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Publicada em 23 de Março de 2025 às 18:00

Turnê de Caetano Veloso e Maria Bethânia encerra de maneira triunfal em Porto Alegre

Show da turnê Caetano & Bethânia em Porto Alegre foi marcado por momentos de emoção, como na homenagem a Gal Costa

Show da turnê Caetano & Bethânia em Porto Alegre foi marcado por momentos de emoção, como na homenagem a Gal Costa

Amanda Flora/Especial/JC
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Amanda Flora e Ana Stobbe
Dois filhotes de leão levantaram Porto Alegre na noite deste sábado (22). Os irmãos Caetano Veloso e Maria Bethânia, que incendiaram o Brasil com suas icônicas jubas ao iniciarem suas carreiras musicais na década de 1960, mostraram que ainda são referência em Música Popular Brasileira. Com cerca de 35 mil pessoas, lotaram a Arena do Grêmio e encerraram de maneira triunfal a turnê conjunta iniciada em 2024.
Dois filhotes de leão levantaram Porto Alegre na noite deste sábado (22). Os irmãos Caetano Veloso e Maria Bethânia, que incendiaram o Brasil com suas icônicas jubas ao iniciarem suas carreiras musicais na década de 1960, mostraram que ainda são referência em Música Popular Brasileira. Com cerca de 35 mil pessoas, lotaram a Arena do Grêmio e encerraram de maneira triunfal a turnê conjunta iniciada em 2024.
O fim da turnê dos filhos de Dona Canô não estava previsto para Porto Alegre, mas, sim, em São Paulo. Entretanto, em consequência dos danos causados pela enchente de maio passado na Arena, o show em solo gaúcho, que estava previsto para 12 de outubro, precisou ser adiado. Mesmo assim, o público, que englobava diferentes gerações, não deixou de prestigiar os artistas.
Para a professora aposentada Elyane Satte, de 68 anos, o show foi emocionante. Nas suas palavras “até uma lagriminha escorreu”. Ela viajou do município de Pedro Osório, no sul do Estado, para ouvir ao vivo o repertório dos artistas, que fazem parte da sua geração. Uma oportunidade única, que lhe rendeu como momento favorito a performance de Sozinho.
Um exemplo da mistura de gerações veio das caxienses Katani e Geraldine Ruffato, mãe e filha, de 29 e 60 anos, respectivamente. Elas assistiram à apresentação juntas e suas relações com os artistas são diferentes. O contato de Katani com artistas veio da adolescência. Já Geraldine teve a influência da mãe. “A minha relação com eles vem muito por causa dela (Katani). Escuto Caetano e Bethânia em casa desde criança”, afirma a jovem.
Apesar do contexto trágico que envolve a mudança de data do show, o público de Porto Alegre teve uma sorte: prestigiou a segunda execução de Um Baiana, música autoral inédita de Caetano. A composição foi iniciada antes do início dos shows, mas, conforme explicou à plateia, apenas foi finalizada quando a turnê se aproximava do fim. Na letra, apresentada pela primeira vez no dia 15 de março, no Rio de Janeiro, o renomado artista brasileiro clama pela paz: “Os da guerra acreditam / Que mandam na Terra / E agora ainda mais / Mas nós que demos tudo / Não vamos ser mudos / É a paz”.
Além disso, o repertório executado em cerca de duas horas foi marcado por clássicos. Um deles foi o expoente do movimento tropicalista Alegria, Alegria, que abriu o show levando o público à loucura com a combinação das vozes dos irmãos: o canto suave de Caetano e a força de Bethânia. Oração ao Tempo e Objeto não Identificado foram outras canções que agitaram o público em uma perfeita harmonia de sons.
Cada irmão teve direito ao seu momento solo. O pioneiro foi o irmão mais velho, Caetano, de 82 anos, que, munido de um violão sob uma singela luz, interpretou seu talvez maior sucesso radiofônico, Sozinho, acompanhado de um mar de luzes das lanternas acesas pela plateia. O clássico Leãozinho, a intensa Você Não Me Ensinou a Te Esquecer e a romântica Você É Linda movimentaram intensas emoções.
A participação individual de Caetano terminou com agradecimentos aos compositores que participaram das canções. Ao final, dedicou às igrejas evangélicas o louvor Deus Cuida de Mim, gravado em parceria com o cantor e pastor evangélico Kleber Lucas. Parte do público, acostumado com as referências de Bethânia ao candomblé, reclamou da escolha do artista.
Depois, foi a vez de Bethânia. A caçula, de 78 anos, surgiu quase como numa figura divina, em dourado, clamando por Oxum, seu orixá — que representa a beleza e a prosperidade. A artista iniciou seu solo com a música Brincar de Viver, inebriando o público com sua entrada acompanhada das estrofes “Quem me chamou / Quem vai querer voltar pro ninho / E redescobrir seu lugar”.
Bethânia seguiu o solo com Não Dá Mais Pra Segurar (Explode Coração), canção composta por Gonzaguinha, que é um daqueles dramalhões que ficam ainda mais intensos na voz potente da artista. Mas foi em As Canções Que Você Fez Pra mim que Bethânia colocou todo mundo para cantar em uníssono. A melancolia tomou conta de Porto Alegre quando a abelha rainha da música popular brasileira evocou as frases “Hoje eu ouço as canções que você fez pra mim / Não sei por que razão tudo mudou assim / Ficaram as canções / E você não ficou”, seguido pelo marcante instrumental pesado dos metais, uma referência ao Blues.
O show foi repleto de homenagens que relembram momentos da célebre trajetória dos irmãos e sua popularidade no meio da MPB e do samba. Gilberto Gil, que iniciou neste mês a sua turnê de despedida dos palcos, foi lembrado com a música Filhos de Gandhi. Conterrâneo baiano, Raul Seixas fez parte do setlist em uma das últimas músicas, quando os irmãos celebraram o rock n’ roll ao som de Gita. Com um pé na atualidade, os irmãos entoaram a música , da cantora Iza.
Fãs do carnaval carioca, eles não deixaram de lado sua escola do coração: a Mangueira. Mostrando que “atrás da verde e rosa só não vai quem já morreu”, entregaram um medley composto por Sei Lá Mangueira, A Menina dos Olhos de Oyá e Exaltação À Mangueira. Além de celebrarem os títulos da escola, eles já desfilaram na Sapucaí em duas ocasiões. Em 1994, ao lado de Gil e Gal Costa, e em 2016, quando Bethânia foi homenageada.
Apresentação dos irmãos e ícones da MPB juntou cerca de 35 mil pessoas na Arena do Grêmio | AMANDA FLORA/ESPECIAL/JC
Apresentação dos irmãos e ícones da MPB juntou cerca de 35 mil pessoas na Arena do Grêmio AMANDA FLORA/ESPECIAL/JC
Um dos momentos mais emocionantes, no entanto, foi uma homenagem à eterna Gal Costa. A artista, que faleceu em 2022, fez parte do grupo musical Doces Bárbaros junto aos irmãos e a Gilberto Gil, além disso, teve um relacionamento romântico com Bethânia. A emoção correu quando Caetano entoou “Ela foi o mais perfeito eco da bossa nova e se tornou a mais bela versão do que havia de Neo-Rock n’ Roll no Tropicalismo. Gal para sempre”.
Os irmãos, visivelmente emocionados sob fotografias exuberantes de Gal Costa, cantaram Baby como se estivessem se comunicando diretamente com a mãe de todas as vozes brasileiras. Bethânia, por sua relação profunda com Gal, pôde se declarar nas estrofes “Baby, baby / I love you”. Em Vaca Profana, o público pulou e cantou bem como pede a música nada careta que Gal sempre cantou em tom de protesto.
Ao final do show, os filhos de Dona Canô, fizeram sua homenagem ao público porto-alegrense ao cantar a delicada Menino Deus, canção que homenageia o bairro homônimo da Capital gaúcha. O momento foi ainda mais simbólico quando Caetano entoou “Um porto alegre é bem mais que um seguro / Na rota das nossas viagens no escuro”. Esse momento fez parte do bis e foi seguido da balada brasileira de Odara. Essa, sim, um show à parte, onde os artistas se despediram, mas não sem antes dar os agradecimentos. Caetano homenageou sua caçula, que, nas palavras dele, “foi a grande idealizadora” da turnê.
Deixa eu dançar, pro meu corpo ficar odara”, ressoava na música mais comprida da apresentação. Mesmo com a caminhada de despedida de Caetano e Bethânia, a banda continuou quase que em um show à parte. O momento era de despedida, celebração e generosidade, rolando até uma selfie com a plateia. A turnê Caetano & Bethânia fica marcada pela delicadeza, força e genialidade da mistura complexa de dois artistas tão únicos na cultura brasileira.

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