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direitos Humanos

- Publicada em 28 de Fevereiro de 2023 às 14:17

Prefeitura de Bento Gonçalves vai cadastrar trabalhadores a partir da próxima colheita da uva

Reunião na segunda-feira entre prefeitura e entidades do vinho discutiu medidas para o setor

Reunião na segunda-feira entre prefeitura e entidades do vinho discutiu medidas para o setor


Emanuele Nicola/Divulgação/JC
A prefeitura de Bento Gonçalves vai cadastrar os trabalhadores que chegarem ao município para trabalhar na colheita da uva. A medida faz parte de uma série de ações que serão implementadas para evitar que novos casos de trabalho escravo no setor vitivinícola voltem a ocorrer. Na quarta-feira passada (22), operação conjunta entre a Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público do Trabalho (MPT-RS), a Polícia Federal (PF) e a Polícia Rodoviária Federal resgatou 192 homens em condições análogas à escravidão. Eles haviam sido contratados por uma terceirizada para trabalhar na colheita de uva em Bento Gonçalves. A empresa prestava serviços para as vinícolas Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton. Na segunda-feira (27), o prefeito Diogo Segabinazzi Siqueira (PSDB) e diversas entidades ligadas à cadeia produtiva do vinho realizaram uma reunião para debater as iniciativas, que contemplam ainda a criação de uma Central do Trabalhador para o recebimento de denúncias. O encontro resultou na elaboração de um manifesto conjunto pela defesa do trabalho digno (leia a íntegra no final do texto). Após o apoio dados aos trabalhadores resgatados, como o abrigo no Ginásio Municipal, alimentação, assistência médica, apoio jurídico e o translado até seu estado de origem, a Bahia, a prefeitura está conversando com representantes do setor produtivo. A intenção, explica o prefeito, é “criar um pacto da cidade como sociedade para evitar que isso aconteça de novo”. O primeiro ponto colocado em prática é uma fiscalização geral com a vistoria em alojamentos e assistência social para tentar identificar se existem casos similares, evitando assim que a situação se repita. A partir da próxima safra de uva será feito o cadastramento dos trabalhadores que chegarem à cidade para a colheita. “Milhares de pessoas vêm para Bento Gonçalves e a serra gaúcha todos os anos participar da colheita. A gente não sabe quem são essas pessoas, elas vêm para cá contratadas por uma empresa terceirizada, muitos vêm diretamente com cada proprietário. Precisamos ter o cadastro dessas pessoas para fazer um acompanhamento”, afirma Siqueira. O cadastramento possibilitará acompanhar onde os trabalhadores estão alojados, como são tratadas e dar apoio se eles tiverem algum problema de saúde. “As grandes empresas conseguirão fazer isso de uma forma protocolar, assim como a prefeitura terá acesso aos dados. São ações simples mas podem dar um grande retorno de informações para a prefeitura”, destaca.O prefeito critica o “cancelamento” das vinícolas e vinhos e sucos da Serra que vem sendo proposto nos últimos dias. “É preciso entender a situação e aprender com ela, mas tenho que defender as vinícolas de Bento Gonçalves e os nossos agricultores. Temos em torno de 7 mil pessoas que são agricultores, não posso generalizar uma situação e fazer com que todas essas pessoas sejam punidas por um cancelamento de produtos. É uma história de mais de 100 anos”, afirma Siqueira. Ele complementa lembrando que Bento sempre teve tradição em receber quem vem de fora e que hoje mais de 52% da população não nasceu na cidade. “O cancelamento pode ser o normal hoje no mundo inteiro, mas são muitas pessoas afetadas por esse comportamento”, ressalta.
A prefeitura de Bento Gonçalves vai cadastrar os trabalhadores que chegarem ao município para trabalhar na colheita da uva. A medida faz parte de uma série de ações que serão implementadas para evitar que novos casos de trabalho escravo no setor vitivinícola voltem a ocorrer. Na quarta-feira passada (22), operação conjunta entre a Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público do Trabalho (MPT-RS), a Polícia Federal (PF) e a Polícia Rodoviária Federal resgatou 192 homens em condições análogas à escravidão. Eles haviam sido contratados por uma terceirizada para trabalhar na colheita de uva em Bento Gonçalves. A empresa prestava serviços para as vinícolas Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton.
Na segunda-feira (27), o prefeito Diogo Segabinazzi Siqueira (PSDB) e diversas entidades ligadas à cadeia produtiva do vinho realizaram uma reunião para debater as iniciativas, que contemplam ainda a criação de uma Central do Trabalhador para o recebimento de denúncias. O encontro resultou na elaboração de um manifesto conjunto pela defesa do trabalho digno (leia a íntegra no final do texto).
Após o apoio dados aos trabalhadores resgatados, como o abrigo no Ginásio Municipal, alimentação, assistência médica, apoio jurídico e o translado até seu estado de origem, a Bahia, a prefeitura está conversando com representantes do setor produtivo. A intenção, explica o prefeito, é “criar um pacto da cidade como sociedade para evitar que isso aconteça de novo”. O primeiro ponto colocado em prática é uma fiscalização geral com a vistoria em alojamentos e assistência social para tentar identificar se existem casos similares, evitando assim que a situação se repita.
A partir da próxima safra de uva será feito o cadastramento dos trabalhadores que chegarem à cidade para a colheita. “Milhares de pessoas vêm para Bento Gonçalves e a serra gaúcha todos os anos participar da colheita. A gente não sabe quem são essas pessoas, elas vêm para cá contratadas por uma empresa terceirizada, muitos vêm diretamente com cada proprietário. Precisamos ter o cadastro dessas pessoas para fazer um acompanhamento”, afirma Siqueira.
O cadastramento possibilitará acompanhar onde os trabalhadores estão alojados, como são tratadas e dar apoio se eles tiverem algum problema de saúde. “As grandes empresas conseguirão fazer isso de uma forma protocolar, assim como a prefeitura terá acesso aos dados. São ações simples mas podem dar um grande retorno de informações para a prefeitura”, destaca.
O prefeito critica o “cancelamento” das vinícolas e vinhos e sucos da Serra que vem sendo proposto nos últimos dias. “É preciso entender a situação e aprender com ela, mas tenho que defender as vinícolas de Bento Gonçalves e os nossos agricultores. Temos em torno de 7 mil pessoas que são agricultores, não posso generalizar uma situação e fazer com que todas essas pessoas sejam punidas por um cancelamento de produtos. É uma história de mais de 100 anos”, afirma Siqueira. Ele complementa lembrando que Bento sempre teve tradição em receber quem vem de fora e que hoje mais de 52% da população não nasceu na cidade. “O cancelamento pode ser o normal hoje no mundo inteiro, mas são muitas pessoas afetadas por esse comportamento”, ressalta.
Leia a íntegra do manifesto:
"MANIFESTAÇÃO COLETIVA SOBRE MEDIDAS EM DEFESA DO TRABALHO DIGNO E DOS NOSSOS VALORES
A Serra Gaúcha tem uma história de trabalho e acolhimento. Essa terra recebeu nossos antepassados que — com esforço e boa-fé — fortificaram uma sociedade justa, fraterna e humana. Uma comunidade empreendedora, que construiu oportunidades e leva para todo o mundo essa identidade cultural.
Em respeito a essa trajetória, jamais silenciaríamos nem deixaríamos de adotar medidas concretas para enfrentar o fato ocorrido em nossa região, ainda que seja um episódio pontual, e que a responsabilidade direta seja de uma empresa de serviços, que atende diversos segmentos. Mais do que isso: nos movem a agir para que não se repitam episódios que causam tanta indignação e tristeza em todos nós.
Com esse objetivo, em encontro liderado pela Prefeitura Municipal de Bento Gonçalves na segunda-feira (27), o poder público e entidades representativas do setor CONSEVITIS, UVIBRA, FECOVINHO, AGAVI, SINDIVINHOS, ASBRASUCO, COMISSÃO INTERESTADUAL DA UVA, Centro da Indústria Comércio e Serviços (CIC BG), Conselho Municipal do Turismo (Comtur), Bento Convention & Visitors Bureau, Segh Uva e Vinho, Aprovale e Associações e rotas: Rio das Antas, Encantos da Eulália, Cantinas Históricas, Associação dos Guias de Turismo, Caminhos de Pedra, manifestam que:

1 - O fato ocorrido merece total repúdio de todos que prezam pela dignidade humana. A ocorrência não representa as práticas do setor, as vinícolas, as mais de 20 mil famílias de produtores, o segmento produtivo da cidade e, tampouco, a história da nossa comunidade.

2 -Todos os envolvidos têm o dever de tratar o tema com máxima seriedade e encaminhar soluções concretas. E assim já estamos fazendo.

3 - As primeiras medidas adotadas foram de acolhimento aos trabalhadores — abrigando e cuidando de sua saúde —, até que pudessem retornar para casa em segurança e com dignidade. Mas aqui seguimos com foco total na implantação de medidas rigorosas de enfrentamento ao problema.

4 - Imediatamente foi iniciada uma força-tarefa de fiscalização em alojamentos, visando verificar as condições oferecidas aos trabalhadores. Essa iniciativa será consolidada em um programa permanente.

5 - Também foi definida a intensificação da fiscalização de fornecedores e prestadores de serviços do setor, buscando o cumprimento dos requisitos legais e trabalhistas — tais como uso de EPIs, fornecimento de alimentação e carga horária de trabalho.

6 - Será iniciado, nas próximas semanas, o programa de comunicação, conscientização e qualificação para toda cadeia vitivinícola, incluindo produtores rurais e safristas — garantindo o acolhimento correto e o zelo à legislação.

7 – Será criada a Central do Trabalhador. A unidade atenderá diretamente os operários, recebendo denúncias e orientando os profissionais.

8 - Todo o segmento promoverá os aprimoramentos internos de fiscalização e ouvidoria, assegurando que as ações de terceirizados também sejam acompanhadas com rigor.

9 - Tanto o poder público como o setor privado seguirão atuando em conjunto com as forças responsáveis pela investigação e pelo acompanhamento dos direitos humanos e trabalhistas — o que certamente acarretará em novas ações, que serão oportunamente divulgadas.

O manifesto tem o propósito de garantir que o trabalho não se encerre com as ações aqui apresentadas. Precisamos, todos, seguir vigilantes e ainda mais ativos no enfrentamento de um problema que, infelizmente, ainda é realidade Brasil afora. Evoluir é uma necessidade e um compromisso que assumimos publicamente, respeitando valores e princípios tão caros a uma comunidade que não pode ser estigmatizada por episódios que não representam sua essência.

Com união e transparência, vamos superar este momento e honrar o que sempre fomos: uma terra de oportunidades que acolhe a todos."

Sindicatos desconheciam denúncias de trabalho escravo

Dois sindicatos que atuam na defesa de trabalhadores na indústria de alimentação na Serra, onde ocorreram os casos de trabalho análogo à escravidão na colheita de uva, disseram não ter recebido nenhuma denúncia de irregularidades. De acordo com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Alimentação de Bento Gonçalves, Oclair Sanchez, até a operação que libertou os trabalhadores, não havia recebido nenhuma denúncia de trabalho escravo na região. “Não tivemos uma reclamação no sindicato, tanto de outros trabalhadores como dos resgatados. Foi algo repentino que não gostaríamos de ter.”
Sanchez diz que é conhecido na cidade por ser um defensor ferrenho dos trabalhadores, mas que, apesar das ‘brigas de foice’ com as vinícolas, vê com bons olhos tanto a Salton quanto a Aurora, que estão localizadas na área de atuação do sindicato. “Os trabalhadores são tratados igualmente. Estamos a 200 metros da Aurora, vemos que o trabalhador, tanto o terceirizado quanto o da fábrica, são tratados da mesma maneira. Recebem alimentação e hora extra como determinado em acordo coletivo”, exemplifica.
O dirigente critica a terceirização e reforça que o sindicato sempre foi contrário à prática já que, muitas vezes, acaba “caindo na mão de pessoas mal-intencionadas que querem só ganhar e ter lucro". "E isso ainda representa o empobrecimento da classe trabalhadora porque os terceirizados recebem menos e o sindicato não está presente para fiscalizar”, lamenta.
O Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação de Caxias do Sul (STIALICX), que também atende Garibaldi, sede da Cooperativa Garibaldi, acompanhou a reunião em Bento na segunda-feira. Segundo o vice-presidente do Stialicx, Milton Francisco dos Santos, essa foi a primeira denúncia sobre trabalho escravo em safra de uva que a entidade teve conhecimento. “Tivemos muitas denúncias de trabalho escravo há alguns anos, mas no ramo frigorífico, que tinha irregularidades no sistema de alojamento e péssimas condições”, explica.
Santos diz que a orientação aos trabalhadores é que procurem a entidade e denunciem sempre que houver uma situação de trabalho escravo. “Não espere, denuncie ao sindicato que ele fará a denúncia ao MPT e ao Ministério Público. Não temos poderes de fiscalizar sozinhos, só podemos acompanhar os fiscais do Ministério do Trabalho”, explica.
O vice-presidente do Stialicx condenou as condições em que se encontravam os trabalhadores das três vinícolas. “Condenamos esse ato, é desumano. Não importa a empresa que tem um procedimento dessa forma, é desumano. Condenamos mais os atravessadores de mão de obra que exploram, recebem bem da empresa e pagam mal aos trabalhadores e dão péssimas condições de higiene e alimentação e segurança", frisa.