Entidades das justiças Federal, Eleitoral, Militar e do Trabalho, além dos membros do Ministério Público, divulgaram notas conjuntas com críticas à PEC (proposta de emenda à Constituição) que reduz as exceções ao teto salarial do funcionalismo, hoje em R$ 44 mil. A medida integra o pacote de cortes de gastos anunciado pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A proposta do Ministério da Fazenda mantém como exceção ao limite de remuneração apenas as indenizações citadas em uma lei complementar que deveria ser aprovada logo depois da emenda à Constituição. O Poder Judiciário tem precedentes de uso de penduricalhos para inflar salários acima dos limites legais.
Os grupos representativos das carreiras da Justiça afirmam que a medida pode ter efeitos adversos, como o risco de aposentadoria de quase metade dos juízes e desembargadores."Aproximadamente 40% dos magistrados contam atualmente com os requisitos para aposentadoria e, caso a PEC seja aprovada, muitos poderiam optar por se aposentar imediatamente", afirma comunicado.
"As vagas abertas em decorrência das aposentadorias precisariam ser supridas com novas contratações, o que significaria mais gastos com concursos públicos", acrescenta o texto. Por isso, segundo os magistrados, a medida "iria em contrariedade ao objetivo pretendido na proposta" de reduzir gastos públicos.
Ainda de acordo com a nota, o governo deveria embasar suas decisões em estudos técnicos que considerem a realidade institucional do Judiciário, já que haveria custos com realização de concursos e previdência.
A manifestação é assinada por Conselho de Presidentes dos Tribunais de Justiça do Brasil (Consepre), o Colégio Permanente de Presidentes dos Tribunais da Justiça Militar, o Colégio de Presidentes dos Tribunais Eleitorais do Brasil (Coptrel), O Colégio de Presidentes e Corregedores dos Tribunais Regionais do Trabalho (Coleprecor) e os Presidentes dos Tribunais Regionais Federais das seis regiões da Justiça Federal. O material está disponível no site do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que atua no Rio de Janeiro e no Espírito Santo.
A Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), o Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais (CNPG), a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e a Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho (ANPT) também se posicionaram contra a PEC e repetiram o argumento de quase 40% dos servidores cumprirem requisitos para a aposentadoria.
O trecho que trata dos supersalários, segundo os membros do MP, teria "impactos incalculáveis para o funcionalismo público em geral, para a previdência pública e, sobretudo, para a população brasileira. As entidades defendem "maduro diálogo" para enfrentar o tema.
Hoje, a remuneração na Justiça é regida por resoluções do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que têm status de lei ordinária. Segundo técnicos do governo, o uso de instrumento no mesmo nível hierárquico para regulamentar o teto do funcionalismo seria facilmente contornável. Daí, viria a necessidade de tratar do tema na Constituição.
A escolha de uma lei complementar para definir as indenizações também permitiria que o governo regulamente o tema para estados e municípios, onde há brechas ainda maiores para penduricalhos.
Apesar das críticas aos trechos da PEC que tratam do funcionalismo público, juízes e procuradores elogiam o esforço do governo para promover um ajuste fiscal e respeitar o arcabouço fiscal.
Câmara avança com projeto do pacote de gastos, e governo corre contra o tempo
Ampliação do teto de isenção do IR ainda será enviada ao Congresso
TÂNIA MEINERZ/JCA Câmara dos Deputados aprovou o primeiro requerimento de urgência para um dos projetos do pacote de corte de gastos do governo Lula (PT), que agora busca viabilizar que todas as propostas sejam aprovadas até o fim do ano.
Teve urgência aprovada o projeto de lei complementar que submete novas despesas ao arcabouço fiscal, e há acordo para que o mesmo aconteça com a proposta do pente fino no BPC (Benefício de Prestação Continuada). A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para tratar dos supersalários ainda não começou a avançar.
O andamento do pacote enfrenta dificuldades no Congresso Nacional, sobretudo por causa da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que criou exigências para o funcionamento das emendas parlamentares.
A aprovação da urgência foi o primeiro passo do pacote. Segundo líderes, contribuíram para a votação acenos recentes do governo, como o encaminhamento da liberação de emendas e a articulação para reverter a decisão do STF. Um apelo do governo e também do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), teria sido importante para destravar este primeiro passo das matérias, segundo dois deputados que participaram das negociações.
Mesmo assim, um influente aliado de Lira afirmou que não foi formado compromisso sobre o conteúdo dos textos, que ainda deve sofrer intenso debate e modificações, e não há certeza de que tudo será aprovado até o final do ano, como deseja o governo.
Os textos ainda precisam de definição de relator e dos próximos passos de suas respectivas tramitações.
Além destes três, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, promete enviar ao Congresso a revisão da previdência dos militares, a ampliação da isenção do Imposto de Renda (IR) para R$ 5.000 e a taxação da renda acima de R$ 50 mil para completar o pacote.
Na última terça-feira, havia a expectativa que as urgências para os textos do BPC e de submissão de despesas ao arcabouço fosse votada, o que não aconteceu em razão das divergências.
O governo planejava iniciar a tramitação da PEC na quarta-feira, pela Comissão e Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, mas precisou recuar.
"Hoje o governo não tem voto sequer para aprovar a urgência dos projetos de lei. A PEC [proposta de Emenda à Constituição] eu coloquei na Comissão de Constituição e Justiça e foi retirada a pedido do governo, porque não tinha certeza de um mínimo de votos para aprovar", disse o presidente da Câmara, Arthur Lira, na manhã desta quarta.
"Não tenho dúvida de que Congresso não vai faltar, mas está num momento de muita turbulência interna por causa desses acontecimentos. Você não deve ver nunca um tribunal legislando", completou.
Lira se referiu à decisão de Dino, depois referendada pelo plenário do STF, que liberou o pagamento de emendas parlamentares represadas de 2024, mas ampliou as exigências de funcionamento deste mecanismo.
Parlamentares se incomodaram sobretudo com a necessidade de indicação dos autores das emendas de comissões, e a definição de um limite de crescimento destas despesas, e dizem que o Supremo interferiu na atribuição do Congresso de legislar.
Há divergências também sobre o conteúdo do pacote, inclusive entre aliados de Lula - o governo já admite debater, por exemplo, a criação de um escalonamento para corte de gastos tributários dentro da PEC, mudança apresentada pela sua base.
União Brasil e PSD, partidos que compõem a Esplanada dos Ministérios de Lula, também estão insatisfeitos com a relação com o governo, e não garantem apoio à pauta.
O Planalto agiu junto ao Supremo para tentar amenizar a crise, prometendo liberar R$ 7,8 bilhões em emendas até esta sexta-feira, e acionando a AGU (Advocacia Geral da União) para tentar fazer Dino modular sua decisão.