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Publicada em 01 de Agosto de 2024 às 19:04

Lider da Colarinhos Caóticos, Egisto Dal Santo é uma mente inquieta do rock gaúcho

Conhecido por liderar a banda Colarinhos Caóticos, músico tem ampla carreira como compositor e produtor, sendo considerado um dos principais agitadores do cenário rock gaúcho

Conhecido por liderar a banda Colarinhos Caóticos, músico tem ampla carreira como compositor e produtor, sendo considerado um dos principais agitadores do cenário rock gaúcho

LUIS VIEIRA/DIVULGAÇÃO/JC
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Daniel Sanes
Autêntico. Visionário. Um louco maravilhoso. Os adjetivos usados pelos amigos para se referir a Egisto Dal Santo dão uma ideia da personalidade desse artista, que comemorou 60 anos no dia 25 de julho.
Autêntico. Visionário. Um louco maravilhoso. Os adjetivos usados pelos amigos para se referir a Egisto Dal Santo dão uma ideia da personalidade desse artista, que comemorou 60 anos no dia 25 de julho.
São quatro décadas de carreira, e um ritmo de produção impressionante. Sua assinatura está presente em algumas das principais obras da música gaúcha contemporânea. Só de discos autorais, são 34 - e contando.
Multi-instrumentista, Egisto se destacou liderando a banda Colarinhos Caóticos, mas integrou várias outras, como Acretinice Me Atray, Spacequera, Elektra (com Edu K), Groo Brothers e Benedyct Di Eskine. Com O Bando dos Ciganos, acompanhou Bebeco Garcia, ex-Garotos da Rua. Como produtor, foi o responsável por A Sétima Efervescência (1997), obra-prima de Júpiter Maçã. E, como se isso tudo não bastasse, abriu espaço para a música independente em diversas coletâneas e no saudoso projeto Segunda Sem Ley.
Esse trabalho, que o consagrou em diferentes categorias do Prêmio Açorianos - melhor letrista, pela música Vacilo, além de agitador cultural e produtor musical -, tem como base princípios dos quais Egisto não abre mão. Um deles é a liberdade artística. Por conta disso, acabou perdendo o emprego no selo Antídoto, da gravadora Acit, onde produziu a estreia solo de Júpiter.
"Diziam que o arranjo de Miss Lexotan era horrível, que tava mal gravado, que eu tinha estragado o disco. O Raul Albornoz (então diretor da gravadora) falou: 'Car*** na primeira música (o hit Lugar do car***)? Egisto, tu és um idiota'. Fui despedido e saí de lá chorando de raiva, mas sabia que tinha feito um bom trabalho. Hoje todo mundo ama o Sétima, entrou até na lista dos 100 melhores álbuns da música brasileira feita pela revista Rolling Stone", ironiza.
A espontaneidade e a falta de papas na língua também resultaram em percalços ao longo da estrada - e até mesmo alguns desafetos, segundo Egisto. Mas ele não se arrepende de nada. Só lamenta o rumo que a cena tomou, com a formação de "panelinhas".
"Fiz o Segunda Sem Ley por anos, e todo mundo que quis tocar lá, tocou. Foram mais de 300 bandas, inclusive de gente que eu não gostava. Mas nunca barrei ninguém, porque entendia aquilo como um espaço cultural da cidade, não meu", avalia. "Infelizmente, o pessoal prefere separar em vez de unir."
Por todas essas iniciativas, o crítico musical Juarez Fonseca considera Egisto um artista subestimado. "Esse cara, de quem injustamente pouco se fala, é uma figura central do rock gaúcho como líder de banda, agitador cultural, produtor. Os últimos anos da vida de Bebeco Garcia não seriam os mesmos não fosse ele segurando a retaguarda", diz o jornalista.
Entre os parceiros musicais, é consenso que a ousadia e a criatividade fazem de Egisto um nome essencial para a cena. "Se a gente pensar nos fenômenos que impulsionam o rock gaúcho por década, tivemos a rádio Continental nos anos 1970, a Ipanema nos 1980, e eu diria que nos 1990 foi Egisto produzindo o Segunda Sem Ley no Porto de Elis", compara Carlo Pianta, baixista original do De Falla e guitarrista da Graforréia Xilarmônica.
Pianta chegou a ver Egisto em ação nos anos 1980, sentindo uma conexão imediata com seu trabalho. Mas foi na década seguinte, quando passou a conviver com ele (no próprio Colarinhos e durante a gravação de Coisa de Louco II, da Graforréia, em que Egisto atuou como produtor executivo), que se tornaram amigos. "Mesmo que a gente não se veja com tanta frequência, o considero um irmão. Temos algumas coisas 'dependuradas' para gravar, a qualquer momento pode acontecer."
Ex-colega do músico no selo Antídoto, a cantora Luciana Pestano define Egisto como "um cara que une as pessoas". Se aproximou dele quando foi convidada para participar do projeto Histórias do Rock Gaúcho, em homenagem aos clássicos do estilo. Depois, gravou Linda Lady, no disco Vertigens (2015), e, mais recentemente, as faixas Sorte no Amor e Não Chore por Mim, do álbum Paris Hotel (2023), só com releituras de Bebeco Garcia.
"Fico feliz da vida quando o Egisto me chama para um projeto, pois sei que vai ser algo bacana. Me identifico muito com ele, porque é um cara que não tem medo da autenticidade. Um louco maravilhoso, com a pureza e a verdade que só a loucura nos traz", elogia.
 

Tempos de Soledade

Polaroide de Egisto Dal Santo, registrada por Ananda Ferlauto em 1990

Polaroide de Egisto Dal Santo, registrada por Ananda Ferlauto em 1990

ANANDA FERLAUTO/DIVULGAÇÃO/JC
À primeira vista, Egisto Dal Santo Júnior parece um cara tímido. Mas basta falar de música para virar a chave. Embora seu apartamento seja repleto de discos, fotos e cartazes de shows, a memorabília mais impressionante ali está na cabeça dele.
Em uma conversa de quase quatro horas, Egisto discorre sobre músicas, pessoas e acontecimentos com uma facilidade impressionante. E conta histórias incríveis, que, infelizmente, não cabem no espaço desta reportagem. "Disso nenhum jornalista pode reclamar. Sou uma fonte de informação violenta", provoca. É verdade. Só os primeiros anos, em Soledade, tomariam algumas páginas.
Filho de uma família de origem italiana, Egisto é o mais velho de quatro irmãos - dois homens e duas mulheres. O pai, já falecido, foi pioneiro na lapidação de pedras preciosas no Brasil e, desde 2016, dá nome ao Museu da Pedra e Mineralogia Egisto Dal Santo. A mãe, Diony, é professora aposentada, mas chegou a ser cantora de rádio. "O sonho dela era ser a Elis Regina. Agora, eu e o meu irmão, Mario, estamos produzindo um disco com coisas que ela gosta de cantar", afirma.
O avô paterno, também chamado Mario, criou a fábrica de gaitas Dal Santo. Já o pai de Egisto não tocava, mas era um grande ouvinte. "No carro, tocava tango, jazz. Nasci ouvindo Astor Piazzolla, Chet Baker e Gerry Mulligan, mas também muita MPB."
Teve aulas de piano aos oito anos, mas logo desistiu. Em parte, porque a professora não conhecia o repertório que ele queria aprender, mas também porque os colegas resolveram copiá-lo.
Já na infância, demonstrava interesse por política e filosofia. "Em casa, eu era um rebelde louco, com meu quarto cheio de coisas do (Karl) Marx", lembra. Isso não o impediu de se interessar por esportes, como skate e futebol. "Sonhava em ser jogador profissional, me dedicava mesmo."
Perto de fazer 13 anos, comprou o disco Shades of Deep Purple (Deep Purple). Depois, vieram Black Sabbath, Led Zeppelin e o que descobriu ser sua praia: o rock progressivo. Quando dois vizinhos, João Laner e Luiz Carlos "Kung" Gomes (homenageado por Egisto no disco 4 Magníficos, no qual resgata a obra de músicos pouco conhecidos), decidiram criar uma banda, o convidaram. Mesmo sem tocar nenhum instrumento, topou cantar e improvisar na percussão um repertório que incluía de Lupicínio Rodrigues a músicas nativistas.
Ao caldeirão de influências, adicionou o pop rock regional. "O Paralelo 30 foi fundamental pra eu ser músico. Ali, vi que os gaúchos podiam criar um som do mesmo nível que os caras faziam lá fora", diz, referindo-se ao álbum de 1978 que reuniu Bebeto Alves, Carlinhos Hartlieb, Claudio Vera Cruz, Nando D'Ávila, Nelson Coelho de Castro e Raul Ellwanger.
Empolgado, começou a compor. Pediu para João musicar suas letras, mas achou que ele próprio precisava fazer isso. Para tanto, tinha que aprender a tocar, o que acabou acontecendo quando ficou doente e impossibilitado de sair da cama. "Pedi pra João e Kung me ensinarem violão. Era maio de 1981, eu tinha 16 anos. Em 12 de junho, já participava de um show no salão da igreja ao lado de casa."
Com os vizinhos, criou o grupo Ventania, que não durou muito tempo. E nem teria como: àquela altura, Soledade começava a ficar pequena para as aspirações de Egisto.
 

Buscando conhecimento

Egisto Dal Santo foi comprar baixo em São Paulo e mergulhou na cena local

Egisto Dal Santo foi comprar baixo em São Paulo e mergulhou na cena local

CARLOTA PAULS/DIVULGAÇÃO/JC
Em 1982, Egisto foi cursar Jornalismo na Unisinos, em São Leopoldo. Mas a música falou mais alto. Ao assistir a um show da banda Ponto de Vista, acabou sendo convidado para tocar com eles.
No ano seguinte, porém, tudo mudou. Após um acidente automobilístico no qual os outros dois ocupantes do veículo morreram, Egisto precisou levar mais de 100 pontos no rosto e nos braços. "Foi uma coisa que me fez questionar o que queria da vida. E isso incluía a banda", reflete.
Naquele momento, escutava artistas como Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção e não queria ficar limitado ao rock. Quando viajou a São Paulo para comprar um baixo, decidiu que voltaria para desbravar a maior cidade do Brasil.
Entre 1983 e 1984, trabalhou no bar Persona, lendário "inferninho" do Bixiga. E conheceu dezenas de músicos. Um encontro marcante foi com a cantora mineira Aline (já falecida), que o apresentou ao dodecafonismo do compositor austríaco Arnold Schönberg, inspiração para a Vanguarda Paulista. Iniciou-se no vegetarianismo e na yoga e aprendeu a fazer mapa astral. "Se eu tivesse seguido carreira como astrólogo, viveria dez vezes melhor do que com música", ri.
Depois de largar o Jornalismo, tentou Psicologia. Dedicou-se também ao estudo de conhecimentos esotéricos e de diversos instrumentos. Todas essas experiências influenciariam, de alguma forma, seu próximo projeto musical.
 

Caos em forma de música

Com o Colarinhos Caóticos, Egisto (segundo à esq.) queria fazer 'a música que ninguém fez'

Com o Colarinhos Caóticos, Egisto (segundo à esq.) queria fazer 'a música que ninguém fez'

IRENE SANTOS/DIVULGAÇÃO/JC
Não é fácil classificar o som do Colarinhos Caóticos. A revista Bizz definiu o disco Introdução (1988) como uma "fusion jazz-rock caótica". "Queríamos fazer a música que ninguém fez", resume Egisto, que assumiu vocais e guitarra.
A banda foi fundada após ele conhecer o baixista Beltrão Vanini na saída de um show. "Rolou um magnetismo. Nesse dia, nos despedimos com um aperto de mãos que durou uma hora." No palco, a anarquia corria solta, com Egisto usando roupas femininas e uma performance inspirada em David Bowie.
Logo o Colarinhos começava a alçar voos mais altos, faturando o Prêmio Bizz de Revelação do Ano. Foi tocar no AeroAnta, em São Paulo, com a nata do rock brasileiro, e fez uma apresentação explosiva. Mas implodiu antes de qualquer chance de sucesso.
 “O show foi em 24 de fevereiro de 1989, uma sexta-feira. No domingo, quando ganhamos duas páginas no principal jornal do Estado, já não havia mais Colarinhos. Alvaro e Leandro (Godolphin, saxofonista, e Aragão, baterista) saíram. Nós tínhamos tudo pra ganhar o Brasil. Só que éramos uns caipiras travados, vivendo uma guerra de egos”, analisa Egisto.
Entre idas e vindas (e dezenas de formações), um novo revés. Em 1994, a banda iria gravar um disco com Carlos Eduardo Miranda. Porém, na última hora, o produtor optou por lançar a Maria do Relento, de maior apelo comercial. “Eu amava o Miranda, mas isso foi um verdadeiro balde de água fria”, admite.
 
O segundo álbum, Agora Pode Ser o Tempo Todo, só sairia em 1998. Bem mais acessível, pelo menos para os padrões da banda. Faixas como Ela Não Quis me Dá e Recuerdos misturam rock e música nativista, com direito à participação ilustre de Luiz Carlos Borges na gaita. O instrumentista ainda tocou em Ophó Nevermind e uma releitura de Deu pra Ti, de Kleiton & Kledir.
 
“Resolvi fazer músicas com potencial radiofônico. O clipe de Baby Eu Preciso rodava direto na MTV. Infelizmente, a gravadora não investiu em divulgação e o disco não teve a repercussão que poderia ter tido”, acredita Egisto, à época já trabalhando como produtor do selo Antídoto, responsável pelo lançamento. O Colarinhos ainda lançou demos, compacto, coletânea e um (derradeiro?) álbum, Ou, que conta com músicas do início da carreira, mas só foi lançado em 2019.

Projetos paralelos

Banda Elektra, com Eduk K ao centro e Egisto ao seu lado direito

Banda Elektra, com Eduk K ao centro e Egisto ao seu lado direito

KIKO CATELLI/REPRODUÇÃO/JC
Egisto nunca foi homem de uma banda só. Em Acretinice me Atray, reuniu nomes como Cléo de Paris, Astronauta Pinguim, Jimi Joe e Gelson Schneider para tocar pós-punk. Com os Groo Brothers, se arriscou no rap; com o Spacequera, no gauchesco.

Um de seus projetos mais notórios é o grupo de thrash metal Elektra, que tinha também Edu K, líder do De Falla. O único registro é o EP Welcome to Infernal Meetin’, de 1993, mas a dupla formou diversas outras bandas.

“Quando o De Falla surgiu, percebemos que éramos da mesma turma. Até mesmo quando eles resolveram mudar os nomes dos integrantes, decidimos fazer o mesmo”, diz ele, que passou a se chamar Egisto Ophodge – uma alusão à marca de automóveis Dodge, ao mesmo tempo que forçava os jornalistas a falar um palavrão ao pronunciá-lo. Depois, viraria Egisto 2 antes de voltar ao nome de batismo.

Egisto, o produtor

 Foto de divulgacao do disco Paris Hotel, de Egisto Dal Santo

Foto de divulgacao do disco Paris Hotel, de Egisto Dal Santo

TIAGO COELHO/DIVULGAÇÃO/JC
A partir das experiências de Egisto produzindo seus próprios trabalhos surgiu o convite para trabalhar na Antídoto, e, posteriormente, em outros selos, como Stop Records e Orbeat. Por meio de coletâneas como Segunda Sem Ley (aproveitando o nome do projeto) e os dois volumes de Ipanema FM - As 15 Mais, o músico deu espaço para muitos nomes que estavam despontando.
"Vi bandas boas, como Père Lachaise e Smog Fog, não irem a lugar algum. Porque ninguém tinha a malandragem. Era preciso que alguém se mexesse", explica. E Egisto se mexeu, sempre buscando o som ideal para cada artista.
O músico e produtor Vini Tonello, que já o conhecia de Soledade, recorda que começou a trabalhar com o conterrâneo durante a gravação do primeiro álbum da Tequila Baby, em 1996. "Só de discos dele, devo ter participado de uns 20", diz.
Tonello considera a inquietude uma das marcas de Egisto. No estúdio, lembra de andar com um microfone por todos os lados, a pedido do amigo, para captar a melhor ambiência. "Hoje tu colocas no YouTube e encontras 50 mil vídeos mostrando como tirar o som do Led Zeppelin. Mas naquela época não tinha isso. O cara é realmente um pesquisador."
Paulo Arcari, produtor e baterista com passagens por TNT e Cowboys Espirituais, também vê Egisto como um profissional diferenciado. "Ele está sempre aberto a novas ideias. Prova disso é o novo trabalho da cantora Stella Maris (Pra Te Lembrar, ainda não lançado), que fizemos juntos no Studio Rock. É um disco que revela muito do Egisto produtor."
 

Revendo o rock gaúcho

Pedro Garcia, Bebeco Garcia e Egisto Dal Santo

Pedro Garcia, Bebeco Garcia e Egisto Dal Santo

ANDRÉ FURTADO/DIVULGAÇÃO/JC
No currículo do produtor, há trabalhos de diversos veteranos: O Último Verão (1998), resgatando demos de Julio Reny; Deluxe (2000), do supergrupo Cowboys Espirituais - também com Reny; e a estreia solo do ex-TNT Charles Master, de 2001. Isso sem falar de Júpiter, que, ainda sob o nome Flávio Basso, fundou TNT e Cascavelletes.
Ironicamente, o rock gaúcho tradicional era o "estilo" que Egisto tentava combater no Colarinhos. Isso mudou no fim dos anos 1990, quando a banda decidiu adicionar clássicos oitentistas ao repertório de seus shows no Interior. "Tocávamos Cachorro Louco, Meu Coração Não Suporta Mais, Sob um Céu de Blues... Essas músicas arrasavam", reconhece.
Mas o verdadeiro ponto de virada foi um encontro com Bebeco Garcia, por conta do projeto do disco da Ipanema. "Aí eu mudei meu conceito, pois percebi, na hora, que estava diante de um verdadeiro rocker."
Tempos depois, Egisto locou equipamentos para uma apresentação de Bebeco na Capital e acabou participando do show. Mais tarde, quando o baixista da banda que acompanhava o músico sumiu sem dar satisfação, fez um teste para assumir o posto. Ficou com a vaga e ainda virou o braço direito do ex-Garotos da Rua até 2010, quando ele faleceu.
"Devo muito ao Bebeco. Não só pela questão financeira, mas também pela oportunidade de ter convivido com um cara tão relevante pra nossa música", afirma. A parceria gerou dividendos para ambos os lados: produzido por Egisto, Me Chamam Curto Circuito (1999) abocanhou o Açorianos de Disco do Ano e alavancou a carreira solo de Bebeco.
Essas experiências levaram Egisto a criar o tributo Histórias do Rock Gaúcho, um "negócio para garantir a sobrevivência", mas feito com conhecimento de causa. Além de shows, o projeto rendeu dois discos.
 

O ídolo fã

Egisto Dal Santo ao lado do amigo e ídolo Luis Carlini

Egisto Dal Santo ao lado do amigo e ídolo Luis Carlini

ANDRÉ FURTADO/DIVULGAÇÃO/JC
Nos palcos ou nos estúdios, Egisto conheceu muitas lendas da música. Mas jamais imaginou que um desses ídolos se tornaria seu amigo – e fã.

Certo dia, um sujeito com forte sotaque paulistano ligou para ele perguntando por Bebeco Garcia. Era nada menos que Luis Carlini, guitarrista do Tutti Frutti, banda que acompanhou Rita Lee na década de 1970.

“Ele veio no meu apartamento, abri a porta e dei de cara com aquele ‘monstro’, que eu amo desde criança. Viramos amigos na hora”, emociona-se Egisto.

Admirador do rock gaúcho de longa data, Carlini diz que se identificou com o colega por ele ser um cara com o “DNA dos anos 70”. “O Egisto tem um papel importantíssimo no resgate da música no Rio Grande do Sul. Sempre lutou pelo que gosta, com autenticidade, e continua na luta sem esmorecer. Acho isso muito louvável”, elogia. “Até hoje o chamo de Jack Bruce (baixista do Cream) e ele me chama de Johnny Winter (lenda do blues). É um grande amigo.”

Máquina de compor

Ainda criando de forma frenética, Egisto planeja lançar três discos em 2024

Ainda criando de forma frenética, Egisto planeja lançar três discos em 2024

DANIEL SANES/ESPECIAL/JC
"A minha vida é isso aqui, ó", diz Egisto, apontando para várias folhas de papel coladas em uma estante. São os repertórios dos discos que planeja gravar. Só em 2024, serão três, cada um de um estilo.
Essa produção, quase frenética, aumentou durante a pandemia. "Na minha cabeça louca, penso em lançar três discos por ano. Só não sei se vou ter grana. Por isso, talvez comece a gostar mais das plataformas de streaming", afirma.
Os mais recentes saíram em vinil pelo Purnada Ypranada (selo próprio criado ainda no início do Colarinhos) em conjunto com a ENC Records, do amigo Marcelo Otto. A parceria viabilizou o lançamento de Transe (2021) e Paris Hotel (2023).
Quem quiser conhecer o trabalho de Egisto pode procurar no YouTube ou em sua página do Facebook, que ele usa para vender CDs, LPs e até mesmo faixas avulsas no formato digital. Mais recentemente, resgatou o arquivo de seu livro Notas de Viagens – Aventuras e Desventuras no Rock Gaúcho, publicado em 2008 e atualmente fora de catálogo.
Projetos não faltam, mas se alguém ainda pretende ver o músico ao vivo, pode esperar sentado. Em março, durante apresentação no Solar dos Câmara, ele anunciou que estava se despedindo dos palcos. Egisto diz que não é bem assim, mas que só sai de casa se rolar um bom cachê e uma estrutura razoável. “Cansei de mixaria. Agora, se pintar um show decente, é só me chamar. Cheguei à conclusão de que preciso me valorizar. Talvez seja um pouquinho tarde pra isso”, debocha.
 

Egisto por Egisto

Colarinhos Caóticos ao vivo no Porto de Elis, em 1989

Colarinhos Caóticos ao vivo no Porto de Elis, em 1989

JO VIGIANO/DIVULGAÇÃO/JC
Três produções…

Introdução (1988), do Colarinhos Caóticos – “Foi instintivo chegar naquela sonoridade, mesmo sem nenhuma experiência. Tem muita pureza artística nele. Na época eu não via nada disso, só fazia. Mas já sabia que um disco é pra sempre.”

A Sétima Efervescência (1997), de Júpiter Maçã – “Porque fiz exatamente o que queria, sem nenhuma interferência – nem da gravadora, nem de engenheiros de som, nem do artista. E por trabalhar com Júpiter, que tinha absoluta confiança de que eu sabia o caminho.”

Me Chamam Curto Circuito (1999), de Bebeco Garcia – “Foi um ‘esbanjamento’ na técnica de produzir. Ninguém faz um disco desse nível em 48 horas. Eu fiz, e com ele começou uma parceria de 11 anos com o Bebeco. Fomos melhores amigos. Até mais: fomos família, mesmo.”


… e três composições

Vacilo – “Vi essa balada alucinada crescer e se desenvolver em shows até ganhar forma e ser gravada (no disco Máquina de Destruir Dinheiro, de 1994). Já era sucesso antes do álbum e me deu o Açorianos de melhor letrista. Tocou todo o verão de 1995 na Ipanema!”

Aquela Música – “Parceria com o Charles Master. Virou um clássico do rock gaúcho, que ele não toca nos shows. Hoje ela é só minha (risos).”

Eu Sei que Você Sabe – “Essa é por sua gravação original ter sido feita pelo Bebeco. Ela é simples, mas me enche de orgulho ter uma música gravada pelo maior roqueiro local de todos os tempos.”

*Daniel Sanes é jornalista formado pela Universidade Católica de Pelotas. Já foi repórter e editor no Jornal do Comércio. Hoje, trabalha na República – Agência de Conteúdo e atua como freelancer.

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