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Teatro
Antônio Hohlfeldt

Antônio Hohlfeldt

Publicada em 06 de Junho de 2024 às 19:16

Discursar, apenas, ou ajudar de verdade?

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Antonio Hohlfeldt
Em decorrência das grandes enchentes do último mês de maio, dois discursos se generalizaram: de um lado, empresas enviam mensagens explicitando o apoio que estão dando às vítimas, seja (o mais simples, porque trabalha com o dinheiro e as iniciativas dos outros) solicitando doações ou disponibilizando um Pix, seja anunciando que estão fazendo entregas significativas, o que, isso sim, é uma ação real de apoio aos necessitados - e sabemos bem, são centenas de milhares que, agora, a cada dia que passar, ficarão mais e mais esquecidos, já que os voluntários precisam regressar a seu cotidiano.
Em decorrência das grandes enchentes do último mês de maio, dois discursos se generalizaram: de um lado, empresas enviam mensagens explicitando o apoio que estão dando às vítimas, seja (o mais simples, porque trabalha com o dinheiro e as iniciativas dos outros) solicitando doações ou disponibilizando um Pix, seja anunciando que estão fazendo entregas significativas, o que, isso sim, é uma ação real de apoio aos necessitados - e sabemos bem, são centenas de milhares que, agora, a cada dia que passar, ficarão mais e mais esquecidos, já que os voluntários precisam regressar a seu cotidiano.
A outra iniciativa que encontramos, intermitente, é a explicitação de que tal empresa apoia os desalojados e, em seguida, se apresenta uma espécie de frase ou slogan de elevação moral, empática, do tipo "todos juntos vamos recomeçar" ou algo assim. É curioso que, nestes casos, parece que os governos nada fizeram de positivo - mesmo que tardiamente - o que não é exatamente verdade. De novo, e independentemente de questiúnculas partidárias ou ideológicas, a administração federal, a administração estadual e as administrações municipais, com maior ou menor empenho e sucesso, dependendo de cada contexto, estão mobilizadas e disponíveis - mais que isso, espera-se que articuladas entre si - com o intuito de darem o necessário amparo a quem necessite.
Por trás destas demonstrações de apoio e compreensão, contudo, parece que têm havido outras iniciativas nem tão louváveis. Todos sabemos que boa parte das produções do Rio de Janeiro e de São Paulo viram-se obrigadas a cancelar suas vindas para o Rio Grande do Sul. Não haveria "clima" para isso; inexistiria público disponível; a bilheteria não sustentaria as despesas de viagem, com evidentes prejuízos para as produções; haveria dificuldades de acessibilidade, graças ao aeroporto fechado e sem prazo de reabertura, etc.
Embora já estejam bem conhecidos os cálculos que mostram que a indústria criativa é dos segmentos produtivos de maior impacto e rentabilidade na economia de qualquer sociedade, boa parte de nossos empresários, infelizmente, ainda não compreenderam isso. Quando decidem "apoiar" uma produção, levam em conta nomes famosos, ou o fato de as leis de incentivo, na verdade, serem muito mais contribuições do governo (federal, neste caso) do que das empresas: os empresários apenas transformam impostos devidos em investimentos em espetáculos, pelos quais nada pagam, e ainda recebem a mais ampla divulgação de suas marcas.
Esta observação bastaria para que a gente almejasse que tais apoiadores, em especial entidades de grande porte, tomassem a iniciativa, não apenas de manter os patrocínios já acertados quanto, de fato, investissem efetivamente no apoio a espetáculos para que os mesmos visitassem ou mantivessem sua programação em zonas afetadas como, no nosso caso, pelas enchentes. Mais, que propiciassem roteiros até então não planejados, em apoio a estas populações. Não é o que parece estar acontecendo. Por trás dos cancelamentos de inúmeras temporadas, para além daqueles motivos suscitados, parece que estão acontecendo outros: por que manter a temporada se vai ter menos público e minha marca vai ser menos exposta?
Corre no mercado que o Bradesco e a Bradesco Seguros estariam cogitando retirar seus apoios a turnês ao Sul, redirecionando-as para o Nordeste, por exemplo. Confesso que não quis acreditar nisso. Assim, preferi escrever esta coluna. Por que o Bradesco ou quaisquer outras empresas não criam um projeto especial de fomento para a circulação de espetáculos produzidos no Estado, dentro de suas próprias fronteiras, levando-os às populações atingidas ou contratando-os para turnês fora do Estado? Qualidade não lhes faltam, por certo...
Outra questão: por que o Minc não cria um edital emergencial para grupos viajarem dentro do Estado e se apresentarem, não apenas em Porto Alegre, mas em cidades do Interior, devastadas pelas enchentes, e de fora do RS, garantindo mercado para estes artistas?
Que a CBF e seus associados sejam egoístas, não é novidade. Mas o universo da Cultura é bem diferente. Só precisa de apoio.
 

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