Gradualmente, os espaços não atingidos pelas recentes enchentes buscam reorganizar suas programações, boa parte das quais ainda voltada para auxiliar os diferentes segmentos artísticos atingidos pelas águas. Parte desta programação, aliás, traz espetáculos ou iniciativas que estavam originalmente marcadas para maio ou junho e que tiveram de ser, infelizmente, transferidas. Como consequência, o que se perdeu de programação durante aqueles dois meses vai ser concentradamente disponibilizado no segundo semestre, incluindo espetáculos de artes cênicas e programações musicais.
A primeira atração a ser concretizada é o Festival de Teatro para Crianças - Festecri, que ocorrerá entre 7 e 17 de julho vindouro, com espetáculos voltados inteiramente para crianças: nos dias de semana ocorrerão espetáculos dirigidos às escolas e, no final de semana, atrações para o público em geral.
O tradicional festival Palco Giratório, do Sesc/RS, que estaria distribuído por diferentes teatros da cidade, com a nova data vai ser concentrado no palco do Theatro São Pedro, entre 4 e 14 de novembro. Deve-se lembrar que este festival apresenta espetáculos de grupos oriundos de todas as partes do Brasil.
Logo em seguida, de 22 a 28 de novembro, ocorrerá o Porto Alegre Em Cena. O festival que a Secretaria Municipal de Cultura realizava tradicionalmente em setembro, durante a Covid recebeu formatos diferenciados e, neste ano, tendo em vista as cheias, terá igualmente um enfoque específico, por decisão de seu coordenador Luciano Alabarse: vai reunir exclusivamente grupos de Porto Alegre. Deste modo, o festival prestigia e auxilia aos artistas cênicos da cidade, atingidos pelos desastres de maio.
Por iniciativa da Secretaria de Estado da Cultura, e com apoio financeiro do Banrisul, ocorrerá, entre 19 e 27 de julho, o festival denominado Monitora Rio Grande, que propiciará realizações de grupos de Porto Alegre e do Rio Grande do Sul, assim como cursos de formação online, reunindo profissionais do centro do País em parceria com artistas locais, propiciando bolsas de estudo para os alunos. Esta iniciativa busca ampliar a formação dos artistas locais e, ao mesmo tempo, ampará-los financeiramente, pois cada curso receberá vinte alunos bolsistas, além de propiciar acompanhamento de suas ações a tantos outros quantos o queiram, ainda que de maneira livre e sem suporte financeiro. Todos os ministrantes são voluntários, resultando em parcerias bastante interessantes para a formação profissional dos interessados.
Por fim, a temporada de óperas foi reformulada, mas ao menos dois espetáculos permanecem em produção: comemorando o centenário de falecimento de Giacomo Puccini (1858-1924), ocorrerá a montagem de La Bohème, entre 5 e 11 de agosto e, entre 5 e 9 de novembro, a montagem de Candinho, ópera que aborda a vida e a obra de Candido Portinari, talvez o muralista mais significativo do Brasil e um dos pintores mais importantes do Modernismo, em especial por sua perspectiva nitidamente crítica das imagens que criou ao longo de décadas sobre o povo trabalhador brasileiro. A destacar que o nascimento de Puccini ocorreu seis meses depois da inauguração do Theatro São Pedro.
Em síntese, em que pese a tragédia que assolou o Estado e os evidentes prejuízos a produções culturais, artistas e grupos em geral, o segundo semestre parece projetar uma espécie de movimento de compensação, de reafirmação e resiliência por parte daqueles que, quase sempre, são os primeiros a pararem e os últimos a retomarem suas atividades.
Enquanto isso, a Secretaria Municipal de Cultura precisará resolver, urgentemente, o que fará com seus espaços. O Centro Municipal de Cultura, com duas salas, o Teatro Renascença e a Sala Álvaro Carvalho, foi duramente afetado pela enchente e já não vinha muito bem das pernas; o recém reconstruído Teatro de Câmara, na rua da República, foi praticamente destruído. Quanto à Secretaria de Estado da Cultura, embora bastante afetada, a Casa de Cultura Mario Quintana não perdeu o Teatro Carlos Carvalho e a sala Bruno Kiefer, que se encontram, respectivamente, no segundo e sexto andares. O Teatro do Ipê segue com planos de recuperação e breve reabertura: embora os pisos subterrâneos, que guardavam documentos de diferentes repartições do Estado, tenham sido atingidos pelas águas, o espaço do teatro em si, um pouco mais elevado, escapou da destruição. Enfim, quanto ao prédio da Fundação Ospa, embora tenha perdido toda a central de ar condicionado e elevadores que seriam instalados, conseguirá recuperar o maquinário graças à doação do mesmo Banrisul, concretizada no anúncio de semana passada do governo estadual.
Outros pequenos espaços distribuídos pela cidade, como o Instituto Ling, felizmente não foram afetados e, assim, poderão retomar, na medida do possível, suas atividades.