Uma importante atração turística do Vale do Taquari, o Trem dos Vales, que faz um passeio de 46 quilômetros por aquela região, teve a temporada interrompida em 2024 por causa das enchentes e não há previsão de retorno das atividades. O vice-governador do Rio Grande do Sul, Gabriel Souza, defende como solução que o governo federal faça um acordo com a concessionária da malha ferroviária gaúcha, a empresa Rumo, para que a companhia recupere 23 quilômetros de trilhos avariados com as cheias e depois autorize o trecho a ser operado novamente.
O trajeto abrange municípios como Guaporé, Dois Lageados, Vespasiano Corrêa e Muçum. Souza comenta que a Rumo avaliou em cerca de R$ 300 milhões o investimento necessário para recuperar a estrutura danificada. Ele sugere que a União e a concessionária façam um “acerto de contas” para viabilizar o empreendimento, que não pode esperar o fim da concessão da Rumo (previsto para 2027) para ter uma definição.
Souza foi um dos palestrantes da reunião-almoço Tá na Mesa da Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul) realizada nesta quarta-feira (16). Sobre a concessão da malha férrea gaúcha, o vice-governador afirma que é contra uma eventual prorrogação de contrato com a atual gestora. “A Rumo é desrespeitosa com o Estado do Rio Grande do Sul e não faz um centavo de investimento há muitos anos aqui”, critica Souza.
Ele lembra que foram 759 quilômetros de ferrovias atingidos pelo desastre climático do ano passado no Estado. O vice-governador ressalta que o Rio Grande do Sul tinha em torno de 1,6 mil quilômetros de trilhos em condições de uso, antes das enchentes, e hoje se encontra com cerca de 900 quilômetros. “E não temos mais ligação (férrea) com o resto do País”, salienta. Souza frisa que se alguma empresa quiser trazer ou levar cargas para Santa Catarina através de trens, seria impossível.
Ele alerta que a modelagem da nova licitação da malha férrea Sul tem que ser decidida neste ano pela União, para começar a preparar os editais em 2026 e se ter uma solução em 2027. O vice-governador comenta que uma hipótese já levantada e que teria sido apresentada informalmente pela própria Rumo seria o fatiamento da malha Sul em múltiplos trechos, que seriam licitados individualmente. No caso do Rio Grande do Sul, seriam três segmentos principais: Cruz Alta a Rio Grande, Uruguaiana - Passo Fundo - Norte paranaense e por fim o restante da malha.
Um Grupo de Trabalho criado pelo ministro dos Transportes, Renan Filho, tem até o final de junho para entregar uma proposta de futuro para a malha Sul. Souza detalha que o governo gaúcho levantou três sugestões, dentro da modelagem de uma concessão, para a construção de novos trechos ferroviários no Rio Grande do Sul para melhorar a eficiência da ferrovia atual.
Essas propostas seriam um trecho de 339 quilômetros, entre Santa Maria e Capão do Leão, que iria requerer um investimento de R$ 4,3 bilhões, ou 213 quilômetros de Santa Maria a Bagé, aporte de R$ 3,1 bilhões, ou 112 quilômetros entre Santa Maria e São Gabriel, com custo estimado em R$ 1,4 bilhão. Está em aberto se algum desses novos trechos seria viabilizado por aportes públicos ou uma solução híbrida, com participação da iniciativa privada.
Situação afeta competitividade do Rio Grande do Sul
A competitividade do Estado, em longo prazo, está vinculada ao modal ferroviário para fazer o escoamento da sua produção, adverte o presidente da Frente Parlamentar das Ferrovias, deputado estadual Felipe Camozzato (Novo). Ele ressalta que o custo logístico do Brasil é de cerca de 12% do seu PIB e o Rio Grande do Sul, antes das enchentes, já se encontrava em um patamar de 21,5%.
O parlamentar destaca que esse percentual aumentou após as cheias com a queda de pontes e estradas bloqueadas. Segundo o deputado, o contrato de concessão com a Rumo é "péssimo". Camozzato considera ser difícil conseguir uma requalificação da malha ferroviária gaúcha sem investimento público. "Embora eu, particularmente, não seja fã dessa alternativa", admite.
Uma das empresas impactadas com o cenário precário das ferrovias é a Braskem, que sem perspectiva de solução no curto prazo, decidiu retomar por via rodoviária o transporte do etanol de cana-de-açúcar, matéria-prima do eteno e polietileno verdes produzidos na unidade da companhia no Polo Petroquímico de Triunfo. A empresa passou a usar caminhões para garantir o abastecimento do etanol e a continuidade da operação da planta, acarretando em 1 mil viagens mensais.
O presidente da Federasul, Rodrigo Sousa Costa, é outro que considera que está havendo um desrespeito da Rumo com o Rio Grande do Sul, pelo jeito que a concessionária vem tratando o modal ferroviário no Estado. "Para nós que defendemos concessões e privatizações como uma forma de melhoria para a sociedade, é especialmente doloroso ver uma concessão não atender ao interesse público e aos usuários", lamenta o dirigente.
O representante da Federasul acrescenta que é contrário a uma eventual prorrogação da concessão da Rumo. Procurada pela reportagem do Jornal do Comércio (JC), a assessoria de imprensa da Rumo informou que “dada a complexidade e abrangência da situação, a empresa segue em diálogo com o governo federal (poder concedente) e demais autoridades competentes do setor para avaliação conjunta do cenário”.