Um debate que inicialmente parecia ter acabado em novembro do ano passado, quando a Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs) havia determinado um reajuste de 7% na margem bruta da Sulgás, distribuidora gaúcha de gás natural, teve um novo capítulo nessa quinta-feira (20). O órgão regulador analisou pedidos de reconsideração da revisão tarifária, feitos pela companhia (que almejava um incremento maior) e pela Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs – que defendia um valor menor), e acabou tendendo para os argumentos da concessionária, o que acarretará uma elevação ainda maior do preço do gás natural.
A recente posição da Agergs, detalha o diretor de Gás Natural da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace Energia), Adrianno Lorenzon, significará um aumento de cerca de 60% da margem da distribuidora, representando R$ 0,7545 por metro cúbico de gás natural. A margem bruta é a parcela que cobre todos os custos operacionais da concessionária e que remunera seus investimentos. Ele aponta que esse resultado tornará a Sulgás a concessionária de gás natural com a maior tarifa de distribuição do País. Um dos fatores que fez com que a Agergs admitisse um reajuste maior foi incorporar o imposto de renda de pessoa jurídica como um item que compõem o cálculo da revisão.
Lorenzon adianta que o novo patamar de custos deverá vigorar a partir da publicação da resolução (o que deve ocorrer na próxima semana) e da apresentação da concessionária da estrutura tarifária com base na deliberação. Ele comenta que desde a privatização da distribuidora, ocorrida em outubro de 2021, a tarifa da distribuidora praticamente triplicou. “Basicamente o recado que a Sulgás está dando é: indústria, procure outro insumo para consumir ou então saia do Rio Grande do Sul e vai para outro estado”, critica o integrante da Abrace Energia. Ele adianta que a tendência é de uma redução do consumo do gás natural no Estado.
Lorenzon diz que a Abrace analisará a decisão da Agergs para tentar entrar com um recurso quanto à determinação. A Fiergs também se posicionou sobre o tema, através de nota. Conforme a entidade, desde a primeira revisão tarifária após a conclusão do processo de privatização da Sulgás, as margens que remuneram o serviço de distribuição têm alcançado valores maiores em cada ciclo tarifário.
Segundo a Fiergs, em 2024, a margem submetida para aprovação foi de quase 76% em relação a 2023, o que representará, em apenas três anos da saída do Estado da composição acionária, uma majoração da margem de distribuição de quase três vezes. “Os valores estão impondo ao Rio Grande do Sul uma das tarifas de distribuição mais caras do País”, reitera a representação da indústria gaúcha.
A entidade enfatiza que, além de revisitar e modernizar cláusulas do contrato de concessão, como a exclusão do imposto de renda do cálculo da tarifa, é necessário delimitar os investimentos, que passam pela autorização do poder concedente, ao volume de gás disponível. Na primeira edição do INDX, encontro que promove diálogo estratégico entre empresários, autoridades e especialistas, nesta terça-feira (18), a Fiergs entregou ao governador Eduardo Leite 16 reivindicações, entre as quais, o pedido de análise da revisão tarifária da concessionária de gás natural.
Empresa defende cumprimento do contrato de concessão
Também em nota, a Sulgás se manifestou sobre a posição do órgão regulador, ressaltando que, “depois de 11 meses de atraso, a revisão tarifária de 2024 foi concluída pela Agergs nesta quinta-feira, com a análise final do pedido de reconsideração encaminhado pela Sulgás. A companhia sustenta, desde o início do processo, a importância do respeito ao contrato de concessão em nome da segurança jurídica e regulatória não só do setor do gás natural, mas de todo o setor de infraestrutura do Estado”.
Além disso, a companhia “saúda o avanço parcial do entendimento da agência, mas lamenta que ainda dois pontos (cálculo do ajuste e conversões) tenham ficado sem o devido reconhecimento, com reflexos diretos na sustentabilidade do negócio. Diante disso, a companhia aguarda manifestação do poder concedente (governo do Estado), que é o guardião do contrato, para a elaboração do melhor plano de investimento 2025, sempre com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento do Estado”.
A distribuidora enfatiza que vem cumprindo rigorosamente os planos de expansão aprovados anualmente pelo governo do Rio Grande do Sul, ampliando investimentos, promovendo o crescimento da rede e levando os benefícios do gás natural a cada vez mais clientes. De acordo com a companhia, somente no ano passado foram R$ 100 milhões investidos, contra R$ 46 milhões do período pré-privatização, com a conquista do marco de 100 mil clientes. “Isso significa desenvolvimento para o Estado, por meio do fortalecimento da segurança energética, com sustentabilidade”, conclui a empresa.
Já o diretor econômico-regulatório da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás), Marcos Lopomo, considera que, após o pedido de reconsideração, algumas das questões mais relevantes finalmente foram ajustadas, em consonância com o contrato de concessão. “Evitando um indesejado retrocesso no desenvolvimento e segurança energética do Rio Grande do Sul”, frisa o dirigente.
Ele acrescenta que a recente decisão recoloca o Estado em um ambiente de negócios de confiança. Lopomo ressalta que decisões regulatórias em qualquer região da federação podem afetar a segurança jurídica do setor de infraestrutura nacional como um todo.