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ENTREVISTA

- Publicada em 30 de Junho de 2022 às 18:15

Qualificação é desafio para cooperativas, aponta presidente do sistema Ocergs/Sescoop-RS

Hartmann, da Ocergs, diz que cooperativismo constrói saídas econômicas

Hartmann, da Ocergs, diz que cooperativismo constrói saídas econômicas


/Arquivo Pessoal/Divulgação/JC
Patrícia Lima, especial para o JC
Patrícia Lima, especial para o JC
Lutar pelas bandeiras do cooperativismo em qualquer cenário, para que o desenvolvimento econômico gere bem-estar social de forma horizontal e cada vez mais ampla. Essa é a missão do presidente do sistema Ocergs/Sescoop-RS, Darci Hartmann, que assumiu o posto em abril desse ano. Aumentar o acesso das cooperativas aos mecanismos de profissionalização é um dos focos da gestão de Hartmann, para que as cooperativas estejam preparadas para se inserir e prosperar na competição com os grandes conglomerados nos diversos setores em que atuam.
Advogado formado pela Universidade de Cruz Alta e com especializações em Administração Estratégica pela Fidene e em Gestão Empresarial pela FGV, Hartmann conheceu cedo a realidade das cooperativas, ainda como produtor rural na região Noroeste do Estado. Em 1972 assumiu o comando do Sindicato Rural de Selbach e, em 1982, foi eleito prefeito da cidade pela primeira vez - e em 2000 novamente.
A partir de 1990 foi dirigente de variadas cooperativas, como Cotrisoja, Cooperjacuí, Fecotrigo e CCGL. Em 2017 virou vice-presidente da Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado do Rio Grande do Sul (Fecoagro/RS) e, a partir de 2019, passou a integrar a diretoria da Ocergs. Em abril, foi eleito presidente para dois anos de mandato. Nesta entrevista, ele comenta o momento que vive o cooperativismo e a importância de disseminar os valores para promover o crescimento econômico horizontalizado.
Jornal do Comércio - Como o senhor vê o cenário para o cooperativismo no Rio Grande do Sul atualmente?
Darci Hartmann - O segundo semestre será muito desafiador. No primeiro, tivemos uma das piores secas da história do Rio Grande do Sul. E precisamos entender que o agro é um fator originador, ou seja, do agro depende o crédito, a saúde, a infraestrutura, o transporte, a educação, o trabalho, enfim, está tudo muito ligado ao agro no Estado. Além da seca, tivemos um aumento nos custos de modo geral, o que será um grande desafio para o segundo semestre. Os fertilizantes, por exemplo, subiram estratosfericamente, especialmente pela Guerra entre a Ucrânia e a Rússia. O mercado não estava preparado para isso, achávamos que a guerra seria rápida. Hoje sabemos que o conflito não terminará tão cedo. Para além disso, temos que olhar outras questões relacionadas ao agro, como a repactuação dos débitos, o Plano Safra, para o qual ainda não se determinou o volume de recursos. Os custos em geral aumentaram, como do fertilizante e do dinheiro para investimentos e crédito. Também precisamos olhar para a subvenção do governo federal para o seguro agrícola, extremamente necessário nesse cenário. Isso aumenta o risco para 2023. Ao mesmo tempo, sabemos que o cooperativismo é muito forte e pujante, é muito criativo e constrói saídas para reestruturar as atividades econômicas. Um exemplo é o desempenho das cooperativas com industrialização de proteína animal, especialmente suíno e frango, que sofreram no ano passado e no começo desse ano. Agora, porém, elas já dão sinais de recuperação, com toda a cadeia sendo capaz de absorver os custos, que cresceram. As cooperativas da área do leite são outro caso emblemático dessa recuperação, com o repasse dos custos pelos produtores. O momento, enfim, é desafiador, mas as perspectivas são boas, especialmente para as cooperativas agrícolas. As safras de inverno, destaque para o trigo, devem ser boas, e a guerra da Ucrânia representará oportunidades para os produtos agrícolas brasileiros. Então, o prognóstico é bom para o cooperativismo como um todo.
JC - Um ramo do cooperativismo que chama a atenção são as cooperativas de crédito, que se disseminam com grande eficiência e aumentam sua relevância a cada dia no sistema financeiro. Como o atual momento econômico influencia essas inicativas?
Hartmann - As cooperativas de crédito têm uma grande vantagem em relação aos bancos tradicionais, que é a proximidade com o seu cliente - que nem é cliente, é associado à cooperativa. O correntista é um dos proprietários, tem uma relação de pertencimento muito positiva com a sua cooperativa. Por isso, a presença no share de mercado de investimentos é notável, com crescimento consistente. É uma área muito promissora, mas, ao mesmo tempo, desafiadora, pois o modelo de operação é diferente de uma instituição financeira convencional. As cooperativas precisam ter capilaridade e estar em todos os rincões, promovendo o desenvolvimento. Essa é a grande força do cooperativismo. A organização disso tudo exige muita tecnologia, para competir em pé de igualdade com o sistema financeiro convencional.
JC - O modelo cooperativo pode ser a resposta para a dificuldade de obtenção de crédito em tempos de juros altos e instabilidade econômica?
Hartmann - Tenho convicção de que as cooperativas financeiras têm condições de responder a esse desafio. O modelo de cooperativa criado no Rio Grande do Sul é vencedor e está se disseminando em várias partes do País, levando desenvolvimento às regiões. E esse sucesso não ocorre por ideologia ou por outros fatores que não sejam a competência das cooperativas em oferecer soluções efetivas, especialmente aos pequenos empresários e produtores, aos comércios locais. Um exemplo disso é o que ocorre com os grandes bancos, que apostaram na tecnologia para criar uma relação exclusivamente digital com as pessoas. As cooperativas andam no caminho contrário e usam a tecnologia para estar mais perto dos cooperados. As grandes instituições financeiras deixaram um espaço em aberto, que está sendo ocupado pelas cooperativas.
JC - A necessidade de investir em competitividade é um imperativo para o crescimento do cooperativismo, especialmente no mercado global. Como as cooperativas estão se preparando para ser mais competitivas?
Hartmann - O modelo cooperativo busca a competitividade desde o primeiro momento. Além de assegurar a melhoria dos processos e produtos, as cooperativas compartilham com os associados as sobras, que servem para novos investimentos em ferramentas que geram competitividade. As cooperativas ainda geram desenvolvimento local e comunitário, o que melhora a vida de todos. E isso proporciona mais desenvolvimento, riqueza e competitividade. Uma cidade com uma cooperativa pujante é mais desenvolvida. Porém, é verdade que somos obrigados a oferecer os melhores produtos em todas as áreas, pois estamos inseridos na competição mundial. Por isso, a Ocergs busca constantemente a profissionalização, por meio do Sescoop, para qualificar os gestores, dirigentes e membros das cooperativas em todas as áreas. Também precisamos pensar em um grande projeto de desenvolvimento das cooperativas do Rio Grande do Sul, para que por meio desse modelo possamos promover o desenvolvimento sustentável e orgânico no Estado. É um projeto de desenvolvimento e crescimento, com margens, resultados e sustentabilidade. O segundo semestre de 2022 será dedicado à construção desse projeto, para que o cooperativismo possa promover o desenvolvimento social e econômico que desejamos.
JC - O crescimento horizontal promovido pelas cooperativas é diretamente proporcional à exigência de uma gestão competente e especializada para atender às particularidades desse modelo tão amplo e diverso. Como será o avanço desse processo de qualificação das lideranças para o cooperativismo do futuro?
Hartmann - Já temos cooperativas altamente profissionalizadas em muitos ramos, com mecanismos de controle por parte das instituições brasileiras. As cooperativas de crédito são um bom exemplo disso, reguladas pelo Banco Central. Em todas as áreas, o caminho para essa profissionalização é a qualificação dos gestores das cooperativas. O maior desafio é, justamente, nas cooperativas agrícolas, que são espécies de ilhas, que precisam de soluções personalizadas. A crescente profissionalização dos dirigentes do agro é o caminho para vencer esse desafio, com a implantação de planejamento estratégico de cada cooperativa, inserindo as operações no mundo da competição e da eficiência. Também precisamos trabalhar para integrar os diversos ramos do cooperativismo, para que o sistema funcione como um organismo em sinergia. O cooperativismo cresce organicamente quando conseguimos essa sinergia, que gera desenvolvimento econômico e social. 
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