Apesar das dificuldades enfrentadas no Rio Grande do Sul após as enchentes que geraram perdas gigantescas em diversos municípios gaúchos, o presidente da Central Sicredi Sul/Sudeste, Márcio Port, aposta em um ano de crescimento em termos de faturamento, na margem dos 23%, diante dos resultados positivos alcançados nos cinco primeiros meses de 2024, quando foi registrado incremento de 11% no volume administrado, saltando de R$ 120 bilhões para R$ 133 bilhões, num comparativo com o mesmo período do ano passado.
O bom momento do Sicredi se deve, na opinião do dirigente, à grande capilaridade que a cooperativa tem no Rio Grande do Sul, presente em 97% dos municípios gaúchos e a sua atuação com operação de linhas de crédito, especialmente do Crédito Rural para a Agricultura Familiar, carro-chefe da cooperativa.
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Segundo Port, no último Plano Safra, 45% dos contratos feitos no Estado foram pelo Sicredi. Durante a pandemia, pelo fato de as agências terem se mantido abertas, a cooperativa cresceu 40% no ano. Depois, a alta desacelerou para 30% e ficou em não menos do que 25% de lá para cá.
O presidente também atribuiu esse crescimento ao incremento no número de associados pessoa física verificado nos últimos anos. "As pessoas descobriram as vantagens cooperativas de crédito, da possibilidade de o dinheiro aplicado voltar para a comunidade e para o próprio associado, na forma de sobras", avalia.
Jornal do Comércio - De que maneira a tragédia climática que acometeu o Estado em maio impactou o Sicredi?
Márcio Port - Na cooperativa em si os impactos firam mínimos: algumas agências fechadas por alagamento, falta de energia ou eventualmente por colaboradores que não conseguiram chegar ao local do trabalho. O maior impacto veio da parte dos nossos associados. Temos uma grande capilaridade e agências espalhadas por todo o Estado, nas regiões gravemente atingidas como o Vale do Taquari, da Serra. Foi uma grande quantidade de pessoas que perderam suas casas, empresas, seu sustento. Elas são o nosso maior foco da preocupação, e essas pessoas esperam de nós uma ação proativa para reconstrução.
JC - E quais foram as principais medidas da cooperativa para socorrer as vítimas das enchentes?
Port - Para que as pessoas conseguissem superar esse momento difícil de uma forma mais rápida, demos todo apoio nos abrigos, com colaboradores atuando como voluntários, doações financeiras, de produtos como colchões, alimentos. Organizamos centros de distribuição. Chegou um momento em que estavam vindo muitas carretas de outros estados com doações e eles não sabiam para onde levar. Então, organizamos isso também dentro do Sicredi, justamente pela grande capilaridade que temos. Vieram 42 carretas da Defesa Civil do Paraná que chegaram em Santa Cruz do Sul, bem na véspera de ter uma segunda onda de chuva e não conseguiam descarregar porque o centro de distribuição da cidade estava lotado. As doações chegavam sem saber para onde ir, se tinha local para descarregar e nós conseguimos organizar e essas carretas foram para Caxias do Sul, Teutônia, Gravataí. Também ajudamos com doações via Pix, as quais a cada doação nós dobrávamos e chegamos a arrecadar R$ 22 milhões e colocamos mais R$ 110 milhões.
JC - E como foi a atuação do Sicredi no que se refere às linhas de crédito?
Port - Temos o Pronampe, que ganhou essa roupagem nova com subvenção, que é o governo pagando uma parte da operação de crédito de 40%. São R$ 30 bilhões do governo federal, só, que desse montante, R$ 2,5 bilhões têm subvenção. Então, tem muita gente que acha que o Pronampe vai salvar as empresas, mas menos de 10% dos tomadores das empresas vai ter a subvenção, os outros 90% vão pagar a taxa de juros que é a taxa Selic, mais 3% ao ano, com prazo de 72 meses, mas não vão ter o rebate. Por ter esses 40% de subvenção, ela acabou muito rapidamente nos bancos públicos e nós também já estamos com ela esgotando. Abrimos em meados de junho e os R$ 500 milhões que disponibilizamos duraram uma semana. Além do Pronampe, tem outras linhas de crédito que também são bem atrativas: o crédito solidário do BNDES que tem com taxa de juros só o IPCA, o que o torna bem atrativo, ou seja 4% ao ano de taxa de juros. Nós temos operado várias linhas de crédito para o produtor rural e para empresas, mas infelizmente não vieram linhas de crédito para pessoa física que hoje precisa de uma casa inteira. Vieram os auxílios, mas poderia ter uma linha de crédito com subsídio para reconstrução. Só o Sicredi tem R$ 17 bilhões de recursos disponíveis para empresas, mas até agora está alocado só R$ 1 bilhão, pois, por enquanto, o foco maior tem sido o Pronampe.
JC - Qual a perspectiva do setor quanto ao ano de 2024, diante da crise gerada pelas enchentes?
Port - Comparando maio de 2023 com maio de 2024: no ano passado, no Rio Grande do Sul, nós éramos 2,5 milhões de associados e havia 662 agências no Estado e o volume administrado pelo Sicredi era de R$ 120 bilhões. Em maio de 2024, estávamos com 2,6 milhões associados, então aumentou 100 mil associados nos primeiros cinco meses do ano. São 674 agências, ou seja, mais 12 inaugurações e o volume administrado chegou a R$ 133 bilhões, crescimento de 11% em cinco meses. Nesse ritmo, podemos chegar a um crescimento de 23%, em 2024. Considerando que o PIB não cresce quase, no Estado e no País, então é um grande crescimento. E por que o Sicredi é tão grande no Estado? Temos uma grande capilaridade, presentes em 97% dos municípios gaúchos. Somos grandes no Crédito Rural, especialmente para Agricultura Familiar, além de uma força muito grande com pessoa jurídica também. No último plano safra, 45% dos contratos feitos no Estado foram pelo Sicredi. Durante a pandemia, pelo fato de as agências terem se mantido abertas, chegamos a crescer 40% no ano, depois baixamos para 30% e não menos do que 25% de lá para cá.
JC - E mesmo com esse cenário catastrófico se mantém essa expectativa de crescimento de mais de 20% neste ano?
Port - Sim e pode ser até maior. Claro, temos esse contexto que é difícil mensurar quantos produtores perderam a safra, quantos vão conseguir plantar, porque a gente tem terra arrasada pelo Estado afora, com problema de solo gravíssimo. Além disso, tem essa questão da perda do PIB do Estado. Mas a tendência é crescer, mesmo que pouco e não acredito que vá cair.
JC - E qual o papel das cooperativas numa situação de catástrofe como estamos vivendo?
Port - Vou dar como exemplo o que aconteceu na pandemia de Covid-19: nós fomos um dos grandes repassadores de Pronampe na época, pois é comum, em épocas de crise, de recessão, de tragédia, os bancos se recolherem e se manterem mais cautelosos, para não perderem por risco de inadimplência. Aí, quem faz a diferença é a cooperativa, pois ela conhece o cliente, o mercadinho, sabe que eventualmente os números de balanço dele não são tão bons, mas que é fase. A cooperativa conhece os empreendimentos e sabe das reais dificuldades deles, especialmente na crise. Eu conhecia o prédio do cliente antes da enchente e sei do estado que está agora e do que ele precisa. Essa proximidade faz toda a diferença, pois sabemos da idoneidade e do caráter dos nossos associados.