É hora de desembarcar em 2025 e, de preferência, o quanto antes. Pelo menos na hora de tomar decisões que vão dar o tom e o rumo de quem tem negócio no varejo. Dirigentes e especialistas sinalizam um ano que vai ser quase esquizofrênico. Por quê? Pelos dados macroeconômicos, vai ser um primeiro semestre ainda com boa colheita em vendas, puxada por renda e emprego ainda firmes e um fator decisivo no Rio Grande do Sul, que é uma supersafra agrícola. Mas o segundo tempo de 2025 virá desafiador. Com fatores como emprego e renda ainda ajudando, o conselho das fontes que a coluna buscou é de ficar atento a custo de estoques, que precisam ser na medida certa, não erra produto (ou coleção) e cuidar bem do ponto físico e relação com o digital.
"Tem de ter o tamanho certo. Pode ser que muitos tenham de reduzir para encarar o ano", orienta o coordenador de varejo do Sebrae-RS, Fabiano Zortéa. Aquele comportamento de "sempre ser otimista", como diz o presidente da CDL Porto Alegre, Irio Piva, vai ser testado ao pé da letra. "Sou otimista, varejista sempre é", reforça o dirigente lojista, que aposta ainda em bons resultados e ressalta a necessidade de prestar atenção a dados objetivos de execução. Pode ter menos expansão de segmentos, por exemplo, pois o investimento terá custo mais alto. "O ano de 2025 ainda é um ano que acontece. A gente vai ter aquela questão da temperatura e da sensação térmica", prepara a economista-chefe da Fecomércio-RS, Patricia Palermo. "Estamos prevendo um ano que cresce 2,6%, que não é algo ruim, obviamente, especialmente diante do nosso histórico. Mas a gente termina o ano desacelerando bastante", dá o roteiro Patricia, para literalmente fazer os empregadores do setor colocarem os dois pés no chão e se estruturarem. "Os números vão ainda ser bastante positivos. A gente está à beira de ter um ano de safra recorde, que tem efeitos sobre a nossa economia. As taxas de desemprego estão muito baixas e dificilmente vão se deteriorar fortemente porque a taxa de participação está mais baixa", esmiuça a economista-chefe da entidade. O alerta começa apenas em se tratando de crédito, que ficará mais caro, até porque a dose de alta no desfecho de 2024 não foi pequena. "Isso vai acabar pressionando e muito os investimentos. Muitos podem desistir", admite a economista.
A presidente da Associação Comercial de Porto Alegre (ACPA), Suzana Vellinho, admite que tinha uma percepção melhor de como será o próximo ano, mas adota um fração de cuidado. "Ainda é um ano em aberto. E você pode imaginar que ele poderia ser um ano melhor. As projeções não são fáceis e não são boas. Tudo está subindo", lista Suzana, referindo-se principalmente a fatores como dólar e juros. Ivonei Pioner, presidente da Federação Varejista do RS, opina que o ano pode ter bom desempenho, mas coloca o rumo na condição da política fiscal. "O que ainda não temos certeza é de como vai ser conduzida. Precisa respeitar os gastos, mas teremos um momento para a gente segurar", projeta Pioner, antevendo desafios mais ligados à oferta de mão de obra e produtividade, tema que ganhou mais realce desde a discussão sobre jornada, eventual redução e impactos aos pequenos negócios. "Há bastante necessidade de trabalhadores, mas poucas pessoas com qualificação."
O presidente da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas), Antônio Cesa Longo, observa que a questão do custo para investimento, que sobe com as elevações das taxas e que devem se manter em boa parte de 2025, pode afetar os planos de varejistas do setor, que vinham em expansão. Grupos com foco no formato de atacarejos puxaram a abertura de unidades entre 2022 e 2024. "O setor está competitivo, o que deve ajudar a manter até mesmo elevação de preços", diz. Para o consumidor, isso pode ser um alívio para não ver a renda ser mais corrida. Mas a inflação exigirá paciência e gestão de custos.
Ajustes ao nível de entrega e ao ambiente econômico
Fabiano Zortéa indica a adoção de ações ajustadas ao cenário econômico
/PATRÍCIA COMUNELLO/ESPECIAL/JC"Reduzir para crescer", recomenda Fabiano Zortéa, do Sebrae-RS. A senha indica que o varejo deve ser pensado, desde as estratégias de venda, o mix de produto, o ponto físico e a presença digital com muito mais assertividade do que investimento e quantidade. O varejo, para dar conta desse contexto e devido aos juros altos, vai segurar as possibilidades de investimento, vislumbra Zortéa. "A complexidade de atender as demandas dos novos consumidores precisa ser pensada através de um pensamento estratégico que envolva um alto grau de relevância para um nicho, um grupo específico de pessoas, olhando onde tem melhor margem", detalha o coordenador de varejo do Sebrae-RS. "Quando for pensar em mix de produtos, não necessariamente uma variedade tão grande vai ser o caminho, mas uma curadoria mais cuidadosa", opina Zortéa.
Oscar Frank, economista-chefe da CDL Porto Alegre, lembra que, na operação e que afeta todas as ações no fluxo, vendas e ponto, os varejistas precisam priorizar o uso de capitais próprios em detrimento de terceiros, devido ao custo financeiro. Diante desse cenário, Frank alerta que não faz "sentido permanecer com grandes quantidades de mercadorias". "Isso pode representar um problema bem significativo, pensando em um cenário de desaceleração, de desaquecimento", conecta o economista.
"É importante ter essa métrica bem equilibrada, sem excesso de estoques. Se a economia virar, isso pode ser um problema bem representativo do ponto de vista da gestão financeira", adverte Frank.