Paulo Giacomelli
A discussão sobre liberdade de expressão muitas vezes se torna cansativa, afinal, todas as pessoas que não são cínicas ou sociopatas entendem que conter a livre circulação de ideias, notícias ou opiniões faz a sociedade menos democrática, mais conflitiva e com menos espaço para solução de disputas políticas e ideológicas, comprometendo seu futuro.
É algo tão óbvio que ficar insistindo e defendendo tal condição vira um trabalho ingrato, o "secar gelo" mais evidente dos nossos dias.
No entanto, essa defesa é cada dia mais necessária. Nas últimas semanas, como mais um desdobramento do triste cenário de tolhimento desse direito fundamental - que inclui a recente proibição da plataforma X no Brasil, por exemplo -, o deputado federal gaúcho Marcel van Hattem, do Partido Novo, foi alvo de abertura de inquérito pela Polícia Federal por uma manifestação feita na tribuna da Câmara dos Deputados, um claro ataque à imunidade parlamentar e ao direito da livre expressão de um representante direto da sociedade, garantido no artigo 53 da Constituição Federal, segundo o qual "os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos".
Particularmente, não sou alguém que defende privilégios para políticos, mas o caso da imunidade parlamentar referente à expressão é algo de indiscutível razão de existir.
Sem essa imunidade, como se esperar que as denúncias de injustiças e a representação dos ideais dos eleitores por meio do político por eles eleito de fato ocorram? Além disso, se nem mesmo a liberdade de expressão do parlamentar está garantida, o que se esperar para o restante da sociedade?
A reação veio bastante forte, com excelente discurso do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), em defesa de Marcel van Hattem, e até mesmo de parlamentares do outro lado do espectro político, como Chico Alencar, do PSOL, que considerou a ação da PF uma extrapolação dos seus deveres.
O deputado federal Nilto Tatto, do PT, foi na mesma linha. Neste ambiente político atual, em que a palavra mais usada para descrevê-lo é polarização, o episódio mostra que parcelas do Judiciário e do Executivo se excederam tanto nas suas funções que até mesmo uniram nomes fortes da direita e da esquerda em críticas aos seus atos mais recentes.
Voltaire, o grande filósofo iluminista francês do século 18, nos brindou com a frase: "Posso não concordar com nenhuma das suas palavras, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-las".
Essa expressão é um dos maiores clichês da filosofia e da política, mas a cada dia se reforça como a medida para o tipo de sociedade que almejamos, isto é, ou seguimos o conselho de Voltaire e evoluímos como civilização, ou o ignoramos e caímos no profundo abismo da censura e da intolerância.
Diretor de Formação do Instituto de Estudos Empresariais (IEE)