claro, mas falta o entendimento para toda a atividade. Todo mundo tem ideia de como esse profissional pode ajudar no seu negócio, mas ainda não está convencido de que o investimento necessário se justifica.
JC - De que forma o sommelier contribui na venda de um vinho ou derivados?
Caroline - Ele vai orientar o cliente sobre o vinho mais adequado para o prato que o cliente está escolhendo. A harmonização é fundamental para que a pessoa tenha uma boa experiência e, em nova ida ao restaurante, continue consumindo vinhos. Além disso, o sommelier também tem como atribuição montar a carta de vinhos, adequando ao cardápio do restaurante; fazer uma prospecção no mercado dos produtos mais apropriados e, ainda, cuidar da conservação da bebida de forma que ela não perca a sua qualidade. Além de atuar como consultor, orientando outras empresas envolvidas no segmento. É uma atividade voltada a ajudar a vender o vinho, mas também de evitar que o estabelecimento tenha prejuízos com escolhas mal feitas. O sommelier tem o papel de traduzir o que o enólogo elaborou para o cliente consumir. O propósito é ser o elo entre a produção e o consumidor.
JC - Ainda há um certo preconceito com o vinho nacional?
Caroline - As pessoas dizem não gostar de vinho brasileiro porque não o conhecem, porque a nossa qualidade, de uma forma geral, é muito boa. Temos a tarefa de levar o conhecimento para as pessoas e, dessa forma, ampliar o consumo. Os espaços vão ser criados na medida em que a gente levar esse conhecimento. Mesmo aqui na região tem gente com pouco conhecimento sobre vinhos. É uma imensidão de oportunidades, mas a gente precisa trabalhar o setor para entender isso. Acho fundamental contar a história do vinho. São mais de 20 mil famílias envolvidas, algumas há mais de um século. A gente precisa aprender a contar melhor esta história, deixar de ter vergonha de mostrar o trabalho. É o caso do vinho de mesa, que é a base da atividade e sustenta a produção de finos. É preciso conhecer as diferentes variedades, reconhecer o setor como um todo e contar esta história.
JC - Qual o perfil do interessado pelo curso da ABS?
Caroline - O que mais se ouve quando as pessoas nos procuram é que querem fazer por hobby. Ao final do curso, 80% manifestam interesse em empreender na área, pois descobrem que são muitas as oportunidades. Ainda estamos engatinhando nesse processo inicial de convencimento do consumidor. Nos últimos anos, o setor melhorou muito a qualidade do vinho, mas o cliente ainda não tem esta compreensão consolidada. Existe um mercado muito grande a ser explorado e com grande potencial. Precisamos é trabalhar o consumidor e o sommelier tem papel fundamental neste processo.
JC - Como é estruturado o curso de sommelier?
Caroline - A Association de la Sommellerie Internationale, a ASI, com sede na França, chancela uma entidade por país para a realização dos cursos. Aqui é a ABS-Brasil, da qual a ABS-RS é afiliada. Por isso, é a única instituição no Estado que pode chancelar cursos oficiais. Existem outros, mas sem a chancela da ASI. Importante registrar o entendimento da ASI de que o sommelier não é apenas um profissional de vinhos e derivados, mas também de outras bebidas e serviços. Desta forma, o currículo original do curso sofreu mudanças. Agora, também tratamos de outras bebidas como cervejas, destilados e não alcoólicas, além de ênfase maior em serviços e harmonização. O serviço é considerado muito importante neste novo momento da profissão. E temos autonomia de criar outras ferramentas para ampliar os conhecimentos.
JC - A oferta atual de sommeliers profissionais supre a demanda do mercado brasileiro?
Caroline - Já temos um número considerável de pessoas e a busca pelo curso é constante. O primeiro curso foi em 2015 e era anual. Com a pandemia, surgiu a ideia do curso online, que hoje é o carro-chefe. Ele nos possibilita ter alunos em todo o Brasil. Desenvolvemos uma tecnologia que nos permite enviar amostras fracionadas de vinhos para que os alunos também degustem, além do acesso ao conteúdo teórico. A aula é ministrada ao vivo e fica disponível gravada. Acabou sendo um diferencial e hoje temos uma demanda muito boa de alunos. Em março, formamos o milésimo sommelier. A nível de Brasil, o mercado é muito próspero, porque se vê cada vez mais o surgimento de novas áreas de produção vitivinícola. Vejo uma demanda cada vez maior e, aqui na região, vinícolas estão sendo abertas, bem como novos receptivos.
JC - A profissão já é valorizada financeiramente?
Caroline - No serviço de salão, na ponta, ainda não. Mas existem atividades em que os salários são mais elevados por conta de comissionamento. Vejo como promissora a questão da informação que o profissional tem e pode difundir no mercado por meio de cursos, material informativo e canais de comunicação. De fato, o papel do sommelier é levar esse conhecimento. Neste ponto está a maior valorização. O Brasil tem um consumo per capita de 2,5 l de vinhos; os Estados Unidos, 12 l. Para aumentar este indicador temos de agregar novos consumidores. E isto só vai ocorrer com conhecimento, que passa pelo sommelier. O consumo vai se dar porque o cliente entende do produto. E a continuidade ocorre pela curiosidade em conhecer novos paladares, que é algo que o setor vinícola tem grande capacidade de oferecer pela diversidade de variedades e processos de elaboração. As pessoas se perpetuam no setor pela novidade.
JC - O sommelier pode contribuir na elaboração de um vinho?
Caroline - Sim, o vinicultor precisa entender o que o consumidor quer e, por muito tempo, essa leitura não existiu. A ideia era colocar no mercado o que se achava adequado. É o caso da Austrália, que elaborava vinhos tinto potentes. Hoje, é um dos que mais sofre com queda de consumo. O que mais sobe são os espumantes. O que fez a Austrália? Está buscando novas regiões para produzir base para espumante. Não adianta produzir o que eu quero, é preciso produzir o que consumidor vai comprar. Aí vem um papel muito importante do sommelier. Hoje não se vende mais o vinho só porque ele é bom, porque a maioria tem qualidade. O que vende é a história que a vinícola vai contar, porque escolheu fazer tal vinho de determinada forma. E quem ajuda a fazer isto, bem como elaborar a ficha técnica adequada, é o sommelier. Esse profissional é quem vai convencer a compra pelo consumidor e também pelo revendedor. Hoje precisa ter gente especializada, até porque as vinícolas, especialmente as grandes, têm vinhos de entrada e premium. Este profissional deve estar capacitado para explicar para o consumidor porque aquele vinho tem um valor agregado. Mas jamais interferir na função do enólogo, são atividades que devem se complementar.
JC – O sommelier não é uma atividade limitada a oferecer ajuda na harmonização do vinho. O profissional chega ao mercado com este entendimento?
 
Caroline - Já chega com essa visão. No curso online temos um público que atua, por exemplo, no mercado em diferentes setores, principalmente grandes redes mercadistas. As empresas e as próprias vinícolas nos procuram para capacitar profissionais com este perfil. No curso se trabalha muito o conhecimento por meio de diferentes ferramentas, o que leva à compreensão de que uma das funções é trabalhar no salão, mas que existem diversas outras oportunidades no mercado.
 
JC – A ABS-RS tem outras atividades de promoção do vinho?
 
Caroline - Temos como grande objetivo divulgar a cultura do vinho. A gente quer fazer essa interlocução entre os diferentes atores do setor. Além de cursos temáticos, de harmonização e masterclass, temos atividades gratuitas para participação de consumidores interessados em desenvolver mais o seu conhecimento. A ideia é instigar as pessoas a pensar um pouco fora da caixa. Temos um evento anual para premiar pessoas e estabelecimentos que contribuem com o desenvolvimento do vinho gaúcho. Neste evento promovemos um leilão de vinho elaborado conjuntamente por vinícolas e parceiros. Cada uma traz um lote do seu melhor vinho. É um trabalho voluntário que tem o valor arrecadado repassado para uma instituição assistencial. A entidade também organiza o concurso de escolha do melhor sommelier do Rio Grande do Sul com transmissão ao vivo pelo Youtube, ação pioneira, e que acabou sendo incorporada pela ABS Brasil e pela internacional para seus eventos.

Eleito o melhor sommelier gaúcho do ano

Bruno Sias Rodrigues venceu a prova final, disputada também por Lucas Manzoni Uliana e Emmanuel Vinícius Franco de Abreu, segundo e terceiro colocados respectivamente. O Concurso de Melhor Sommelier do Rio Grande do Sul é uma iniciativa da ABS-RS, que teve transmissão ao vivo, seguida de masterclass, com acompanhamento de 2,5 mil pessoas. Degustar e reconhecer vinhos às cegas e identificar líquidos servidos em taças negras faziam parte da prova. Atender a uma mesa, sugerindo aos clientes harmonizações a partir de um menu de cinco passos, sem esquecer de entretê-los com informações sobre os produtos, além de identificar erros em cartas de vinhos com rótulos de diferentes regiões do mundo também. Isso foi antecedido por uma etapa classificatória, com 12 candidatos.

Campeão e finalistas

Bruno Sias Rodrigues
Cidade de residência: Porto Alegre
Formação na área: sommelier profissional, sommelier master e certificado em harmonização essencial
Atuação: sommelier e consultor de uma importadora de vinhos
Lucas Manzoni Uliana
Cidade de residência: Monte Belo do Sul
Formação na área: tecnólogo em gastronomia, sommelier profissional, sommelier master e certificado em bartender, mixologia e harmonização essencial
Atuação: sommelier e supervisor de varejo de vinícola
Emmanuel Vinícius Franco de Abreu
Cidade de residência: Bento Gonçalves
Formação na área: enólogo e sommelier profissional
Atuação: sommelier no setor de adega de um supermercado

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