Presidente da Cooperativa Vinícola Aurora desde outubro de 2020, Renê Tonello é produtor de uva na Linha Buratti, em Bento Gonçalves. Em sua propriedade, são cultivadas variedades para a elaboração de suco de uva, como Isabel, Bordô e Carmem. Filho, neto e pai de viticultores, com 60 anos, é cooperado desde 1980, dando continuidade ao legado do avô, Antônio Guilherme Tonello, que já era associado nos primeiros anos de fundação da Aurora, ainda na década de 1930.
Nesta entrevista, ele fala sobre o contexto atual da Aurora e sobre o mercado cooperativo.
Jornal do Comércio - Qual é a situação atual da Cooperativa Aurora em números de associados, de produção, de faturamento etc?
Renê Tonello - Temos muito orgulho de sermos a maior cooperativa vinícola do Brasil. Mais do que a contribuição econômica para a Serra Gaúcha e para o Estado, sabemos da importância da nossa cooperativa como agente social e cultural para a vitivinicultura brasileira. Atualmente, somos 1.140 famílias cooperadas em 11 municípios da Serra. Nossas famílias cultivam, juntas, 2,8 mil hectares de vinhedos, uma média de 2,5 ha por associado, sendo cerca de quatro pessoas por grupo familiar. Na safra deste ano, cultivamos 57 variedades de uvas destinadas para a elaboração de sucos, vinhos, espumantes e coolers, e colhemos 70,5 milhões de quilos da fruta, envolvendo diretamente mais 5 mil pessoas na vindima. O volume representa cerca de 10% do total da safra gaúcha. Fechamos o ano de 2022 com um faturamento crescente e constante graças a um grande trabalho de desenvolvimento de produtos e de estratégias comerciais. A Cooperativa Vinícola Aurora tem investido muito nas pequenas famílias cooperadas, em inovação, na pesquisa de novos produtos e métodos de produção.
JC - Como a Aurora trabalha junto à comunidade em termos de desenvolvimento da região em que atua?
Tonello - Um dos princípios do cooperativismo é educação, formação e informação dos associados para que eles possam contribuir efetivamente com a cooperativa e com o seu desenvolvimento pessoal e da comunidade onde vivem. Nós não temos medido esforços para potencializar isso. Nas áreas da saúde, da formação, do desenvolvimento de novas técnicas agrícolas, da sucessão na agricultura familiar e da geração de emprego e renda. De forma especial, na Aurora, temos um olhar atento a temas como sucessão rural e a importância social. Atualmente, dentro do nosso quadro de 1.140 associados, 21% são mulheres e 14% são de jovens até 30 anos. Mas entendemos que precisamos aumentar essa representatividade. Por isso, temos algumas iniciativas voltadas exclusivamente para eles, como o Aprendiz Cooperativo do Campo, que ajuda na profissionalização das pequenas e médias propriedades rurais e no preparo dos filhos dos cooperados para a continuidade do trabalho na vitivinicultura, e o Aurora Mulheres Empreendedoras (AME), que reúne associadas, esposas e filhas de viticultores cooperados para encontros sobre empreendedorismo feminino e cooperativismo. Tudo isso faz parte de um grande programa, o Educa Aurora, que promove a formação contínua para todo quadro social. Nosso departamento social tem uma atuação decisiva na vida das pessoas e isso nos motiva. É o verdadeiro sentido de uma cooperativa existir.
JC - Quais os aprendizados das denúncias de trabalho análogo à escravidão enfrentadas pelas vinícolas no início do ano?
Tonello - Aprendemos que todos os acontecimentos são oportunidades para refletirmos e melhorarmos. Inicialmente é necessário reafirmar que este foi um episódio que nos entristeceu muito porque envolveu pessoas, trabalhadores como todos nós. Não foi um investimento que deu errado, nem um produto que não vendeu. Foram pessoas. Tenho repetido que, por sermos uma cooperativa, nada mais somos do que pessoas, seus valores e sua enorme capacidade de trabalho. Isso é a marca de nossa história quase centenária. Por isso lamentamos profundamente o que aconteceu e agimos de forma muito rápida para restabelecer os direitos desses trabalhadores terceirizados e olharmos para o futuro, garantindo que isso não se repetirá. Conversando diariamente com o nosso Conselho de Administração, com nossos colaboradores e clientes, tenho certeza que sairemos dessa situação como uma organização ainda mais moderna, sustentável, inclusiva e com processos revitalizados.
JC - Quais as novidades que a cooperativa pretende lançar?
Tonello - Estamos constantemente monitorando as tendências e observando o paladar dos consumidores para apresentar novidades. Historicamente, a Aurora lança cinco produtos por ano. Recentemente lançamos o suco de uva integral em Tetra Pak de 1,5 litro (único no Brasil) e o Keep Cooler Tangerina. Nos próximos meses chegarão ao mercado os primeiros espumantes da Aurora com o selo da Denominação de Origem Altos de Pinto Bandeira, o Aurora Extra Brut e o Gioia Sur Lie Nature. E ainda no segundo semestre deste ano apresentaremos a safra 2019 do nosso vinho ícone, o Aurora Millésime, o Zero Álcool Rosé, o espumante Aurora Extra Brut Rosé Pinto Bandeira, além de novidades na linha Varietal, com as variedades Rebo, Petit Verdot e Marselan.
JC - Como avalia o momento do cooperativismo como um todo no Brasil e no mundo?
Tonello - O cooperativismo sempre teve uma grande relevância para o desenvolvimento das cadeias produtivas. Através da união, pequenos e médios produtores da agricultura familiar têm a oportunidade de integrar grandes mercados e, juntos, tornarem-se competitivos. O cooperativismo mudou o cenário da vitivinicultura mundial, fazendo uma verdadeira revolução enológica em diversos países, como a Itália e a França. No Brasil, o movimento cooperativista vem crescendo. Segundo a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), o maior número de cooperativas está concentrado no ramo Agropecuário (1.170), que também agrega mais empregados, sendo aproximadamente 49% do total. No Rio Grande do Sul, levantamento da Ocergs mostra que somamos 3,2 milhões de associados, geramos 74,1 mil postos de trabalho e movimentamos R$ 71,2 bilhões. Sem dúvidas, isso reflete a importância econômica e social do cooperativismo no Estado e no País.