Porto Alegre,

Anuncie no JC
Assine agora
Teatro
Antônio Hohlfeldt

Antônio Hohlfeldt

Publicada em 20 de Junho de 2024 às 18:46

A dramaturgia e o teatro para crianças

Compartilhe:
Antonio Hohlfeldt
Na retomada das atividades artísticas na cidade, logo no início de julho ocorrerá o Festecri - Festival de Teatro para Crianças, que a produtora Letícia Vieira havia programado para maio e transferido por causa das enchentes. O festival acontece no Theatro São Pedro e será constituído de dez espetáculos, no período de 8 a 17 de julho. Será um mix de espetáculos que ora tocam temas clássicos, como De la Mancha: o cavaleiro trapalhão (dia 12), ora retomam peças hoje clássicas, como Lili inventa o mundo, que Dilmar Messias escreveu e dirigiu, em sua primeira versão, a partir de poemas de Mário Quintana e que, para mim, é um dos espetáculos de teatro infantil mais bonitos que já vi (dia 16).
Na retomada das atividades artísticas na cidade, logo no início de julho ocorrerá o Festecri - Festival de Teatro para Crianças, que a produtora Letícia Vieira havia programado para maio e transferido por causa das enchentes. O festival acontece no Theatro São Pedro e será constituído de dez espetáculos, no período de 8 a 17 de julho. Será um mix de espetáculos que ora tocam temas clássicos, como De la Mancha: o cavaleiro trapalhão (dia 12), ora retomam peças hoje clássicas, como Lili inventa o mundo, que Dilmar Messias escreveu e dirigiu, em sua primeira versão, a partir de poemas de Mário Quintana e que, para mim, é um dos espetáculos de teatro infantil mais bonitos que já vi (dia 16).
A propósito desta mostra, aproveito hoje para recuperar algumas informações a respeito do que hoje em dia chamamos de teatro infantil - prefiro teatro para crianças, pois o adjetivo "infantil" muitas vezes é utilizado como um elemento desclassificatório do que seja este tipo de espetáculo, a exemplo da chamada "literatura infantil", diga-se de passagem.
Se, como escreve Philipe Ariès na sua História social da criança e da infância, pelo menos até o Romantismo a criança era percebida apenas como um adulto incompleto, é natural que não houvesse preocupações específicas com o que consumisse ou preferisse. Assim, é impossível pensar numa literatura ou dramaturgia para crianças. A criança consumia aquilo que estava sendo apresentado ao adulto, ao lado do qual participava dos espetáculos. Pode-se dizer que, em muitos casos, era o adulto quem se "rebaixava" (verbo relativizado em seu sentido, frise-se), se lembrarmos as pantomimas greco-romanas, a comedia dell'arte renascentista, os teatros de bonecos e marionetes etc.
É o Romantismo que vai passar a considerar a criança como um ser diferenciado e lhe prestar maior atenção. Assim, cria-se uma literatura para as crianças, bem como uma dramaturgia e, por consequência, um teatro para crianças.
No Brasil, são escritores consagrados da época, no mesmo projeto do Romantismo e seus desdobramentos, que vão passar a escrever para crianças, tanto livros de prosa, caso de Figueiredo Pimentel, com Historias da avozinha, quanto Histórias da carochinha, chegando à dramaturgia para crianças, com um volume batizado como Teatro infantil, ainda disponível em sebos, da pioneira editora Quaresma.
Dois dos autores que mais se esmeraram em escrever textos dramáticos para crianças foram Coelho Netto e Olavo Bilac. Coelho Netto havia sido professor de infância, sabia se comunicar bem com as crianças e tratou de trazer temas que ora atualizavam fábulas clássicas, como A raposa e o corvo, ora apresentava situações cotidianas envolvendo as crianças e os adultos, como em O avô ou A carta. Já Olavo Bilac mantinha a elegância da frase, com diálogos curtos e objetivos e textos como O presunçoso ou As bonecas, tratando dos relacionamentos entre meninos e meninas com certa preocupação pedagógica.
A quebra deste paradigma e a inovação para uma dramaturgia eminentemente lúdica e divertida, sem qualquer preocupação explicita de formação moral, surgiria com Lúcia Benedetti, que estreava em 1948, com O casaco encantado, que Paschoal Carlos Magno dirigiu, na interpretação de Henriette Morineaux, para a Cia. Artistas Unidos. Dela são, anda, textos como A onça e o bode ou O balão que caiu no mar. O Serviço Nacional de Teatro publicou, na década de 1970, quatro volumes com a íntegra de seus textos.
A partir de 1953, teríamos a "revolução" de Maria Clara Machado (filha de Aníbal Machado) que, a partir de seu O Tablado, escola e teatro no Rio de Janeiro, produziria uma dramaturgia de maioridade para as crianças, desde a estreia, com O boi e o burro a caminho de Belém, até o inesquecível Pluft, o fantasminha, de 1955.
Vamos voltar ao assunto na semana que vem. Creio que seja oportuno trazer à baila este tema: para os adultos se darem conta da importância de levarem os filhos ao teatro; para os dramaturgos se conscientizarem de que não se trata de uma "dramaturgia menor"; para os grupos de teatro atentarem para o fato de que "teatro infantil" não é quebra galho para ganhar dinheiro nem penduricalho de espetáculo adulto, em viagens de temporada.
 

Notícias relacionadas