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Publicada em 20 de Dezembro de 2024 às 16:31

CEO da Herval conta como madeireira de Dois Irmãos se tornou gigante multimarcas

Agnelo Seger fala da expansão do Grupo Herval ao longo dos anos e de projetos para o futuro

Agnelo Seger fala da expansão do Grupo Herval ao longo dos anos e de projetos para o futuro

TÂNIA MEINERZ/JC
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Guilherme Kolling e Fernanda Crancio, de Dois IrmãosCEO do Grupo Herval, Agnelo Seger, 71 anos, é um empresário inquieto. A empresa que ele comanda reúne 27 marcas na indústria, serviços e varejo e está sempre atenta a novas oportunidades. "Somos muito verticalizados", resume Agnelo. Em muitos casos, o grupo criou novos negócios a partir de produtos que comprava – passando a fabricar materiais para a indústria, por exemplo – ou terceirizava, caso do ingresso no setor de consórcios, há 30 anos.
Guilherme Kolling e Fernanda Crancio, de Dois Irmãos

CEO do Grupo Herval, Agnelo Seger, 71 anos, é um empresário inquieto. A empresa que ele comanda reúne 27 marcas na indústria, serviços e varejo e está sempre atenta a novas oportunidades. "Somos muito verticalizados", resume Agnelo. Em muitos casos, o grupo criou novos negócios a partir de produtos que comprava – passando a fabricar materiais para a indústria, por exemplo – ou terceirizava, caso do ingresso no setor de consórcios, há 30 anos.
A empresa, fundada no município de Dois Irmãos, no Vale do Sinos, há 65 anos, mantém a inovação e o empreendedorismo sempre no radar, a fim de seguir expandindo negócios. Com atuação em todo o Brasil no varejo – é responsável, por exemplo, pelas lojas iPlace –, o conglomerado também mantém fábricas no Estado e em Pernambuco, fabricando colchões e móveis, além de redes varejistas como a TaQi, e presta serviços com financiadora, seguradora e consórcios.
Agnelo, filho de um dos fundadores da Herval, se considera parte da primeira geração. "Sou a segunda geração, mas me considero um pouco da primeira, porque meu irmão, o Darci, é o funcionário número 7. E eu sou o funcionário número 9", conta.
Hoje, o grupo tem mais de 6,5 mil funcionários, sendo metade no Rio Grande do Sul e 2,6 mil trabalhadores em Dois Irmãos, município com 30 mil habitantes, de acordo com o Censo de 2022. Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, concedida no showroom da Uultis Store, marca de móveis com design de alto padrão do grupo, em Dois Irmãos, Agnelo fala da relação da empresa com sua cidade berço e analisa os desafios da indústria e do varejo no Brasil.
Jornal do Comércio – O Grupo Herval celebra 65 anos em 2024. Até lembro nos anos 1980 de passar na estrada e ver a fábrica na BR-116, em Dois Irmãos, pouco a pouco crescendo, com novos pavilhões ao longo dos anos. A empresa começou com uma madeireira. Como foi essa expansão para um grupo multimarcas?
Agnelo Seger – Viemos para cá (atual sede na BR-116) há 38 anos e fomos aumentando. Nossa sede era no Centro (de Dois Irmãos), e ali não tinha mais como expandir. Tínhamos um vizinho muito legal, a família Engelmann, que sempre vendia um pedacinho (do terreno vizinho). A cidade era pequena. Aqui (na 116) era para ser o distrito industrial de Dois Irmãos, e mudamos para cá. Compramos, na época, todo ele, onze propriedades diferentes (do distrito), que consolidamos, esses 11 lotes. Começamos com um pavilhão e fomos aumentando. Depois compramos mais algumas (propriedades) do outro lado do rio. Hoje temos cerca de 220 mil metros (quadrados) de área construída aqui.
JC – A última expansão foi concluída no ano passado...
Agnelo – Começamos na pandemia (a expansão), fomos terminando o prédio. Sempre tem alguma coisa em obra (no complexo da Herval): máquina nova, precisamos ampliar algum lugar ou instalações. Então, isso é permanente.
JC – O senhor está no comando da empresa desde quanto?
Agnelo – Faz tempo. Meu pai, infelizmente, faleceu novo, com mais ou menos a idade que tenho hoje, 71 anos... Foi em 1997 (a morte do pai), já fazem 27 anos. Mas já estava antes (no comando do Grupo Herval), ele sempre foi muito abnegado, já fez a transição antes. Eu já era sócio da empresa antes de os meus irmãos serem. Mas ele fez a transição em vida, sempre foi um comerciante. E é a eles, nossos pais, a quem devemos os alicerces de tudo isso.
JC – E o início da empresa, como foi?
Agnelo – Começou pequena, com meu pai, Felippe Seger Sobrinho. Foi fundada no dia 1º de outubro de 1959. Tinha uma comissão emancipadora (da cidade de Dois Irmãos), e três membros participaram também da fundação da empresa. No dia 10 de setembro (de 1959), Dois Irmãos se separou de São Leopoldo. E aí o pessoal, com visão de progresso, disse: "Dois Irmãos vai crescer, vamos abrir uma madeireira, material de construção". E começamos em 1º de outubro. Justino Vier, que foi o primeiro prefeito, meu pai – que foi vice-prefeito em outra época, não nessa primeira eleição, mas foi vereador nessa primeira leva – e seu Edvino Utzig. Eram três membros: meu pai representava Morro Reuter / Walachai, Justino representava a sede e o professor Edvino Utzig representava Picada São Paulo. E tinha mais sócios no início, dia 1º de outubro criaram a empresa.
JC – Menos de um mês depois da emancipação de Dois Irmãos.
Agnelo – Exatamente, a história do município e da nossa empresa se confundem. Tínhamos a fábrica lá na matriz, na (rua) Irineu Becker. No Centro (de Dois Irmãos) tinha o varejo e a indústria. Começamos aqui (na sede na BR-116) com a fábrica de móveis estofados. E começamos a multiplicar os ramos. Hoje são diversas indústrias no mesmo guarda-chuva. Antes era tudo Madeireira Herval, mas mudamos o nome. Somos clientes das maiores indústrias químicas em função da espuma de poliuretano. E também somos os maiores parceiros da Apple no Brasil. Então ficava mal (manter apenas) Madeireira Herval. Aí mudamos: o varejo ficou Global Distribuição de Bens de Consumo Ltda. E a indústria fizemos questão de ficar com Herval.
JC – A indústria também tem uma atuação diversificada...
Agnelo – Na indústria temos o setor de divisão química, ou Hquímica. Fabricamos estofados, mas muitas indústrias fazem questão de colocar na internet ou no produto que eles usam a espuma Herval ou da Hquímica. Na Hquímica fazemos injetados que tanto podem ser para cadeiras, para automobilística, para calçados, solados. Solado foi o início do nosso injetado, mas como (a fabricação de) sapato migrou muito para a China, continuamos fazendo, mas não em tanto volume. Migramos para assentos de cadeira de escritório. E temos uma pequena unidade de fabricação de laminados de látex, que compramos no passado. É um complemento dentro da indústria do calçado... E somos autossuficientes na produção da manta de poliéster – o excedente vendemos ao mercado. Então, somos uma empresa muito verticalizada. Na indústria de móveis, fabricamos colchões de espuma, de mola, estofados, que foi nosso início na parte moveleira. Fazemos móveis de madeira para sala de jantar, cadeiras, dormitórios, cozinhas, a chamada "indústria de impressão", com chapas de MDF ou MDP. Então, temos uma atuação que abrange toda a cadeia moveleira, além de fornecer produtos para esse ramo.
JC – O grupo tem essa lógica de criar novos negócios ligados a seus produtos, se compra muito determinado suprimento, tenta passar a fabricá-lo. E também a vender esse produto no varejo, outro braço importante do Grupo Herval...
Agnelo – No varejo, temos as Lojas TaQi, mudamos em 2010, antes eram Herval. Tem também a parte de atacado. E temos as (lojas) iPlace (que vendem produtos Apple) no Brasil inteiro, além da HT Solution, somos distribuidores da HP (Hewlett-Packard Company, gigante da área de tecnologia).
JC – O grupo ainda tem uma atuação forte no setor de serviços.
Agnelo – Temos HS Financeira e a HS Corretora de seguros. E a HS Consórcios, empresa super importante. Nesse ano, devemos vender R$ 20,5 bilhões de valor em consórcios. Vendemos consórcios de automóveis, outros bens, e principalmente de imóveis. Se olhar no Banco Central, os dados são públicos, tirando três ou quatro grandes bancos, depois já vem a HS Consórcios nesse ramo de imóveis. Precisa de muita credibilidade. Há 30 e poucos anos, vendíamos consórcio no varejo – geladeira, TV, eletrodoméstico nas lojas. Aí chegou um momento das contemplações em que começou a ter problema. O pessoal chegava com o carnê quitado e dizia: "eu quero meu produto". E aí (a empresa responsável pelo consórcio) não dava a carta de crédito. Mas os clientes diziam: "eu comprei da Herval e eu quero ganhar o meu produto". Então conversamos, eu, meu irmão e meu pai, e o pai disse que tínhamos que assumir a bronca, "porque o cliente era nosso", comprou na Herval. Aí eu disse: "vamos vender consórcio novamente no momento em que pudermos garantir o que formos vender".
JC – Mais uma oportunidade de negócio... Entrou no ramo de consórcios.
Agnelo – Oportunidade de negócio. Fizemos um plano, apresentamos ao Banco Central e uns seis meses depois já estava aprovado. E começamos a vender consórcio de eletrodomésticos. Isso faz 30 anos. Depois fomos para o automóvel. Vendemos muito e fomos evoluindo. Imóveis é o grande (filão)...
CEO do Grupo Herval, Agnelo Seger, comenta trajetória de 65 anos da empresa e do município de Dois Irmãos | TÂNIA MEINERZ/JC
CEO do Grupo Herval, Agnelo Seger, comenta trajetória de 65 anos da empresa e do município de Dois Irmãos TÂNIA MEINERZ/JC

JC – Atualmente entre indústria, varejo e serviços são 27 marcas no grupo?
Agnelo – Isso.
JC – E o grupo tem atuação com lojas no exterior também?
Agnelo – Sim. Temos a Apple no Uruguai, com duas lojas. E nos Estados Unidos vendemos móveis da Uultis, marca premium.
JC – Dos 6,8 mil funcionários do Grupo Herval, quantos trabalham em Dois Irmãos e no Rio Grande do Sul?
Agnelo – No Rio Grande do Sul, são 3 mil e poucos (funcionários). Só em Dois Irmãos, são uns 2,6 mil trabalhadores. Temos fábrica em Pernambuco, no Nordeste. O restante é espalhado pelo varejo no Brasil inteiro. E tem os CDs (Centros de Distribuição) em São Paulo e no Espírito Santo.
JC – E o faturamento do grupo todo?
Agnelo – Em torno de cinco (R$ 5 bilhões ao ano).
JC – Vemos indústrias gaúchas expandindo operação com grandes investimentos em outros estados. Seguem investindo no Rio Grande do Sul, mas com cifras menores. Há espaço para o Grupo Herval se expandir no Rio Grande do Sul com novos investimentos na indústria?
Agnelo – Temos um problema sério que é a falta de mão de obra. Há poucos dias, tínhamos 100 vagas abertas. A cidade (de Dois Irmãos), tinha 300 vagas em aberto. Então, é difícil. Toda hora fazemos novas linhas de ônibus (para transportar trabalhadores), vamos até Parobé, tem ônibus que sai de Porto Alegre...
JC – Falta mão de obra...
Agnelo – Falta mão de obra mesmo. E Dois Irmãos tem problema de falta de mão de obra qualificada também. É complicado. Tem segmentos em que é preciso trazer pessoas de outro estado... Quando fizemos a indústria em Bezerros (PE), construímos aqui em Dois Irmãos um alojamento e trouxemos 60 pessoas de Pernambuco, para pegar um pouco a cultura, a mentalidade da Herval. Estamos pensando em reativar esse alojamento e ir ao encontro desses lugares onde as pessoas perderam tudo (na enchente de maio). E fazer algo para famílias, com a casa montada e oferecer emprego, para atrair pessoas, porque realmente é um problema. Na nossa região, vivemos o pleno emprego. Quem não trabalha realmente não quer.
JC – Além da mão de obra, a questão logística é outro desafio do Rio Grande do Sul?
Agnelo – Sim. Temos problemas enormes na questão de logística, porque o custo... No mobiliário, no colchão, temos que ser praticamente 10% mais competitivos, porque isso é o custo da logística do frete para o Sudeste. E o grande mercado é o Sudeste. Vendemos no Brasil inteiro, principalmente colchões e estofados. No Norte e Nordeste fornecemos pela indústria de lá (Pernambuco). Esse foi o motivo (para criar essa nova fábrica lá) e, claro, também tem incentivo, que é importantíssimo para o desenvolvimento daquela região. E lá tem mão de obra à vontade.
JC – Quando foi inaugurada a planta em Pernambuco?
Agnelo – Vai fazer 10 anos, foi em 2015. É uma planta moderna.
JC – Em entrevista ao Jornal do Comércio, há alguns anos, o senhor se preocupava com a desindustrialização no Brasil. Isso continua?
Agnelo – Existem indústrias que estão saindo do País. Outras estão diminuindo. Daqui a pouco vamos depender do importado. Então, a indústria já teve uma participação muito mais representativa no PIB (do Brasil). E a questão do Custo Brasil é extremamente complicada. Tem a parte tributária, a insegurança jurídica também. As empresas, quando investem, precisam ter segurança. Uma vez, um julgado de uma questão tributária é uma coisa, na segunda, passa a ser outra. Então, como faz? É complicado. Sei que, com a reforma tributária, vai simplificar. De início, ainda vai complicar, porque vamos ter dois sistemas até que a se tenha a adequação. Mas me preocupa a alíquota que estão colocando, estão falando em 27% (a entrevista foi concedida antes da regulamentação da reforma, a projeção agora é de 28,5% de alíquota). Lá em Miami (EUA), o IVA (imposto) é 6%, 7%. E a simplicidade (tributária) é tão grande, o contador ganha US$ 200. A parte trabalhista é simples, não é que nem aqui. Agora a discussão é seis por um (da jornada de trabalho)... São coisas que vão para custo, alguém paga. Não tem almoço de graça. A sociedade paga.
JC – Simplificação da parte tributária é um caminho...
Agnelo – Nós (Grupo Herval) temos tributação municipal, porque temos assistência técnica, temos a estadual, porque estamos em todos os estados da federação, e temos federal, que é comum. Então, é complicado. E aí precisa de gente, gente, gente, por causa das mudanças (tributárias), aí um estado inventa uma coisa, as vezes é entre os estados e municípios. É terrível, é muito complicado. Então, não é à toa quando vemos que o Custo Brasil onera demais o produto. O brasileiro, de forma geral, paga caro pelas coisas, pelo imposto... Quando tu sai (ao exterior), pensa, às vezes: "puxa vida, como pode ser (mais barato no exterior)"... Mas é imposto, imposto. Essa coisa de "ah, o salário poderia ser maior". Sim, mas é que o funcionário que me custa um – a gente fala que custa dois – mas custa, no mínimo, 1,8 (o valor do salário para a empresa, incluindo encargos).
JC – Como vê o desafio da inovação para a indústria?
Agnelo – A inovação, a indústria 4.0 e agora falando muito na Inteligência Artificial... Eles (executivos da Herval) estiveram na convenção mundial da HP em Las Vegas há três meses. E voltaram abismados. "Olha, temos que desenvolver isso (aplicação da Inteligência Artificial) urgentemente."
JC – E na questão da inovação entra também a educação, a formação para isso.
Agnelo – Sim, a educação é extremamente importante. Estamos querendo desenvolver aqui, não sei se através de startups, alguma coisa. Precisamos trabalhar em cima disso (inovação), rever processos. Porque isso é o que nos trouxe até aqui e é a garantia do que vai nos levar para os próximos anos. E sentimos. O varejo mudou muito. Na pandemia e no pós-pandemia, as pessoas, o e-commerce, a internet... E aí vemos gigantes tomando fatias.... isso é preocupante. Então, temos que nos reinventar.
JC – Qual é a perspectiva das redes locais de varejo em meio a fusões, aquisições e o avanço das big techs e do e-commerce?
Agnelo – Temos que cuidar da proximidade das pessoas, oferecer serviços, não basta só o produto. Tem que cuidar dessas coisas. É preciso estar atento... O juro era 2% e disparou, isso criou um problema para as empresas, pela questão do financiamento e da inadimplência. Então, o varejo sofreu muito. E continua, teve mudanças no e-commerce... E se o governo não parar de gastar, as coisas vão ficar mais difíceis. Se não fizer o dever de casa, eu prevejo que o fim desse governo vai ser parecido com o da Dilma (Rousseff, que terminou com a crise de 2015-2016). Só que é difícil, as promessas são tantas... E aí deputados colocam as emendas, pegam um volume enorme, e não sobra dinheiro para certos investimentos. Então, é complicado, essa briga não é fácil.
JC – Como vislumbra o futuro?
Agnelo – Muito para essa questão de serviços. E o varejo tem que entender muito essa questão de proximidade (com o cliente). Então, é preciso rever processos, rever um monte de coisas. Vejo que o varejo tem nichos, como esse de colchões (premium, nova marca Volis Colchões, do Grupo Herval), assim como abrimos alguns quiosques da Mistertech em shoppings, outra marca que temos em que vendemos não só Apple, vendemos multimarcas de eletrônicos. Então, estar próximo do consumidor e essa questão de serviços. E uma revisão total de processos com a Inteligência Artificial.
JC – Tem alguma projeção de novo investimento industrial futuro aqui no Estado?
Agnelo – Essa questão de mão de obra é realmente séria. Então, onde dá para substituir pessoas por máquinas, temos que fazer. Sobre investimentos, como já disse, somos muito verticalizados, então, vamos seguir investindo (de acordo com oportunidades). Também em automação, tecnologias e processos...

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