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Publicada em 30 de Junho de 2024 às 19:00

Plano que acabou com a hiperinflação no Brasil, Real completa 30 anos

Cédulas do Real começaram a circular no Brasil em 1º de julho de 1994

Cédulas do Real começaram a circular no Brasil em 1º de julho de 1994

Rafael MARTINS/AFP/JC
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Nícolas Pasinato
Nícolas Pasinato
Há exatos 30 anos entrava em circulação o Real, moeda que conseguiu acabar com a hiperinflação que atormentou a população brasileira por mais de uma década. Na capa do Jornal do Comércio do dia 1° de julho de 1994, a novidade era classificada como "a moeda da esperança", já que o País havia tentando uma série de medidas para domar o "dragão", figura mitológica escolhida para representar a alta de preços do período.
Há exatos 30 anos entrava em circulação o Real, moeda que conseguiu acabar com a hiperinflação que atormentou a população brasileira por mais de uma década. Na capa do Jornal do Comércio do dia 1° de julho de 1994, a novidade era classificada como "a moeda da esperança", já que o País havia tentando uma série de medidas para domar o "dragão", figura mitológica escolhida para representar a alta de preços do período.

Capa do JC explicava nova moeda
Capa do JC explicava nova moeda REPRODUÇÃO/JC
Para marcar a data, o JC inicia hoje uma série de reportagens sobre as três décadas do Plano Real, incluindo a Entrevista Especial com o ex-ministro Rubens Ricupero
O efeito a curto prazo do Real foi animador. Para se ter uma ideia, no primeiro semestre de 1994 - e, portanto, antes da nova moeda -, a inflação somou 757%, média de 43% ao mês, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Nos seis meses seguintes, o índice desabou a 18,6%, média de 2,9% ao mês.
A pavimentação da "moeda da esperança" começou, pelo menos, um ano antes, em 1993, quando o ministro da Fazenda do governo Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, montou uma equipe para pensar em uma forma que acabasse de vez com a hiperinflação. Naquele ano, o IPCA chegou à marca de 2.477,15%.
O grupo escolhido foi formado por economistas da PUC do Rio de Janeiro: André Lara Resende, Edmar Bacha, Gustavo Franco, Pedro Malan, Winston Fritsch e Persio Arida. "O Plano Real, fundado com base nas contribuições teóricas de Pérsio Arida e Lara Resende, é, sem dúvidas, uma das políticas econômicas mais importantes e marcantes do século XX", classifica o doutorando em Economia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Rafael Pahim.
Em vez de cortes de zeros na troca de moedas e congelamento de preços, que eram comuns em planos de estabilização anteriores, a ideia do Real do time de FHC teve aspectos inovadores e foi sendo implementada de forma gradual.
A primeira fase buscava o equilíbrio das contas e teve início ainda em 1993, com o lançamento do Programa de Ação Imediata (PAI), em junho. A iniciativa foi uma espécie de ajuste fiscal, já que contou com a revisão do orçamento de ministérios e repasses para estados e municípios. Também visava o aumento da receita com a privatização de empresas públicas.
A principal medida, porém, foi a criação do Fundo Social de Emergência (FSE), rebatizado posteriormente de Fundo de Estabilização Fiscal (FEF), que previa a desvinculação de algumas receitas do governo federal. O propósito era atenuar a rigidez dos gastos da União em um cenário de corte de gastos. "Foi aprovado o que se chamou de desvinculação das receitas, medida que permanece até os dias atuais. Todo o início de ciclo orçamentário há uma desvinculação das receitas que permite um 'colchão', uma folga para o governo gerar uma consistência fiscal", explica o economista e professor da Escola de Negócios da Pucrs, Gustavo Inácio de Moraes.
A segunda fase do plano foi marcada pela utilização de uma moeda virtual, a Unidade Real de Valor (URV), que passou a funcionar quatro meses antes do Real. A URV tinha paridade com o dólar, ou seja, 1 URV era igual a 1 dólar e absorvia a variação dos preços das mercadorias em cruzeiros reais, moeda inflacionada do período. Em 1° de março de 1994, seu primeiro dia de validade, uma URV equivalia a CR$ 647,50, mas em 30 junho, seu último dia de validade, já valia CR$ 2.750.
"A bala de prata, embora a engenhosidade do plano, foi a bem-sucedida estratégia de gerar confiabilidade na nova moeda através da URV, depois convertida em Real. Seu êxito foi a paridade entre o Real e o dólar, mantida artificialmente até 1998", analisa o professor de Economia da Ufrgs Luiz Augusto Estrella Faria.
A terceira e última fase foi marcada na data de 1º de julho, quando a URV foi transformada no Real. Foi estabelecido que R$ 1 real valia uma URV. A moeda virtual e o cruzeiro real deixaram então de existir, e os preços do País passaram a valer exclusivamente em reais. Os resultados foram promissores: a inflação medida pelo IPCA em junho de 1994 foi de 47,43%. Em julho, era de apenas 6,84%.
Para Faria, o maior legado do Real está na estabilidade da inflação. "Desde então, está quase sempre na faixa de um dígito."
 
 

País teve seis planos de estabilização fracassados antes da consolidação da moeda

Na véspera do dia 1° de julho de 1994, quando o novo dinheiro brasileiro passaria a circular - e mesmo meses após o seu lançamento - o clima entre brasileiros era de desconfiança. Isso porque até a chegada do Real foram executados seis planos que buscaram recuperar a estabilidade de preços.
Em 1986, houve o Plano Cruzado, durante o governo de José Sarney. Entre as medidas adotadas estava a troca do cruzeiro pelo cruzado, com o corte de três zeros na antiga moeda. O plano também determinava o congelamento da taxa de câmbio, salários e preços. Na época, o Executivo incentivou os cidadãos a monitorarem os preços e a denunciarem os locais que não estivessem seguindo as novas regras estabelecidas. O movimento ganhou aderência em parte dos consumidores, que ficaram conhecidos como os "fiscais do Sarney".
No início, houve queda da inflação, e o poder de compra aumentou. Após alguns meses, contudo, o plano se mostrou insustentável em razão do congelamento de preços, o que gerou um desequilíbrio entre produtores e empresários. Com isso, produtos começaram a faltar nos supermercados.
Em novembro do mesmo ano, nasceu o Plano Cruzado II, com descongelamento de preços de alguns itens e serviços, além de aumento da carga tributária do País para tapar o rombo nas contas da União. As medidas não atingiram os efeitos desejados de estabilização da economia, e a inflação, em dezembro de 1987, já voltava aos dois dígitos. Os anos 1980, em razão de sucessivos insucessos de medidas econômicas, ficaram conhecidos como "a década perdida". Depois do Plano Cruzado I e II, vieram o Plano Bresser (1987) e o Plano Verão (1989). Em comum, o congelamento de preços e a redução imediata da inflação, que não se sustentava a longo prazo. No Verão, houve ainda o corte de três zeros da moeda e a transformação do cruzado no cruzado novo.
Mas nenhum pacote econômico foi tão controverso quanto o plano "Brasil Novo" ou Collor I, anunciado em 1990 logo após a posse de Fernando Collor de Mello, primeiro presidente escolhido em eleições diretas desde o fim da ditadura. O que mais gerou comoção social foi o confisco da caderneta de poupança por 18 meses. Mais uma vez, houve congelamento de preços e salários, e o resultado foi recessão sem conter a inflação, que chegou a 1.621% naquele ano.
Menos de um ano depois, em 1991, a ministra da Fazenda do governo da época, Zélia Cardoso de Mello, lançou o Collor II, mas de nada adiantou. Em 1992, denúncias de corrupção contribuíram para que Collor sofresse um processo de impeachment, o que o levou a renunciar à presidência.
Seu sucessor, o vice, Itamar Franco, em 1993, ainda determinou a última troca do padrão monetário antes do Real, de Cruzeiro a Cruzeiro real, com corte de 3 zeros.
 

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