A produção de vinhos de mesa, também conhecidos como comuns, elaborados a partir de uvas americanas, e a venda a granel foram, no passado, as principais linhas de atuação da maioria das cooperativas do setor no Rio Grande do Sul. Situação que foi se alterando ao longo dos últimos anos com o reposicionamento das organizações, que passaram a investir em tecnologias, a incentivar os cooperados a diversificarem as variedades plantadas e a mudar, radicalmente, o portfólio de produtos, priorizando o envase em garrafas e lançamentos de maior valor agregado, como vinhos finos e espumantes, em linha com o comportamento do mercado.
Hélio Marchioro, diretor executivo da Fecovinho (Federação das Cooperativas Vinícolas do Rio Grande do Sul), que reúne sete associadas, recorda que o advento do Ibravin (Instituto Brasileiro do Vinho), em 1998, foi fundamental no reordenamento das organizações, que, atualmente, na sua avaliação, respondem por um terço do segmento vitivinícola gaúcho. As associadas são a Alfredochavense, de Veranópolis; Paraíso, de Dois Lajeados; São José, de Jaguari; São João, de Farroupilha; Nova Aliança, de Flores da Cunha; Garibaldi e Cooprado, de Antônio Prado. A Cooperativa Aurora não integra mais a entidade.
Com a extinção do Ibravin, em outubro de 2019, a atividade vinícola passou a ter o suporte técnico e financeiro do Consevitis (Instituto de Gestão, Planejamento e Desenvolvimento da Vitivinicultura do Estado do Rio Grande do Sul). "O setor estabeleceu metas e as cumpriu. Investiu em inovação e tecnologias, em produtos diferenciados, na promoção do setor e em exportações. Junto ao viticultor incentivou a rastreabilidade, redução do uso de agrotóxicos, maior preocupação com o manejo do solo e diversificação do plantio de variedades, bem como a mudança de práticas culturais", registra.
A mudança é percebida em um dado significativo. A venda de vinhos comuns a granel, que representava em torno de 90% da receita, foi reduzida a um patamar adequado ao mercado. Atualmente, o suco de uva já responde por 50% da produção, além do crescente volume de envase de vinhos comuns e finos, que passaram a ter maior presença nas cooperativas, bem como de espumantes brut e moscatel. "Há um empenho forte do setor em seguir na agregação de valor, priorizando qualidade e controle desta. A meta é elevar ainda mais este patamar", assinala. Uma medida foi a criação de uma central concentradora de sucos, envolvendo quatro cooperativas, que também se tornou uma forma de controlar estoques excedentes. No momento, o grupo prepara ações para ampliar a produção para outras frutas.
Marchioro cita que, em paralelo, as cooperativas também têm trabalhado mais o mercado, especialmente aquele voltado ao turismo. Além de estruturas próprias para receber os visitantes, as organizações têm buscado maior proximidade com restaurantes, hotéis e promotores de eventos. "Está se consolidando a compreensão de que a uva e seus derivados atraem visitantes, que se tornam consumidores", afirma. Outro avanço citado por Marchioro é a criação de uma forte cadeia de fornecedores nacionais de equipamentos, como tanques de aço e máquinas, que no passado eram exclusivamente importadas. "A união de todas estas ferramentas estão garantindo a retomada e o crescimento do setor", afirma.
O diretor executivo destaca a atual política da Fecovinho de relacionamento com governos, nas diferentes esferas, e não mais com partidos políticos, que era comum no passado. Segundo ele, o setor agora cobra e exige, mas também propõe ações necessárias. Uma das recentes foi a elevação dos recursos do Plano Safra para os cooperados em linha com o conceito de agricultura familiar, melhorando as condições para a contratação de financiamentos. "No passado, as taxas eram de 14% a 24%, atualmente estamos com 6% ao ano", reforça.
Cita ainda as compras coletivas de insumos e a maior oferta de técnicos para assessorar os cooperados, visando não apenas a introdução de novas cepas, mas principalmente orientar sobre desperdícios. "Há um estudo indicando que se desperdiça o equivalente ao que é aplicado nas lavouras", assinala.
Hélio Marchioro defende que o setor não copie vinhos de fora e busque a identidade do terroir brasileiro, mais tropical. "Perdemos a identidade quando buscamos seguir tendências do exterior. O futuro do setor está em produtos de qualidade com identidade", reforça. Na avaliação do executivo, a maioria dos brasileiros ainda consume vinhos importados por desconhecer o produto nacional. "Este é um desafio para o setor, tornar-se mais conhecido internamente, além de buscar espaços no exterior", define. Como ferramentas para esta conquista de mercado, Marchioro defende inovações não apenas no conteúdo das bebidas, mas também nos modelos e cores das garrafas, rótulos mais adequados ao tropicalismo brasileiro, descobrir o mercado turístico e quebrar o paradigma de que brasileiro não consome vinho no verão.