Dez anos após o Acordo de Paris, a COP 30, conferência mundial que reúne países e organizações para tratar sobre as mudanças do clima, acontecerá em solo brasileiro. O evento será sediado em Belém, no estado do Pará, em 2025, e será decisivo para a emergência climática, avaliam especialistas.
A responsabilidade do Brasil ao sediar a conferência é enorme e tem respingos de frustrações da COP 29, em Baku. Entre as dificuldades estão a possível perda de apoio dos Estados Unidos e o acordo sobre a nova meta de financiamento climático mundial deste ano, que foi aprovado não sem uma boa dose de críticas.
A edição da conferência em 2024 aprovou o financiamento a ser pago pelos países ricos aos em desenvolvimento - ao menos US$ 300 bilhões (R$ 1,74 trilhões). No entanto, estudos apontam que nações necessitam de até US$ 1,3 trilhão (R$ 7,5 trilhões) para combater os impactos da emergência climática.
Segundo a diretora executiva do Instituto Clima e Sociedade (ICS), Maria Netto, há o reconhecimento de que os países na convenção têm responsabilidades comuns, mas também diferenciadas. Nações desenvolvidas como Estados Unidos e os membros da União Europeia são poluentes históricos, pois se industrializaram mais cedo. Atualmente, países em desenvolvimento como China, Índia e Brasil também são responsáveis por grande parte das emissões globais, e debates crescem sobre a atualização da cobrança de cada um.
"A convenção ainda assume que aqueles que têm que tomar liderança têm que apoiar e promover o financiamento, sobretudo para os mais vulneráveis e mais pobres. Assim será possível que países ainda não tão industrializados possam se preparar também para reduzir emissões e se adaptarem à mudança do clima, visto que ela já está acontecendo", explica Maria.
No Acordo de Paris, que ocorreu na COP 21, em 2015, os países reunidos se comprometeram a manter o aumento de temperatura média global abaixo dos 2°C e o limitar a 1,5°C em comparação a níveis pré-industriais. Para isso, metas para reduzir as emissões de gases do efeito estufa (GEE) incluiriam esforços conjuntos e cumprimento de acordos.
Eventos climáticos extremos, como as enchentes em maio no Rio Grande do Sul, apontam urgência no investimento e dedicação à pauta climática. Segundo a diretora do ICS, acordos firmados em Paris sobre diminuição de emissões de efeito estufa ainda estão longe de serem cumpridos.
Para a especialista, a diplomacia brasileira enfrentará muitos desafios e enorme responsabilidade ao sediar a COP 30, como conflitos de interesses entre nações ricas, das quais são cobrados o financiamento climático, e as mais vulneráveis, que o demandam para mitigação e adaptação ao aquecimento global.
Maria explica que a insatisfação de países do Sul Global com o investimento deixará para 2025 um legado de falta de confiança entre os países, e na própria convenção.
Outra dificuldade para as negociações em Belém, de acordo com a especialista, é o já esperado afastamento expressivo dos Estados Unidos de pautas relacionadas ao meio ambiente. Em 2019, o então presidente Donald Trump retirou a nação do Acordo de Paris, decisão revertida por Joe Biden em seu mandato.
Para o professor de Relações Internacionais Fabrício Pontin, da Universidade LaSalle, a troca de governo representa uma significativa mudança na dinâmica de discussões da COP 30. A antecipação é que a colaboração do país diminua e se oponha aos esforços internacionais pelo clima. "Ou haverá um cenário de realinhamento das forças ambientais do ponto de vista global, por esse desaparecimento dos Estados Unidos da jogada, ou um esvaziamento total da pauta. E isso seria trágico para a discussão do Meio Ambiente", destaca.
Mundo à sombra do retorno de Donald Trump ao poder
Em 2025, Donald Trump volta ao poder e já sinaliza planos de retirar novamente os Estados Unidos do Acordo de Paris. Para Fabrício Pontin, é esperado uma diminuição do investimento público em fundos ambientais. "O enfoque do Trump é na exploração de recursos naturais, não necessariamente na preservação. Então o que veremos será provavelmente um enfoque na desregulamentação por parte do governo em medidas de maior relativização e exploração ambiental", prevê.
No entanto, o desvio da pauta pelo governo não significa que o país abandonará completamente as políticas climáticas - a autonomia dos estados garante que políticas pelo clima e pela preservação ainda sejam colocadas em prática, a exemplo da Califórnia. Após a saída do país do Acordo de Paris, o estado seguiu com metas próprias contra o aquecimento global, ambiciosas e independentes do governo federal, comenta o professor.
Ainda assim, com o retorno de Trump, que terá controle total do Legislativo norte-americano por pelo menos dois anos após tomar posse em janeiro de 2025, mudanças feitas pelo presidente no setor ambiental terão pouca resistência. Para Pontin, os republicanos estão alinhados com Trump na pouca necessidade da presença federal na regulamentação ambiental, que poderia contar com o setor privado e os estados dentro da federação.
O recuo dos EUA nas discussões da COP 30 pode ter consequências definitivas para o futuro da conferência, avalia a diretora do Instituto Clima e Sociedade. A omissão do país nas negociações seria muito negativa, explica Maria Netto. "Precisaríamos que um dos países mais emissores do mundo participasse, para que o acordo global seja efetivo."
Com a posição norte-americana, a ação do Brasil na COP 30 é essencial. "Mesmo que eles não participem de alguma forma, vai ser necessário que o País faça uma diplomacia importante para que, se os EUA não estiverem dentro, pelo menos os outros países tenham ambição o suficiente para avançar", afirma.
Segundo a especialista, quando os americanos se retiraram das negociações em 2019, países que não eram líderes globais no setor começaram a cobrir a lacuna no protagonismo das medidas pelo clima. "Há um interesse até geopolítico de manter a sua relevância e poder ter um papel estratégico", explica Maria.
Já para Pontin, o risco que se corre com o afastamento é o enfraquecimento do sistema COP, com países seguindo a linha de Donald Trump, resultando em um esvaziamento da conferência - menos consensos, menos decisões satisfatórias, e uma descrença no modelo de negociação. Segundo o docente, é possível um realinhamento das forças ambientais globais, com a substituição da liderança dos Estados Unidos por outras nações interessadas - ou, uma perda total. "A política ambiental precisa de uma focalização global, se não ela não vai funcionar", considera.