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Publicada em 26 de Agosto de 2024 às 18:47

Não se fazem mais barbeiros como o seu Elói

O bom e velho Elói fazia do ofício de barbeiro uma arte

O bom e velho Elói fazia do ofício de barbeiro uma arte

Renee Olmsted/Pixabay/JC
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Juliano Tatsch
Juliano Tatsch Editor-assistente
Já faz algum tempo que não vou no barbeiro. Confesso que não me atrai o conceito dos barbers shop, onde há de tudo – whisky, cerveja, sinuca, música, filme, tatuagem – e o corte de cabelo é apenas um detalhe a mais. Eu até tentei, nada contra, só não é para mim. O mesmo vale para comida japonesa. Parece ótimo, mas não é para mim.
Já faz algum tempo que não vou no barbeiro. Confesso que não me atrai o conceito dos barbers shop, onde há de tudo – whisky, cerveja, sinuca, música, filme, tatuagem – e o corte de cabelo é apenas um detalhe a mais. Eu até tentei, nada contra, só não é para mim. O mesmo vale para comida japonesa. Parece ótimo, mas não é para mim.
Bom mesmo era o seu Elói. Aquilo sim que era barbeiro. Salão pequeno, uma cadeira com o estofado já rasgado pelo tempo, um rádio antigo sintonizado na Continental, uma garrafa térmica com café com leite em cima da bancada, um ventilador de teto e um calendário de ferragem pendurado na parede. Nada além disso.
Seu Elói tinha um salão na zona Sul de Porto Alegre, no bairro Camaquã. Era figura conhecida do bairro. O corte de cabelo com ele era uma espécie de ritual. Tudo era preparado nos mínimos detalhes. Nada era feito por acaso ou com pressa. Seu Elói era um artista das tesouras. Evitava ao máximo o uso de máquinas elétricas e, sempre que possível, passava a mão na navalha para “fazer o pezinho”.
O velho era daqueles barbeiros das antigas que adorava bater papo durante o serviço e história para contar era o que não faltava. O Elói tinha lá seus setenta e tantos anos. Segundo ele mesmo, cortava cabelos a mais cinquenta. Dá para imaginar o que é meio século cortando cabelos alheios?
Para quem duvidava, ele mostrava as mãos marcadas por calos e atrofias nos dedos em razão do uso contínuo das tesouras. O corte da Barbearia do Elói era barato e muito caprichado. Demorava uns 40 minutos, mais ou menos. Se lembro bem, na época, há uns bons dez anos, era uns R$ 20. Preço justo para o combo que contava com o cabelo alinhado, música boa e bate papo de qualidade.
O seu Elói tinha sido barbeiro do Exército.
- Guri, tinha dias que eu cortava uns cinquenta cabelos em uma tarde. Era coisa de louco -, dizia.
Os anos e anos de experiência fizeram com que ele adquirisse conhecimentos preciosos a respeito de como cuidar ou domar um cabelo rebelde.
- Aprende isso: nunca mais usa gel no cabelo. É jogar dinheiro fora. Não tem fixador melhor do que suco de limão.
- Mas não fica cheiro no cabelo, seu Elói?
- Nada, cheiro nenhum. Pode usar que eu garanto pra ti.
Eu nunca usei limão no cabelo. Ainda acho que fica cheiro. Não é que não confie no velho, mas, sei lá, até das mãos quando a gente faz uma caipirinha demora para sair o cheiro, que dirá do cabelo.
Seu Elói não teria uma barber shop. Ele não poderia parar no meio do corte para atender a esposa no telefone, ou pedir para o próximo cliente esperar, pois iria tomar seu café com leite com pão caseiro. Com aqueles dedos atrofiados, dificilmente ele conseguiria jogar uma partida de sinuca. Beber em serviço? Jamais!
O salão simples ficava na rua Pereira Neto. Agora, no mesmo lugar, existe um espetinho. Nunca comi ali, mas já vi o assador temperando o frango com suco de limão. Seu Elói vive.

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