No momento em que escrevo esta coluna, a cidade de Porto Alegre continua invadida pelas águas do rio Guaíba e, sobretudo, pelos esgotos. Inclusive o Centro Histórico. Contudo, autoridades da área da cultura, instituições culturais variadas e produtores tentam se articular no sentido de propiciar algum apoio para os artistas que, uma vez mais, são os grandes prejudicados. São vários os problemas a serem enfrentados - o primeiro deles, a disponibilidade dos espaços.
No caso da Secretaria de Estado da Cultura (Sedac), com alguns de seus espaços fortemente prejudicados, como o Margs e especialmente a Casa de Cultura Mário Quintana (a cinemateca, sobretudo), há que esperar que as águas baixem, ocorra limpeza significativa e desinfecção para que se retomem as atividades, inclusive dos teatros do segundo e sexto pisos.
A Ospa, embora sua sede propriamente dita não tenha sido atingida, ficou isolada pelas águas, pois se encontra localizada no Centro Administrativo do estado. Alguns de seus músicos perderam seus instrumentos, que se encontravam em suas residências, para seus ensaios.
No caso do Theatro São Pedro (que, por estar numa região alta, e tendo tido seu telhado inteiramente reconstituído, entre janeiro e março do corrente ano, conseguiu escapar de problemas mais graves), ocorreu a invasão das águas no terceiro subsolo da Multipalco, na medida em que a energia elétrica foi desligada e as bombas de água, em consequência, pararam de funcionar, situação, felizmente, já contornada. No Multipalco, ainda, a chamada sala da dança sofreu algumas infiltrações, o que será rapidamente reconstituído.
Os mais prejudicados, sem dúvida, são os espaços municipais, seja no Centro Municipal de Cultura, com as salas Álvaro de Carvalho e Teatro Renascença, seja o recém reconstruído Teatro de Câmara, na rua da República, inteiramente invadido pelas águas. Não imagino quando tais espaços poderão ser reocupados, até porque eles já vinham bastante deteriorados e, pelo menos até o momento, a Secretaria Municipal de Cultura não se manifestou absolutamente sobre a situação.
O Instituto Ling, situado em parte nobre da cidade, felizmente não foi afetado, mas não dará conta de todas as necessidades de nossos artistas para os próximos meses. Do mesmo modo o teatro da Amrigs, perto da Pucrs, ou o teatro do CIEE, na Terceira Perimetral.
Um segundo problema é a disponibilidade dos grupos para poderem atuar. Muitos destes artistas, aliás, perderam inclusive seus instrumentos e/ou equipamentos. Outros grupos escaparam por pouco, mas como apresentar-se com todo o desgaste emocional? E que público estará disposto a pagar para assistir a tais espetáculos?
Uma das soluções em estudo pela Sedac é organizar apresentações que possam contar com patrocínios que já estavam acertados ou que receberão financiamento já aprovado. Também a Prefeitura está avançando neste sentido e, no último domingo, lemos que Luciano Alabarse, que reassumiu a coordenação do festival Porto Alegre em Cena, optou por realizar um festival inteiramente voltado para os grupos locais, o que viabiliza o orçamento da iniciativa e, ao mesmo tempo, garante apoio, através de cachês, a esses grupos.
A Fundação Theatro São Pedro está indo por este caminho. A partir da primeira semana de junho, o Musical Évora, que deveria ter estreado em maio, começa a ser realizado todas as quartas-feiras, propiciando, ainda, um espetáculo especial, em data a ser confirmada, com programação diferenciada, compensando os shows não realizados. Do mesmo modo a Orquestra do Theatro São Pedro, que tem programação financiada pela Lei Rouanet. O teatro, que cancelou toda a sua agenda de maio e junho, está reorganizando sua programação com o foco de apoiar artistas através de cachês, e deve organizar atividades especiais inclusive alusivas à passagem dos 40 anos de reabertura da instituição, depois de sua reconstrução coordenada por Eva Sopher, que coincide com a passagem de mais um aniversário da casa. Assim, na segunda quinzena de junho, uma programação intensa está sendo organizada, numa tentativa de retomada das atividades culturais.
Em meio ao caos, a área cultural fará enormes esforços para se rearticular e trazer ao público atividades variadas, que ajudem a ultrapassar esta destruição que sofremos, através da emoção que a arte nos proporciona.