Mesmo antes da conclusão dos testes para dimensionar o impacto da inundação na pista do Aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre, a concessionária Fraport Brasil deve começar em junho a fazer a recuperação de partes do traçado que podem ter sido danificadas pela inundação. Além disso, a concessionária poderá recorrer a empréstimos de equipamentos de outros aeroportos do Brasil para acelerar a recomposição da operação parada desde 3 de maio.
As informações foram dadas nesta terça-feira (4) por Edgar Nogueira, vice-presidente de Operações da Fraport Brasil. A Fraport divulgou previsão de reabertura em dezembro, ms que é condicionada à dimensão de eventual dano à pista. A reativação de voos também será parcial. O prazo foi apresentado em vistoria com autoridades nessa segunda-feira (3) no complexo.
Nesta terça-feira, a CEO da Fraport, Andreea Pal, entregou ao ministro extraordinário de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, Paulo Pimenta, o cronograma e a estimativa de gastos para reativar o Salgado Filho. A concessionária pediu reequilíbrio econômico-financeiro do contrato à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), antevendo o rombo com o evento climático, em função do dano físico e da paralisação dos voos.
Mas tudo vai depender dos resultados que os exames sobre a pavimentação, já em andamento, vão indicar. Antes de fechar, o Salgado Filho vinha tendo entre 140 a 150 voos diários, com tráfego ascendente. Em maio, a previsão era de mais de 600 mil passageiros sendo transportados. Em abril, foram mais de 500 mil. Para julho, a projeção era de superar 700 mil, marca recorde para o complexo, que era o principal hub de aviação aérea comercial do Sul do Brasil.
Limpeza e sondagens estão sendo feitas agora na pavimentação. O Plano de Voo acessou o complexo na manhã desta terça-feira e conferiu a movimentação de equipes. A estimativa é de 45 dias de testes, o que terminaria em meados de julho, com laudo completo sobre a pista. "Se a empresa contratada entender que existe uma área que foi analisada e consiga fazer algum trabalho, vamos começar o quanto antes. Pode ser dado início (em junho)", confirma Nogueira.
A pista do Salgado Filho vinha passando por obras de revitalização desde 2023, dentro de ações normais de conservação. "Nossa pista estava quase nova. Tínhamos acabado de terminar recapeamento, pintura e grooving (ranhuras para escoar água)", diz Nogueira.
Detalhe das ranhuras (grooving) que evitam que a água fique sobre a pista em caso de chuva forte. Fotos: Tânia Meinerz/JC
Esta condição pode ter ajudado a proteger mais contra impacto eventual da lâmina de água que ficou 20 dias sobre parte da pavimentação, mas isto só poderá ser dimensionado com os testes. Segundo o executivo, a pista é feita para ter quantidade de água, mas que escoa rapidamente. "Nosso ponto principal aqui é a segurança."
Um dos desafios será o prazo para repor equipamentos, que são em sua maior parte importados. Esteiras para retirada de bagagens ficaram sob a água e podem ter tido dano. São conjuntos trazidos de fora. Nogueira diz que a concessionária poderá recorrer a empréstimos de outros terminais e concessionárias, caso se possa reabrir o terminal e haja maior demora para receber de fabricantes.
A medida já foi adotada para montar a estrutura no ParkShopping Canoas, que virou terminal provisório onde ocorrem check-in e embarques. Os passageiros são levados de ônibus até a Base Aérea de Canoas (Baco).
Livraria Cameron teve perda de 70% dos livros que estavam na operação no primeiro piso do terminal de passageiros
O terminal de passageiros apresenta ainda barro em parte do piso e marca de onde chegou a água nas paredes no primeiro piso. Tem vegetação em bancos e nos banheiros na área de desembarque doméstico, trazida pela inundação.
A maioria das operações de varejo está fechada, sem movimentação de limpeza. Uma das duas unidades da cafeteria Starbucks fica no primeiro piso. Ao lado, equipe da Livraria Cameron começou neta terça a retirar livros danificados. Pelo menos 70% dos produtos foram perdidos, disseram os funcionários.
Escadas rolantes também estão com barro e ainda vão ter avaliação. Na saída do desembarque, o painel gigante onde eram estampadas partidas e chegadas de voos está fora de operação. O terminal está sem energia. Devido à inundação, a casa de força que transforma a carga recebida da CEEE Equatorial ainda não foi religada. A casa energiza também os instrumentos de luzes da pista e outros aparelhos. Por isso, ainda não é possível saber a extensão dos danos.
Na área de transporte de bagagens, na retaguarda do terminal, parte do piso sofreu elevação pela inundação
Na parte externa, chama a atenção a sujeira que envolve equipamentos de raio-x e processamento, usados para fluxo de funcionários e pessoal de terceiros na "área ar" (tudo que é ligado à operação dos voos - normalmente após o embarque), como quem faz o transporte de bagagens, e esteiras. Parte do piso na área coberta de retaguarda foi elevado pela água.
Na área externa ao terminal de passageiros, nos dois edifícios de garagens, começaram a ser liberados os veículos que estavam no local no dia 3 de maio. Proprietários foram ao local para retirada. Muitos guinchos de remoção atracavam e saíam com unidades que ficaram inundadas.
A Estapar comunicou que não cobraria as tarifas pelos dias de aeroporto fechado, mas descartou qualquer indenização por perdas. A Defensoria Pública do Estado ingressou com Ação Civil Pública na Justiça pedindo R$ 10 milhões por "dano moral e social de natureza extrapatrimonial de forma coletiva".
Carros que estavam em nível inundado são retirados por guinchos de garagem na área externa ao aeroporto
Enquanto não há como reabrir o Salgado Filho, o desafio é ter mais pousos e decolagens na Baco. O ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, chegou a dizer que dobraria o número de voos depois de 10 de junho. Isso não deve ocorrer neste prazo, pelo menos, por limitação técnica.
Edgar Nogueira explica que é preciso viabilizar a operação noturna da base, instalando mais torres de iluminação e sinalização apropriada. A Fraport está tratando esses itens com a Anac e a Aeronáutica, que é responsável pela estrutura. São 10 voos diários na base hoje, entre chegadas e partidas. Nogueira previne que a maior oferta também vai depender das companhias aéreas.
Aeroporto instalou sistema de drenagem, mas precisará de mais contenção
Foi muita água ou a drenagem ao redor do aeroporto não deu conta do volume de água que gerou a cena quase inacreditável da pista de pousos inundada. Ou as duas coisas. O complexo do Salgado Filho tem um sistema próprio de drenagem que foi robustecido desde a chegada da Fraport Brasil.
Na ampliação da pista, de 2.290 metros para 3,2 mil metros, previsto no contrato da concessão, a empresa instalou, além da conta das obras do traçado, um conjunto de Bacias de Detenção (BDs) para receber água de chuva. Nas laterais da pista, estão diversos "piscinões" que fazem essa reserva. Os "piscinões" têm capacidade para armazenar 1 milhão de metros cúbicos, equivalente a 400 piscinas olímpicas. Todos estão cheios e transbordaram na atual enchente.
Este sistema podia ser percebido do alto, em sobrevoos, como quem estava em aeronave após a decolagem ou antes do pouso, dependendo do lado de acesso ao terminal, quando ele estava ativo. "As bacias servem não só para drenar água da pista, mas do bairro, ao escoar para os arroios Areia e dos Ratos.
"Antes a pista alagava, agora precisamos de uma obra de contenção para proteger o aeroporto", diz Edgar Nogueira, vice-presidente da Fraport Brasil. Segundo ele, estão sendo feitos estudos sobre como terá de ser esta nova proteção.
No atual evento, parte da pista ficou submersa, mesmo com as BDs. Para acelerar a retirada da água, a Fraport teve ajuda de arrozeiros que levaram bombas usadas nas lavouras irrigadas para reforçar a drenagem. Na área, ainda há porções de alagamento, mas mais em terrenos rebaixados, entre o sistema das pistas de pouso e de taxiamento das aeronaves.
Próximo ao antigo terminal de passageiros, que fica ao lado do atual, há partes alagadas. Mas a cena do avião de carga com parte da estrutura submersa agora não tem mais. A aeronave está no mesmo ponto, mas agora sobre pavimento quase seco.