Apesar do movimento de venda de oito das 13 refinarias da Petrobras no País ter dado um passo à frente com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que negou o pedido liminar realizado pelo Congresso para suspender a iniciativa, a estatal segue sem um horizonte estipulado para a alienação desses ativos, entre os quais a Refinaria Alberto Paqualini (Refap), de Canoas. Em nota, a empresa informou que a posição do STF permite a continuidade da estratégia do grupo e que as etapas subsequentes dos processos "serão divulgadas ao mercado de acordo com a sistemática para desinvestimentos da companhia", sem precisar cronogramas.
Além da Refap, no Rio Grande do Sul, a Petrobras pretende alienar as refinarias Landulpho Alves (RLAM) na Bahia, Presidente Getúlio Vargas (Repar) e Unidade de Industrialização do Xisto (SIX) no Paraná, Abreu e Lima (Rnest) em Pernambuco, Gabriel Passos (Regap) em Minas Gerais, Isaac Sabbá (Reman) no Amazonas e Lubrificantes e Derivados de Petróleo do Nordeste (Lubnor) no Ceará.
A questão da privatização desses ativos está longe de ser uma unanimidade entre os agentes que atuam no setor de petróleo, tanto sobre os benefícios como quanto ao tempo que pode levar o desenvolvimento dessa ação.
Para o presidente da Associação RS Óleo Gás & Energia, Estevão Leuck, será melhor para o Brasil que essa fatia do parque de refino de petróleo seja repassada para a iniciativa privada. "Tudo que é empresa estatal provou que opera em um sistema paquidérmico", critica. Leuck argumenta que a entrada de novos players aumentará a competição no mercado, melhorando as condições de preços dos derivados de petróleo, o que vale também para a Refap.
O consultor e ex-coordenador do comitê de petróleo, gás e energia da Fiergs, Oscar de Azevedo, acrescenta que a Petrobras precisa se recapitalizar, já que a empresa passou por uma fase muito difícil de deterioração financeira. Ele também frisa que a diversificação de mercado será importante para os consumidores. "A Petrobras tem que ser menor e mais robusta, não pode fazer tudo ao mesmo tempo", defende.
Apesar da decisão do STF favorável ao procedimento de alienação, o presidente da Associação RS Óleo Gás & Energia receia que a venda dos ativos da Petrobras possa se alongar, em meio a debates judiciais, e se estender para além de 2021. Se essa perspectiva se concretizar, Leuck argumenta que uma eventual troca de comando do governo federal pode reverter a privatização. Já o presidente do Sindicato Intermunicipal do Comércio Varejista de Combustíveis e Lubrificantes no Rio Grande do Sul (Sulpetro), João Carlos Dal'Aqua, espera um processo mais célere com a conclusão da venda da Refap, pelo menos, no próximo ano.
Ele argumenta que a decisão do STF aumenta a segurança jurídica quanto à alienação. O dirigente considera que uma maior competição no setor de refino de petróleo é importante. "A única questão que a gente tem que deixar clara é que não pode passar de um monopólio estatal para um privado", alerta. Outro ponto ressaltado por Dal'Aqua, é a necessidade dos revendedores de combustíveis e da população quanto à garantia de fornecimento de produtos.
Particularmente quanto à Refap, o presidente do Sulpetro destaca que os comentários no mercado é que Raízen, Shell e Grupo Ultra estariam entre os interessados na compra da refinaria gaúcha. No entanto, Dal'Aqua antecipa que provavelmente, na região Sul, a paranaense Repar, que está mais próxima aos grandes centros de consumo de combustíveis do País, deverá ser mais atrativa aos olhos dos investidores.
Sindipetro-RS e a Aepet consideram venda uma forma de burlar a legislação
O modo da alienação dos ativos proposto pela diretoria da Petrobras, de maneira fatiada, envolvendo empresas consideradas subsidiárias, é visto pelo Sindicato dos Petroleiros do Rio Grande Sul (Sindipetro-RS) e pela Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet) como uma estratégia para ludibriar a legislação. O presidente do Sindipetro-RS, Fernando Maia da Costa, salienta que a lei determina que não se pode fazer a privatização de uma companhia pública, sem consultar o poder Legislativo. Segundo ele, as regras estão sendo burladas sob a justificativa de que se trata de vendas de subsidiárias da estatal.
"Imagina o presidente da empresa dizer que não vai vender a Petrobras, mas aliena todas as refinarias, criando subsidiárias, repassa todos os poços de petróleo, e fica apenas com um prédio administrativo, o que é essa companhia, não é nada, é um papel", aponta Maia. O sindicalista enfatiza que a decisão do STF negou o pedido liminar, mas não julgou o mérito da questão. "Ainda é possível mudar esse resultado desde que novos argumentos sejam apresentados", afirma. Para o presidente do Sindipetro-RS, a atual gestão da estatal a está destruindo internamente. Sobre os apontamentos de que a privatização das refinarias aumentaria a competição no setor, Maia salienta que a Refap, por exemplo, pela situação logística e outros pontos, continuará concentrado o mercado no Rio Grande do Sul.
"Não vai existir uma nova competitividade, vai se ter um monopólio regional de produção de derivados nas mãos de uma outra empresa que não a Petrobras", adverte. Outro alerta feito por Maia é que a empresa privada que adquirir a Refap pode optar, futuramente, por transformá-la em um simples interposto de produtos importados, gerando impactos na arrecadação de impostos. A possível redução de postos de trabalho (hoje são cerca de 700 empregos diretos gerados pela Refap) é também uma preocupação do sindicato.
Maia enfatiza que a Petrobras tem a obrigação de fornecer derivados de petróleo para todas as localidades brasileiras, não apenas gasolina ou óleo diesel. "Quando um prefeito não tem asfalto, ele bate na porta da Petrobras, que é a porta do governo, e diz que quer o produto na sua cidade", destaca. Sob controle da iniciativa privada, o presidente do Sindipetro-RS adianta que esse serviço pode ficar muito mais caro, refletindo na economia regional.
Por sua vez, o presidente da Aepet, Felipe Coutinho, considerou a posição do STF como antinacionalista. Ele julga que foi uma decisão política, que atende ao interesse do capital estrangeiro. O dirigente recorda que o Brasil é o sexto maior mercado do mundo de combustíveis e possui ainda um enorme potencial de crescimento, diferentemente do europeu e do norte-americano. "É isso que está em disputa", salienta. Coutinho ressalta que seria impossível privatizar a Petrobras inteira, de uma forma única, e para fazer isso é preciso fatiá-la, que é uma estratégia para fraudar a legislação. Apesar disso, o presidente da Aepet acredita que seja possível reverter o processo de privatização desencadeado dentro da Petrobras.