O governo federal estima que o acordo de livre comércio anunciado nesta sexta-feira (6) entre o Mercosul e a União Europeia (UE) deve aumentar o fluxo de comércio entre o Brasil e o bloco europeu em R$ 94,2 bilhões, o que representa um impacto de 5,1% no comércio atual. O governo ainda estima um impacto de R$ 37 bilhões sobre o Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e serviços produzidos no País), ou seja, cerca de 0,34% da economia brasileira.
Como a redução das tarifas de importação é gradual, o impacto estimado pela equipe econômica é para o ano de 2044. Com a redução das tarifas, o governo estima que haverá um aumento de R$ 42,1 bilhões das importações da UE e um crescimento de R$ 52,1 bilhões das exportações brasileiras para o bloco.
A União Europeia é o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás apenas da China. Em 2023, a corrente comercial entre Brasil e o bloco europeu representou 16% do comércio exterior brasileiro.
O professor Giorgio Romano Schutte, membro do Observatório da Política Externa e da Inserção Internacional do Brasil (Opeb), avaliou que o acordo está melhor que o negociado em 2019, entre outros motivos, pelo fato de o Brasil ter colocado salvaguardas para o setor automotivo, para impedir que as importações de carros europeus prejudiquem a indústria no Brasil.
"Mas isso vai depender do governo de plantão, se ele vai usar ou não o poder de salvaguarda", disse.
Professor de relações internacionais da Universidade Federal do ABC paulista (UFABC), ele ponderou que os impactos econômicos do acordo demoram a ser sentidos e são limitados. Ele lembrou que apenas a China tem uma corrente comercial com o Brasil superior aos 27 países da União Europeia somado com o dos Estados Unidos.
"O impacto não é assim tão rápido. A geração de empregos deve demorar a dar resultados. Mas com esse acordo você aumenta o comércio. Além disso, com o acordo, aumenta o poder de negociação com a China e os Estados Unidos. Tem um elemento político também nesse acordo, para além do econômico. Agora, algumas poucas empresas brasileiras e do Mercosul vão conseguir aproveitar para fazer negócios na União Europeia, com certeza", analisou Giorgio Romano.
O governo brasileiro estima ainda um aumento de R$ 13 bilhões em investimentos no Brasil, o que representa um crescimento de 0,76%. Espera-se ainda uma redução de 0,56% nos preços ao consumidor e aumento de 0,42% nos salários reais. Tudo apenas para 2044, disse Giorgio Romano.
A redução das tarifas que o Mercosul cobra da UE pode ser imediata ou ao longo de prazos, que variam entre 4 anos a 15 anos. Para o setor automotivo, os períodos de redução tarifária são mais longos, variando de 18 anos a 30 anos para veículos eletrificados, movidos a hidrogênio e com novas tecnologias.
Do lado da UE, a redução tarifária também pode ser imediata ou por períodos que vão de 4 anos a 12 anos, a depender do produto.
Estão previstas ainda cotas para produtos agrícolas e agroindustriais do Brasil. Ou seja, acima de determinada quantidade, alguns produtos começam a pagar a tarifa cheia para entrar no bloco. Entram nessa categoria produtos como carne suína, etanol, açúcar, arroz, mel, milho e sorgo, queijos, entre outros.
Para o professor Giorgio Romano Schutte, essa é a principal assimetria do acordo. "No caso dos produtos industriais da União Europeia, eles entram sem cotas, sem restrições ao volume. E no caso dos produtos agrícolas do Mercosul, tem cotas", lembrou.
Agronegócio brasileiro celebra tratado comercial
O acordo comercial entre Mercosul e União Europeia é "muito importante" para a agropecuária brasileira, segundo o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro. Para ele, o acordo vai permitir maior "liberdade comercial" para exportação de produtos agropecuários do Brasil. "Prevê, por exemplo, tarifa zero para frutas, café e outros produtos brasileiros e cotas importantes (com tarifas reduzidas) para exportação de açúcar, carne de frango, carne bovina e etanol", detalhou o ministro. Segundo Fávaro, o Brasil vai mostrar a sua competência com o acordo, podendo acessar mercado relevante, como a União Europeia. "O presidente Lula se dedicou, todos nós trabalhamos e o resultado está aí. Com a tradução do acordo, a implementação dele nos próximos meses, vamos aproveitar as oportunidades econômicas. O Brasil e o Mercosul ganham muito com esse acordo formalizado", concluiu.
A Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) celebrou o avanço do tratado e reconhece sua importância estratégica a ambos os blocos para a expansão de oferta e a segurança alimentar e energética da União Europeia diante dos limites impostos pelo conturbado cenário geopolítico global. "Pelo lado do Mercosul, a expectativa é de um gradual incremento do PIB do bloco gerado pela facilitação de investimentos e redução e ou isenção de taxações da UE a produtos originários da América do Sul. Isso permitirá o aumento da capacidade do bloco em promover o desenvolvimento sustentável e o atendimento a demandas socioambientais e econômicas recorrentes", disse a entidade, em nota assinada pelo presidente Luiz Carlos Corrêa Carvalho.
Especificamente para o agronegócio, em 10 anos, a entidade destaca que a UE deve isentar em mais de 80% as importações agrícolas do Mercosul e dar acesso preferencial com menor tarifa a diversos produtos. Para o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Ricardo Santin, o acordo deve fortalecer ainda mais a relação entre os exportadores do Mercosul e consumidores europeus. "A consolidação do acordo abre novas oportunidades de embarques para o mercado europeu, em condições mais vantajosas do que as cotas atualmente existentes para embarques de produtos brasileiros à União Europeia."
Fiergs vê vantagens para a indústria do Rio Grande do Sul
O acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia é visto com expectativa positiva pela Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs). "A concretização do acordo é um passo importante para o futuro da economia do Brasil e do Rio Grande do Sul. Poderá nos trazer crescimento do fluxo de comércio e de investimentos, maior inserção do Brasil nas cadeias globais de valor, aumento da diversificação econômica e fortalecimento do Mercosul", disse o presidente da Fiergs, Claudio Bier.
Ele aponta como um dos principais benefícios para a indústria gaúcha o maior acesso do segmento alimentício ao mercado europeu, já que o acordo se compromete a isentar 82% das importações agrícolas do Mercosul e dar acesso preferencial com tarifa menor a 97% dos produtos. Em 2023, o Rio Grande do Sul foi o sexto estado brasileiro que mais exportou para a União Europeia e o sétimo que mais importou do bloco.
Na visão do setor calçadista, o acordo prevê a desgravação dos impostos atualmente pagos pelo calçado brasileiro importado nos países do bloco europeu ao longo de 10 anos. Hoje, os calçados comercializados pelo Brasil com a UE pagam tarifas de importação entre 3,5% e 17%. "Certamente, esperamos um impacto importante para as exportações brasileiras, pois teremos preços mais competitivos", avalia o executivo.