O ano que estreia em poucos dias podia muito bem ser um segundo tempo de 2023, se fosse possível reprogramar o calendário do varejo. A razão é simples: problemas que tiraram o sono de comerciantes na recente jornada terão continuidade, entre ritmo da atividade mais ameno e pressionado ainda por juros e inadimplência, que se manterão altos.
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Sim, a dupla não vai ficar detida em 2023, e ainda ganhará a companhia de mais dois atores: confiança ainda em baixa de empresas e consumidores e renda afetada por variáveis conjunturais.
Já o varejo como ele é no dia a dia, com a barriga no balcão, como costumam dizer os veteranos do ramo, vai combinar, com mais intensidade, apostam fontes ouvidas pela coluna Minuto Varejo, o modelo digital + físico, que gerou o consumidor híbrido, e desafios para segmentos que vêm precisando operar com o caixa ligado a um aparelho de eletrocardiograma.
"O varejo precisa observar três elementos em 2024: renda real, confiança dos consumidores e crédito. O primeiro define o poder de compra das pessoas. No segundo, se os consumidores não estiverem confiantes, não vão gastar. O terceiro abrange as condições de acesso a crédito, da facilidade ao custo dos recursos", receita Oscar Frank, economista-chefe da CDL Porto Alegre.
A economista-chefe da Fecomércio-RS, Patricia Palermo, pondera, adicionando mais variáveis que fogem do controle do chão da loja, como o processo de desinflação, que marcou e foi decisivo no desempenho deste ano, que será em ritmo menor em 2024 e vai influenciar as decisões do Banco Central (BC). O elemento mais decisivo será a questão fiscal, avisa ela: "Se o governo chutar o pau da barraca, vamos ter problemas. O BC pode continuar baixando os juros sem ter condições, devido ao descontrole inflacionário, o que é pior do que ficar baixando a taxa".
Do lado dos varejistas, Arcione Piva, presidente do SindilojasPOA, avalia que o ano deve ser melhor e um dos motivos estaria associado ao clima, menos traumático que o de 2023, com chuvas, inundações e estiagem. Mas os comerciantes vão estar com um olho na linha de frente, no balcão digital ou físico, e outro na conta para manter o negócio: "Isso está sempre na mesa. O aumento do ICMS, por exemplo, se vier, vai exigir revisão de custos".
Já o presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do RS (FCDL-RS), Vitor Augusto Koch, cobra mais segurança jurídica, sem surpresas de mudanças ou novas regras de legislação. "Hoje não se tem e isso gera instabilidade na tomada de decisões", cita Koch. Um exemplo é a desoneração da folha, que foi mantida, mas o governo pode judicializar a pauta.
Na loja consumidor híbrido e IA, avisa Fabiano Zortéa, do Sebrae-RS
"O movimento com IA deve crescer de forma mais aplicável aos negócios", aposta Zortéa
SEBRAE-RS/DIVULGAÇÃO/JCTrês perguntas para Fabiano Zortéa, coordenador de Varejo do Sebrae-RS:
Minuto Varejo - O que vai dominar 2024?
Fabiano Zortéa - Maior uso de inteligência artificial (IA). As ferramentas que serão mais usadas são de geração de texto, imagem e automatização de tarefas. O movimento com IA deve crescer de forma mais aplicável ao contexto dos negócios. Os varejistas precisam também dedicar mais tempo para a estratégia de oferta do produto/serviço, agregando mais serviços. O consumidor tende a escolher um produto/serviço que é novo, não é mais do mesmo ou é mais interessante.
MV - Digitalização e jornada do cliente: algo novo?
Zortéa - Vamos ter ofertas mais específicas de jornada híbrida, na qual o cliente seleciona no digital e experimente na loja, algo como "escolha no online e teste/experimente na loja". Com um cenário em que o cliente quer otimizar seu tempo, essa jornada de compra pode ser interessante. É um movimento bom para clientes e varejistas. A simbiose entre físico e virtual sustenta o novo mundo híbrido.
MV - Loja física ou tudo omnicanal?
Zortéa - O varejo físico ficará mais forte em 2024, desde que qualifique a presença digital. Criamos um mundo híbrido e, para fazer mais negócios, precisa atrair clientes pelos canais digitais, onde a audiência é o primeiro objetivo para trazer o cliente à loja física, para converter mais vendas neste ponto de contato.
Pergunta do milhão em 2024, provoca Eduardo Terra, da SBVC
"2024 está mais para ser igual ou um pouco pior do que 2023", projeta Eduardo Terra
/ARQUIVO PESSOAL/DIVULGAÇÃO/JCTrês perguntas para Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) e membro de conselhos de Petz, O Boticário e AMPM:
Minuto Varejo - O varejo melhora em 2024?
Eduardo Terra - Esta é a pergunta do milhão. A resposta é: depende, porque o varejo tem tido um desempenho heterogêneo. Supermercados e farmácias tiveram um ano bom, já eletromóveis, não, mas com a perspectiva de redução de juros, devem ter uma melhora. Já setores que dependem de renda e emprego, é uma grande interrogação, pois vão depender da estabilização da reforma tributária, do cenário internacional e da confiança de empresários e consumidores. Para mim, 2024 está mais para ser igual ou um pouco pior que 2023. Falo isso baseado em discussões de orçamentos e cenários em empresas que tenho acompanhado.
MV - Vamos ter expansões em 2024?
Terra - Esta resposta é mais fácil: não vai ser um ano de grande expansão. O custo do dinheiro está muito alto ainda, as empresas estão olhando para suas estruturas de capital e reduzindo dívidas. O custo financeiro machucou e ainda machuca bastante as operações. Será um ano de desaceleração da expansão do varejo como um todo. Mesmo os setores alimentar, de farmácia e pet, que têm liderado a agenda de abertura de lojas, devem tirar o pé do acelerador.
MV - Loja física ou tudo omnicanal?
Terra - 2023 foi o ano da loja física. O próximo deve ser de continuidade, mas com fortalecimento da loja física que é omnicanal, mais digital, integrada e com mais dados. Não é a loja analógica. Já o e-commerce, que andou de lado este ano deve seguir neste ritmo em 2024.