Com consulta pública aberta para contribuições até o dia 7 de outubro, quando ocorrerá audiência promovida pela Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs), o processo de revisão tarifária ordinária da Sulgás novamente motiva críticas do setor industrial quanto ao percentual proposto, como ocorreu no ano passado. A possibilidade analisada pelo órgão regulador é de fixar uma margem bruta para o metro cúbico de gás natural comercializado pela distribuidora de R$ 0,8207, o que representa um incremento de cerca de 75%, em relação aos R$ 0,4681 estipulados na revisão anterior. Esse valor é considerado desproporcional pela Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace Energia).
A discussão em questão refere-se a um dos componentes que formam o preço final do gás natural que chega ao consumidor. A margem bruta é a parcela que cobre todos os custos operacionais da distribuidora, que remunera seus investimentos e reembolsa os impostos sobre a renda. Esse item corresponde a cerca de 20% do preço do combustível que chega ao cliente, que é composto ainda pelo gás em si e tributos.
Segundo o diretor comercial da Sulgás, Silvio Del Boni, aprovada a revisão da margem bruta como está posta agora, o impacto para um consumidor industrial da concessionária será na ordem de 8%. A distribuidora também sugeriu à Agergs que os efeitos desta revisão sejam diluídos ao longo de 18 meses. Del Boni diz que, confirmada essa projeção, a perspectiva é que o metro cúbico do gás natural para a indústria fique em R$ 3,21, a partir de novembro, quando passa a vigorar a nova tarifa.
Ele afirma que é do interesse da companhia que o mercado sinta o reajuste da menor forma possível e por isso a distribuidora indicou o diferimento. “Mas, que isso também não cause o desbalanceamento do equilíbrio financeiro da empresa”, assinala o dirigente.
Del Boni enfatiza que a expansão do fornecimento de gás natural no Rio Grande do Sul só será possível se a Sulgás contar com uma margem que suporte o seu crescimento. Neste ano, a concessionária já passou o patamar de 1,5 mil quilômetros de rede de gasodutos e deve atingir o número de 100 mil clientes em novembro, somando um investimento no total de 2024 de aproximadamente R$ 100 milhões, além de aumentar o número de cidades alcançadas de 39 para 42.
Apesar dos argumentos da Sulgás, o setor industrial manifesta preocupação quanto ao desfecho da revisão tarifária da concessionária. “Pensando na tarifa de distribuição, que serviço público tem reajuste de 75% de um ano para outro? Não existe”, fulmina o diretor de Gás Natural da Abrace Energia, Adrianno Lorenzon. Ele acrescenta que não é a primeira vez que a Sulgás, desde a sua privatização em 2021, pratica uma revisão elevada. O dirigente ressalta que o Rio Grande do Sul, confirmado o incremento, ficará com a tarifa e o preço final do gás natural mais caros do Brasil.
Entre as opções para atenuar essa situação, citadas pelo representante da Abrace Energia, está a alteração do acordo de concessão, algo que Lorenzon lembra foi mencionado em uma nota técnica da Agergs. O documento da agência comenta que “tendo em vista a tendência ascendente nos últimos anos para o valor da margem bruta, argumentamos pela necessidade de adequação do contrato de concessão à atual realidade macroeconômica do País”.
No entanto, o diretor da Abrace Energia considera que essa linha de ação é complexa. Outra possibilidade é procurar alguma alternativa regulatória como, por exemplo, retirar a inclusão do imposto de renda como componente da revisão tarifária da Sulgás.
Associação de consumidores receia troca por outros combustíveis
O diretor de Gás Natural da Abrace Energia, Adrianno Lorenzon, teme que o uso do gás natural no Rio Grande do Sul fique impraticável e ocasione a migração dos consumidores industriais para outros combustíveis ou até mesmo que essas empresas interrompam suas atividades. Sobre a possibilidade do diferimento do reajuste por 18 meses levantada pela Sulgás, ele salienta que é uma solução semelhante a alongar uma dívida, não resolvendo o problema principal que é a questão do custo do insumo em si.
“O gás para a indústria do Rio Grande do Sul está alinhado com os demais estados do Centro-Sul do País, uma hora vai estar um pouco acima, outra um pouco abaixo”, retruca o head institucional da Commit Gás (uma das acionistas da Sulgás), Lucas Simone. O diretor comercial da Sulgás, Silvio Del Boni, acrescenta que outros combustíveis, como GLP, diesel e gasolina, também estão sofrendo aumentos e ele considera que esses rivais não estão mais competitivos em relação ao gás natural.
No entanto, o dirigente admite que o grande desafio da companhia é a concorrência com o preço do gás natural praticado em outros estados. Um fator que gera problemas para a distribuidora gaúcha é o fato do Rio Grande do Sul não ter produção de gás natural local, implicando uma distância maior para o transporte da chamada “molécula” até a região demanda, encarecendo o combustível.