O que esperar da economia em um mundo cada vez mais cercado de incertezas? De acordo com o economista iraniano, radicado nos Estados Unidos, Nouriel Roubini, o futuro deve ser sombrio, ainda que haja esperança. "Vivemos em um mundo de incertezas sem precedentes. Vivemos em mundo de riscos, ameaças e até, potencialmente, de caos", afirmou na abertura de sua conferência da 24ª Edição do Fronteiras do Pensamento, na noite desta quarta-feira (7), no Teatro da Unisinos, em Porto Alegre.
Ao longo de uma hora, ele enumerou 10 'mega-ameaças', aprofundadas em seu último livro, que devem tornar a existência humana dos próximos anos uma "crise permanente", que envolve diversas situações, depois de décadas de relativas 'paz e prosperidade' com o fim da Segunda Guerra Mundial. Entre os principais riscos estão as mudanças climáticas, o crescimento das pandemias, o uso da inteligência artificial, a desdolarização, os ataques às democracias, como os que ocorreram nos Estados Unidos e no Brasil, a imigração em massa, e os conflitos geopolíticos atuais. Na visão de Roubini, essas ameaças têm se acentuado nas últimas décadas, mas com proporções relevantes principalmente depois da pandemia de Covid-19.
Ele destacou que, antes da pandemia do corona vírus, as preocupações econômicas eram outras. "Antes da pandemia, tínhamos baixa inflação. Depois do corona vírus, temos inflação de dois dígitos". O economista ressaltou que antes da Covid, os Bancos Centrais tinham taxas de juros mais baixas, com flexibilização de crédito e que, hoje, há mais taxas positivas e que isso gera consequência sobre dívidas. Outro ponto importante é em relação a globalização. "Antes falávamos de hipercomercialização, abertura de mercado, livre troca comercial. Hoje, a tendência é a desglobalização e o crescimento do protecionismo", apontou.
Nouriel Roubini participou do evento Fronteiras do Pensamento na noite desta quarta-feira (7) em Porto Alegre
EVANDRO OLIVEIRA/JC
A desdolarização, como chamou o especialista, também é uma preocupação para o modelo econômico que reinou por tantas décadas. "Antes as pessoas reclamavam do dólar, mas essa era a moeda reserva do mundo. Depois da pandemia, muitos países falam em desdolarização, querem acabar com os seus ativos em dólar", afirmou. Ainda que isso possa ser um problema, também é uma forma de evitar sanções econômicas do EUA e da China, por exemplo.
No contexto global, ele destacou, ainda, as guerras entre Ucrânia e Rússia e entre Israel e Hamas. "A violência pode escalar, pode envolver o uso de arma nuclear e isso é chocante. Tem potencial para se tornar um conflito global", ponderou, referindo-se à invasão russa. Já sobre Israel e Hamas, ele teme que outros países do Oriente Médio entrem no conflito de forma mais agressiva. Roubini também teme que a atual 'guerra fria' comercial, como definiu, entre Estados Unidos e China, possa virar um conflito bélico, forçando países emergentes, como o Brasil, a terem que tomar partido e enfrentar consequências econômicas.
"Países como o Brasil ou a África do Sul, por serem emergentes, se relacionam bem tanto com Estados Unidos quanto com a China. No futuro, esses países podem cobrar posições dos seus parceiros e isso pode afetar a economia dos países em desenvolvimento. Não é questão de 'se', mas de 'quando' isso vai acontecer", ponderou. Ele também aponta que é nestes países mais pobres que a inteligência artificial pode causar desemprego em massa, além de disseminar fake news.
Por fim, Roubini conectou todos os fatores, ressaltando que se influenciam mutuamente. "Vivemos num mundo onde todos os anos acontecimentos disruptivos ocorrem sem que possamos controlar. Não há um problema maior, porque eles estão interligados. Há grandes riscos. Alguns são econômicos e monetários e alguns são naturais, sociais, políticos, ambientais e de saúde", contextualizou.
Futuro depende de ações concretas no presente, avalia especialista
Depois de tantos temas tensos em relação ao futuro da humanidade, que deixou um clima apreensivo na plateia, Roubini, ao final da palestra, considerou que nem tudo está perdido. "Para cada ameaça, existe uma solução, mas isso depende de sacrifícios para o bem coletivo", afirmou.
Na opinião dele, uma das dificuldades para isso é a incapacidade humana de pensar mais à longo prazo. "Infelizmente, nos detemos muito mais no presente do que no futuro", explicou. Outro entrave para sanar, de fato, as ameaças, é que as questões não são apenas nacionais, mas globais, apontou. "As mudanças climáticas são globais, as pandemias são globais, os conflitos políticos interferem na economia global, o que acontece nos Estados Unidos afeta o contexto global, por exemplo", disse.
Quanto ao Brasil, o economista teceu alguns elogios. "O Brasil tem a Amazônia, que é importante para combater as mudanças climáticas. O País também mostrou a força da sua democracia e possui um capital humano expressivo. O Brasil pode ser o país do futuro, mas depende dos investimentos na educação e das decisões que a população vai tomar", disse. Por outro lado, ele também reconheceu que países como o Brasil estão no centro dos desafios ambientais, fazendo referência às cheias do Rio Grande do Sul. "Isso não é um desastre, porque é causado pela ação do homem", resumiu.