Embora, aos poucos, as mulheres tenham ocupado cargos de liderança em profissões majoritariamente exercidas por homens, no Rio Grande do Sul, essa evolução ocorre devagar. O Dia Internacional da Mulher, celebrado neste sábado, 8 de março, reforça ainda mais esse cenário. Uma pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) indica que menos de 10% das startups do Estado são lideradas por mulheres.
O levantamento foi realizado pelo projeto “Papel das Mulheres na Geração de Inovação nas Empresas” e utiliza como base os dados do Scape Report, de 2021. Das 276 startups ativas na época da coleta das informações, apenas 26 eram lideradas por mulheres, sendo a maioria localizada em Porto Alegre e em Caxias do Sul, na Serra Gaúcha.
Entre as 276 startups, está a plataforma de seguros de viagem “O Tripulante”, de Porto Alegre. Fundada em 2011, a iniciativa surgiu como uma agência de viagens até se tornar uma empresa especializada em seguros, em 2015. “Nós, mulheres, como mães, acabamos arriscando menos e isso pode ser um dos fatores. Por que menos mulheres investem em ser empreendedoras e donas do próprio negócio?”, questiona a proprietária Aline Rodrigues de Aguiar.
O incentivo é um dos pontos fundamentais, de acordo com ela. Atualmente, Aline atua tanto na administração quanto nas vendas e mora nos Estados Unidos, juntamente com o marido, que também atua na empresa. Juntos eles seguem com atuação no território gaúcho. Ao todo, a empresa conta com quatro funcionários, sendo dois homens e duas mulheres.
Além dos desafios diários, o negócio enfrentou os impactos da pandemia. Durante o período, o casal percorreu 19 países e compartilhou a experiência por meio das redes sociais, como forma de manter as atividades.
De acordo com a professora Fernanda Reichert, responsável pela pesquisa da Ufrgs, existem, principalmente, três barreiras que afastam as mulheres do mercado de trabalho, independentemente da profissão, são elas: a questão estrutural, o ambiente hostil e as responsabilidades domésticas de forma desproporcional. “A questão estrutural ainda empurra as mulheres para fora desses ambientes mais tecnológicos e de inovação”, pontua.
Reichert ainda ressalta que há fatores que são consolidados ao longo dos anos, desde a infância. “A menina ganha a boneca e o menino ganha o lego, por exemplo. Não há nada de errado nisso, mas são pontos que vão direcionando para uma escolha de curso mais tarde”. Conforme a pesquisa, depois do ingresso no mercado, o ambiente também se torna hostil em diferentes aspectos, que incluem questões relacionadas à maternidade e até mesmo o suporte para captação de financiamentos - parte considerada fundamental para o desenvolvimento das atividades das startups.
Negócios gerenciados por homens recebem mais investimentos
Dados do Boston Consulting Group de 2018 apontam que startups criadas por homens receberam investimento em torno de US$ 2,12 milhões em cinco anos, enquanto as fundadas por mulheres obtiveram apenas US$ 935 mil, apesar de apresentarem maior retorno sobre o investimento.
Reichert salienta a ausência de dados nacionais e regionais de forma direcionada sobre a presença das mulheres no mercado de trabalho.
“Muitas vezes, a ideia de que as mulheres são menos capazes continua se reproduzindo depois da conquista da vaga e os colegas acabam considerando que elas estão ocupando os cargos por favorecimento, e não por merecimento e capacidade”, pontua. De acordo com ela, os empecilhos estão todos interligados à barreira de gênero estrutural, que distribui as tarefas domésticas de forma desproporcional.
Conforme a professora Julice Salvagni, que coordena o grupo GestAções, também da Ufrgs, a presença das mulheres no trabalho ainda é menor do que o esperado e ocorre em diferentes segmentos. “Por uma questão histórica e social da divisão sexual do trabalho, se constroem atividades que são mais voltadas às mulheres e outras aos homens”.
O projeto integra o Fairwork Brasil e aborda as lutas pela regulamentação do trabalho em plataformas. O último relatório, publicado em 2023, indica que das 10 plataformas analisadas, a maioria das trabalhadoras enfrenta condições de trabalho injustas e falta de proteções sociais.
Como exemplo, Salvagni menciona o caso das caminhoneiras, das mulheres que atuam na física, na Receita Federal e no exército, com base nos atravessadores de gênero dentro das perspectivas de trabalho. “Buscamos associações de motoristas de caminhão que tinham, em média, 1,5 mil associados e contava com a participação de apenas cinco ou seis mulheres”, detalha. A divulgação do terceiro relatório do Fairwork Brasil está prevista para o início do segundo semestre de 2025.
“Embora as mulheres tenham adentrado nas atividades consideradas ainda como masculinas, é difícil termos um número”, reforça Salvagni. O dia 8 de março marca a luta das mulheres pela igualdade de gênero. Além do direito de ir e vir de forma igualitária, o acesso ao mercado de trabalho, um dos espaços onde as desigualdades ainda se manifestam pela discriminação salarial, precarização, sobrecarga e violação dos direitos e violência.
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