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Saúde

- Publicada em 12 de Maio de 2020 às 21:10

Porto Alegre torna-se modelo no combate à Covid-19

Avanço da doença na cidade se dá mais lentamente do que no Estado

Avanço da doença na cidade se dá mais lentamente do que no Estado


/MARCO QUINTANA/JC
O modo como o novo coronavírus (Covid-19) avança em países, estados e cidades mostra que, apesar de ser o mesmo, a progressão do vírus se dá conforme as medidas tomadas pelos governos locais para combatê-lo. Basta comparar o modo como a Covid-19 afeta a Argentina e o Brasil para se ter um exemplo disso. Com 6.550 casos no país vizinho, 319 argentinos faleceram em razão da doença. No Brasil, já são 177.589 casos e 12.400 óbitos. Se, no âmbito nacional, o Brasil é exemplo negativo para o mundo, no regional, Porto Alegre mostra como ações rápidas e duras dão resultados positivos.
O modo como o novo coronavírus (Covid-19) avança em países, estados e cidades mostra que, apesar de ser o mesmo, a progressão do vírus se dá conforme as medidas tomadas pelos governos locais para combatê-lo. Basta comparar o modo como a Covid-19 afeta a Argentina e o Brasil para se ter um exemplo disso. Com 6.550 casos no país vizinho, 319 argentinos faleceram em razão da doença. No Brasil, já são 177.589 casos e 12.400 óbitos. Se, no âmbito nacional, o Brasil é exemplo negativo para o mundo, no regional, Porto Alegre mostra como ações rápidas e duras dão resultados positivos.
A capital gaúcha teve o primeiro caso da doença em 8 de março. Passados dois meses, a cidade de quase 1,5 milhão de habitantes teve 19 vítimas fatais. A primeira morte foi em 20 de março. Em termos de comparação, Curitiba (PR), teve o primeiro óbito em 6 de abril - 17 dias depois da primeira em Porto Alegre - e já contabiliza 29 mortes. Em Goiânia (GO), que também tem população na casa de 1,5 milhão, 25 pessoas já perderam a vida.
Nos últimos dez dias, a Capital teve três óbitos em razão do coronavírus. Até a noite desta terça-feira, a cidade tinha 644 casos, e levou 29 dias para dobrar o número de confirmações. O Rio Grande do Sul dobrou em 13 dias. O Brasil levou 11 dias para dobrar o número.
A menor velocidade na confirmação de novos casos e mortes aponta para o sucesso nas ações tomadas pela prefeitura visando combater a pandemia. A modulação das medidas leva em consideração diversos fatores, sendo dois deles os principais: avanço da doença e capacidade do sistema de saúde em dar conta da demanda.
O prefeito da Capital, Nelson Marchezan Júnior cita pontos-chave para que a cidade esteja conseguindo domar a evolução da pandemia. "O primeiro de todos os itens são decisões políticas baseadas em evidências científicas", afirma.
Conforme a prefeitura, Porto Alegre conta com 617 leitos em Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs). A ocupação tem permanecido ao redor dos 70% desde a chegada do vírus. Nos últimos dias, a quantidade de pessoas internadas em UTI em razão da Covid-19 aumentou, mas o sistema ainda mantém uma margem de mais de 25% de vagas desocupadas. Na noite desta terça-feira, eram 452 pessoas hospitalizadas em UTIs. Destas, 41 tinha diagnóstico confirmado do coronavírus e outras 16 tinham suspeita de contaminação. 

"As decisões são baseadas em evidências científicas"

Marchezan crê em uma educação civilizatória de mudança de hábitos

Marchezan crê em uma educação civilizatória de mudança de hábitos


ANSELMO CUNHA/PMPA/JC
Jornal do Comércio - Ao que o senhor credita os bons resultados obtidos até o momento por Porto Alegre no trabalho de combate ao novo coronavírus?
Nelson Marchezan Júnior - O primeiro de todos os itens são decisões políticas baseadas em evidências científicas. E evidência científica não é matemática, estatística, tese, estudo. É aquilo que, de acordo com o método científico, é comprovado. O segundo é a predominância da equipe de gestão da saúde em relação às decisões. As questões políticas, eleitorais, partidárias, jurídicas, econômicas, sociais, estão atreladas às decisões com evidências científicas da saúde. O terceiro é uma decisão de fazer o que precisa ser feito na hora que precisa ser feito. E o quarto item é a consciência de que ainda temos muitas dúvidas. Acredito - e, quando digo acredito é porque, quem sabe, daqui a pouco, as evidências mostrem que não é esse o caminho - que hoje o caminho é de, através do isolamento, evitarmos a velocidade de contaminação do vírus. As evidências também mostram que a estrutura adequada são leitos de tratamento intensivo. Pessoas morrem, mas o que não aceitamos em Porto Alegre é que morram sem atendimento. Esse atendimento, pela evidência científica que se tem, é via ventilador mecânico. Hoje, o grande diferencial é a UTI, é o ventilador. Baseado nisso, nossas decisões são evitar aglomerações, ou tentar mensurar o volume de aglomerações baseado na disponibilidade de UTIs.
JC - Gestores da saúde sempre salientam que as medidas políticas passam por dois indicadores: a velocidade do avanço da doença e a capacidade da rede de atendimento. Porto Alegre tem aumentado a sua capacidade desde o início da pandemia. Atualmente, como está a estrutura para enfrentar a Covid-19?
Marchezan Jr. - Quem disser hoje que a situação está tranquila está indo contra todas as evidências mundiais. Vemos a Itália derrubada, a Espanha, a Inglaterra e os EUA derrubados. Então, não cabe dizer que está tranquilo. Cabe dizer que sabemos o caminho, que é o primeiro passo. O segundo é buscar alternativas. O tempo é um amigo para conhecer o vírus, para buscar os equipamentos de proteção individual (EPIs), para fazer, talvez, a maior campanha de vacinação contra a gripe da história da cidade. Hoje, temos 40% da população de Porto Alegre vacinada. Isso é um recorde. Imaginamos que a vacinação contra a gripe e que o próprio isolamento irá ajudar em relação a outros vírus. Teremos uma baixa de demanda na atenção básica e em hospitais. O número de leitos disponíveis para coronavírus hoje é de 174. Se conseguirmos apertar um pouquinho e ocupar o espaço de outras necessidades de saúde, podemos chegar a 250. Mais do que isso, teríamos, por segurança, de adquirir ventiladores. E estamos nessa corrida mundial.
JC - A atenção básica também tem papel importante.
Marchezan Jr. - Estamos fazendo uma ampliação de atendimento básico. Vamos hoje (terça-feira) inaugurar a oitava unidade básica que ficará aberta até as 22h. Já abrimos mais de 20 unidades que funcionam 12h por dia de forma ininterrupta. Antes, elas fechavam para o almoço e encerravam as atividades às 17h30min. Temos mais de 20 que abrem das 7h às 19h e das 8h às 20h. Ampliamos os leitos hospitalares. Aliás, desde 2017 estamos ampliando. Nesse ano já ampliamos os leitos destinados ao coronavírus no Hospital Vila Nova e, até o fim do mês, o anexo do Hospital Independência fica pronto. No início de junho, serão mais 60 leitos ali. Imaginamos nossa expansão de leitos não necessitando fazer hospital de campanha, mas expandindo as estruturas hospitalares. Com esse planejamento, acreditamos que atinjamos o número de 2,4 para cada 10 mil habitantes, um número referência. Também ampliamos o número de testes de Covid-19 e, agora, podemos testar todo mundo que tem sintomas.
JC - Com mais testes, os casos tendem a aumentar na cidade?
Marchezan Jr. - Inevitavelmente, vai aumentar. Outro fator que deve aumentar o número de casos na cidade é a liberação de algumas atividades. Isso não quer dizer que perdemos o controle ou que estamos piores na gestão do problema. Deve aumentar também a ocupação de leitos de UTI. Então, é bom que dividamos isso de uma forma organizada no tempo. O perigo é se isso crescer muito rapidamente. A aceleração do crescimento preocupa mais do que o crescimento em si. Os óbitos que também devem aumentar, infelizmente. Com o aumento da circulação do vírus, o aumento da contaminação das pessoas, uma parte das pessoas deve vir a óbito, não exclusivamente pelo vírus, mas pelo vírus associado a problemas de saúde pré-existentes.
JC - O isolamento social cria um paradoxo, pois quanto mais resultado dá, mais parece desnecessário. Como convencer a população de que, se é possível permanecer em casa, que permaneça?
Marchezan Jr. - A imprensa tem um papel fundamental nisso e, como regra geral, tem trabalhado com muita seriedade. Isso contribui muito. Vamos conseguir isso com a evolução das estruturas de comunicação de todos nós e a conscientização das pessoas. Não é por lei que vamos criar hábitos nesse momento. São hábitos muito pessoais, de lavar as mãos, de usar álcool gel, de usar a máscara. Eles precisam ser desenvolvidos pela sociedade. Não podemos exacerbar isso, sob pena de virar uma cidade raivosa, ao ponto de alguém não estar com luva ou com máscara e ser ofendido ou agredido como se estivesse cometendo um crime. É uma consciência civilizatória que temos de ter, uma educação civilizatória de mudança de hábitos e de cultura. Esse é o grande desafio.