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Publicada em 26 de Abril de 2024 às 11:28

Brasileiro lidera projeto que ajuda na armazenagem de CO2 no fundo do mar

Premiado em Hannover, Alexandre Orth, da Rexroth, desenvolveu atuadores que consomem pouca energia

Premiado em Hannover, Alexandre Orth, da Rexroth, desenvolveu atuadores que consomem pouca energia

Guilherme Kolling/Especial/JC
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Guilherme Kolling
Guilherme Kolling Editor-chefe
De Hannover (Alemanha)
De Hannover (Alemanha)
O engenheiro Alexandre Orth, 45 anos, lidera um projeto que ajuda a acelerar a tecnologia de captura e armazenamento de gás carbônico, considerada uma das tendências da transição energética. Vencedor do Hermes Award 2021, prêmio anual de inovação concedido na Feira de Hannover, Orth desenvolveu um equipamento chamado atuador, que consegue impulsionar o gás carbônico por dutos para o fundo do mar, usando menos energia – gasta o mesmo que uma lâmpada para ser acionado –, de forma segunda e mais barata.

Brasileiro de Florianópolis (SC), ele cursou Automação e fez mestrado em Engenharia Elétrica na UFSC, com doutorado em Engenharia Mecânica, na Alemanha, onde vive desde 2002. Orth atua na área de Novos Negócios da Rexroth, braço de automação industrial do grupo alemão Bosch. É também CEO da starturp Subsea Automation Systems, vinculada ao grupo.

Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, concedida durante visita da reportagem ao estande da Rexroth na Feira de Hannover, Orth explica a tecnologia para qual vem se dedicando nos últimos cinco anos e como ela pode acelerar o processo de armazenamento de CO2 no fundo do mar, reduzindo custos dessa operação.

Jornal do Comércio – Como essa tecnologia dos atuadores está relacionada à captação de gás carbônico e ao seu armazenamento no fundo do mar?

Alexandre Orth – Começamos esse projeto há muitos anos, trabalhando próximo da Petrobras, que foi um dos parceiros, trazendo a demanda para a eletrificação subsea (submarina). Focamos em desenvolver uma tecnologia que eletrificasse subsea, sem a perda da segurança dos processos de válvulas, com baixo consumo de energia e com baixo custo. A composição desses três elementos se tornou ideal para acelerar o armazenamento de CO2 no fundo do mar. São projetos muito sensíveis ao custo, porque o valor do CO2 ainda está baixo em relação aos custos para transportá-lo e armazená-lo. A inovação disruptiva – que muda o jogo, e essa é uma delas –, transforma uma coisa que era impagável em algo sustentável. Se conseguirmos isso, vamos deixar de ter só um projeto de exemplo, financiado pelo governo, e vamos poder escalonar essa indústria. Segundo nossos cálculos, precisamos de mil a 5 mil projetos de armazenamento de CO2 no fundo do mar nos próximos 20 anos, para conseguir capturar o CO2 que não conseguiremos evitar.

JC – Esses novos equipamentos chamados atuadores, o que eles mudam?

Orth – Em 2021, quando ganhamos o Prêmio Hermes na Feira de Hannover, foi o lançamento oficial do primeiro atuador, já disponível no mercado. Agora, estamos lançando o portfólio completo desses atuadores. A diferença é que o primeiro atuador era para válvulas pequenas, com movimento rotativo. Temos agora mais três atuadores, para movimentos lineares de 2 polegadas até 8 polegadas, ou de 150 Kilonewton até 750 kN. E temos essa unidade inteligente, que faz com que válvulas de até 22 polegadas de tamanho interno da válvula possam ser acionados com a potência de uma lâmpada de 96 W.

JC – A captação do gás carbônico pode ser mais rápida de viabilizar do que o hidrogênio verde?

Orth – O hidrogênio é importantíssimo, só que precisa de toda uma cadeia convertida ao hidrogênio: energia limpa em grande volume, eletrólise em grande quantidade, todo o pipeline (dutos) em material especial, porque o hidrogênio é muito agressivo a ar – corrosão de cracking (pode rachar) – então, é uma transformação que demora um certo tempo para produzir na escala e conseguir levar a todos os lugares onde é necessário. A tecnologia de captura e armazenamento de carbono já vem sendo utilizada pelo (setor de) óleo e gás de forma natural. Porque quando você explora óleo e gás, emite CO2. E esse CO2 é capturado e reinjetado no poço.

JC – Empresas que captam petróleo no fundo do mar, como a Petrobras, hoje, já devolvem esse CO2 para o fundo do mar?

Orth – Já devolvem. E a Petrobras é hoje uma das maiores empresas do mundo com baixo teor de CO2 por barril de óelo produzido, devido à capacidade de capturar o CO2 e reinjetá-lo. A Petrobras já tem muita competência nessa área. Quando tem óleo e gás financiando a injeção de CO2, a commodity com bastante valor agregado vai financiar essa tecnologia.

JC – E quando não tem?

Orth – Aí o armazenamento do CO2 tem que ser autossustentável, ou seja, o valor do CO2 tem que ser suficiente para pagar todo o equipamento e o valor da operação.

JC – O valor poderia estar em captar e armazenar o CO2? Poderia ser uma entrega ambiental?

Orth – Isso, é o serviço. Por exemplo, o Grupo Bosch, desde 2020, já é neutro na produção (de carbono), produtos sem causar (emissão de) CO2. Não quer dizer que não emita mais CO2. Quando viajo de avião, ainda emito CO2. Mas a Bosch compensa – paga outra empresa ou para plantar árvores, ou para capturar CO2, para, de alguma forma, compensar. Então, já paga por esse serviço. Os cálculos da Bosh são que, em 2030, ela ainda vai ter meio milhão de toneladas de CO2 por ano para serem compensados, porque não podem ser evitados. São processos como fundição, que acabam gerando muito CO2 e não tem como fazer sem evitar, então, precisa compensá-los.

JC – O caminho do gás carbônico nesse ciclo seria – captação, por exemplo, em uma fábrica, leva o CO2 armazenado até um navio que, em alto mar, com atuadores e dutos deposita o gás carbônico no fundo do mar...

Orth – Isso. E os geólogos fazem estudos para ver locais adequados para depositar o CO2. É como um poço de petróleo, só que ao contrário, são poços para despositar CO2. Tem monitoramento, com sensores no fundo do mar.

JC – E o sistema CCS da Noruega?

Orth – O da Noruega é no fundo do mar também. Há vários projetos, um dos mais proeminentes é de Nothern Lights, de captura de CO2 de fábrica de cimento ou mesmo de queima de lixo residencial. Esse gás carbônico capturado vai de navio até o norte da Noruega e lá coloca num pipeline (tubo), depois é injetado (no fundo do mar). Esse é um projeto pioneiro, fomentado em 90% dos custos pelo governo da Noruega para empresas que participam do projeto. Mesmo assim, o custo é 10 vezes maior do que o valor do CO2.

JC – O desafio ainda é o custo?

Orth – O desafio é o custo, por isso precisamos de inovação, que quebra o paradigma, para tornar essa indústria viável.

JC – Qual é a previsão de um piloto?

Orth - Estamos em negociação com vários clientes aqui na feira, estamos preparando para projetos na segunda metade deste ano.

JC – E a relação com a Petrobras?

Orth – Temos uma relação muito construtiva com a Petrobras, que acompanha muito o nosso trabalho, conhece todo o progresso feito. Estamos discutindo formas de aplicação dessa tecnologia no Brasil.

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