O Tesouro Nacional lançou um leilão para a nova linha de financiamento do programa Eco Invest Brasil de estímulo à participação do capital estrangeiro nos projetos de longo prazo de transição ecológica. A linha tem taxa subsidiada de 1% ao ano e vai financiar atividades econômicas que contribuam para a transformação ecológica, para a descarbonização e para a ampliação da resiliência aos impactos na mudança do clima.
Os bancos terão até 60 dias para apresentar as propostas. Ganha o leilão a instituição que apresentar a proposta que garanta a maior participação de capital privado nos projetos, o que no jargão do mercado financeiro é chamado de alavancagem. Os projetos têm que ser para áreas greenfield (ainda não exploradas). A portaria com critérios e condições para a seleção das instituições financeiras já foram publicadas no Diário Oficial da União.
O secretário do Tesouro, Rogério Ceron, diz que a linha, batizada de Mobilização de Capital Privado Externo e Proteção Cambial, deve oferecer entre R$ 5 bilhões a R$ 10 bilhões, que poderiam impulsionar mais de R$ 50 bilhões de capital privado em dois a três anos. Segundo Ceron, foram excluídos da linha setores que já estão bastante maduros do ponto de vista de financiamento, como de energia solar, eólica e sistema de distribuição.
"Será um grande teste para o novo modelo de atração de financiamento externo para o Brasil", afirma. O leilão é a primeira de quatro medidas do programa, lançado em fevereiro durante evento do G20, a sair do papel. Segundo o secretário, o programa é hoje a maior iniciativa de construção de um ambiente para atração de investimento na transição ecológica entre os países emergentes no mundo.
Ele diz que a iniciativa será replicada em outros países com apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Banco Mundial: "É a inauguração de um novo modelo de financiamento que impulsiona o mercado de capitais, ao invés do modelo clássico de concorrer com o mercado de capitais."
Segundo Ceron, o programa faz parte de uma estratégia mais ampla na direção de um novo padrão de financiamento para o ciclo de investimentos que nasce com os projetos de transformação ecológica. Ela envolve a atuação dos bancos oficiais com suas linhas de crédito tradicionais, como as do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o fomento ao mercado de capitais, com as debêntures incentivadas (títulos privados que contam com benefício tributário) e, agora, o novo programa Eco Invest Brasil para atrair o capital externo.
O secretário diz que a ideia é ter uma integração financeira complementar entre esses três canais de financiamento. "Se olharmos no passado, tivemos momentos em que o Estado tentou fazer tudo sozinho, momentos que tentou deixar o mercado privado fazer, e nenhum deles conseguiu dar conta de um ciclo de financiamento produtivo consistente", avalia. "O intuito é que eles se apoiem, se realimentando mutuamente de uma forma saudável", explica.
O Leilão
Ceron comenta que o modelo do certame foi desenhado para impulsionar o mercado privado com base no grau de alavancagem. Terão prioridade no acesso à linha aquelas instituições que se comprometerem com a maior contrapartida em termos de volume de captações para financiamento produtivo. A alavancagem mínima exigida é de seis vezes. Ou seja, para R$ 100 milhões da linha, o banco terá de que comprometer com R$ 600 milhões.
Esse desenho vai fazer com que a parte do investimento público nos projetos varie de 15% a 5%. "Nós não vamos usar esse recurso para financiar mais do que 16% do projeto. E, no limite, 5% para também não ficar muito marginal. Então fica nessa faixa", antecipa. Com a maior alavancagem, o Tesouro poderá priorizar as instituições financeiras que tiverem projetos com menor participação de capital público.
O segredo para aumentar a competição do leilão é que os participantes não saberão exatamente qual o montante total que o Tesouro está disposto a financiar. "Como não é um mercado tão competitivo, é um segredo", diz. Para evitar uma situação de monopólio privado da linha, cada instituição poderá levar 25% do valor da linha no leilão, garantindo pelo menos quatro instituições vencedoras. Os bancos públicos também poderão participar do leilão.
Um comitê do Tesouro vai receber as propostas e depois do prazo final será anunciado o resultado. Os contratos serão assinados em até 30 dias. Os bancos ganhadores do leilão vão receber, inicialmente, 25% dos recursos para começar a operar. O desembolso ocorrerá ao longo do projeto.
A nova linha faz parte do Fundo do Clima, administrado pelo BNDES para projetos sustentáveis. A diferença é que essa nova linha é administrada diretamente pelo Tesouro, por meio dos leilões. A ideia é fazer uma rodada de leilão por ano para dar condições para que as instituições financeiras (privadas ou outras públicas) possam oferecer crédito nas mesmas condições que o BNDES fornece.
Ceron enfatizou que o BNDES consegue hoje oferecer financiamento com prazos melhores e com custos mais competitivos, que os outros bancos não têm acesso. "Estamos fazendo uma coisa mais isonômica nesse sentido. Todo mundo participa. Capilariza mais para realizar mais projetos", argumenta. A vantagem desse modelo, afirmou Ceron, é sair do modelo do monopólio público ofertando esse tipo de crédito.
O Tesouro avalia fazer leilões temáticos no futuro, para financiar uma determinada área do plano de transformação ecológica lançado pelo governo, como projetos para a construção de plantas de hidrogênio verde, biocombustíveis ou só para recuperação de áreas degradadas. Dessa forma, o governo poderá calibrar a linha para os setores que demandam mais apoio.
Outras Iniciativas
O governo ainda lançará mais três medidas do programa Eco Invest até o final do ano. Com a Comissão de Valores Imobiliários (CVM), o governo vai criar um instrumento financeiro para financiar a estruturação de projetos de transição. Sem dar detalhes, o secretário diz que haverá um fomento para que esses instrumentos financeiros sejam criados.
A terceira medida do programa é o lançamento de uma linha de liquidez para dar solvência aos projetos em momentos de estresse cambial, como o observado nas últimas semanas no Brasil. Essa volatilidade acaba gerando uma pressão de caixa muito grande nos projetos de infraestrutura. A linha de liquidez ficará disponível em dólar. "É inovador. Não existe nada isso no país hoje", diz o secretário. Com a linha de liquidez, o que se quer é garantir a sobrevivência desses projetos, a evitar que tenha um colapso de fluxo de caixa.
A quarta medida será o lançamento de conjunto de instrumentos para fomentar o mercado de hedge cambial (de proteção contra a variação da moeda). O mercado no Brasil, acima de três anos, é hoje muito escasso, com pouca liquidez e sem ofertas. É difícil encontrar operações de sete a dez anos de proteção cambial. Essa quarta medida está sendo conduzida pelo Banco Central.
Folhapress