Nesta quinta-feira (17), às 11h, um evento na prefeitura de Porto Alegre vai marcar a criação do Orçamento Participativo (OP) Eletrônico, que prevê a participação da população pela internet na elaboração da Lei Orçamentária Anual, indicando obras ou serviços a serem atendidos com prioridade.
Apresentado em 2016 pelo vereador Idenir Cecchim (MDB) e recuperado no ano passado, o projeto foi aprovado na íntegra na penúltima sessão da Câmara em 2021. No entanto, representantes comunitários do OP pedem que o prefeito volte atrás e não sancione a lei.
A medida não passou pelo Conselho do Orçamento Participativo (COP), instância que se autorregula na decisão sobre o funcionamento do OP na Capital, embora dependa de recurso do poder público para realizar suas atividades.
A falta de diálogo é alvo de críticas por parte dos conselheiros, que enxergam a modalidade digital como uma ameaça ao formato presencial. Hoje, às 9h30min, está prevista uma reunião de representantes do Conselho do OP com Cecchim e o prefeito Sebastião Melo (MDB) para discutir a questão.
"Quero que a sociedade participe mais", justifica o autor da proposta à coluna. Conforme o vereador, levar o OP para o ambiente virtual é uma forma de fazer com que outras pessoas decidam sobre as demandas do Executivo, "não só nos bairros mais distantes". Ele também questiona o sistema representativo dentro do Orçamento Participativo: "por que tem que ser restrito a poucas lideranças?", provoca. Pelo formato atual, o conselho decide, dentro das áreas priorizadas em votação nas assembleias, quais demandas serão atendidas.
Essa espécie de meio de campo que o COP exerce entre a população e o Executivo é tema de debate entre pesquisadores. Prevalece, entre os participantes, o entendimento que o conselho, além de intermediar a relação, é a instância que vai acompanhar e cobrar a execução da demanda. Mais que isso, tem papel de garantir atendimento de obras e serviços de interesse coletivo.
Laura Elisa Machado, conselheira da região Eixo Baltazar, lembra da breve experiência do
OP Digital, em 2019, quando a prefeitura tentou implementar em Porto Alegre o
modelo realizado em Madri, na Espanha. "A preocupação (de quem votou) era com poda de árvore, buraco na rua, iluminação e não com a cidade", aponta.
À época a iniciativa passou pelo Conselho do OP, que decidiu não validar. Somou-se a isso a pandemia e a falta de destinação de recursos nos anos seguintes, e o OP digital não avançou.
Outro debate antigo é sobre a institucionalização da ferramenta. O Orçamento Participativo de Porto Alegre não é regido por lei. Embora consolidado nos mais de 30 anos de existência, nos anos recentes teve a sua
manutenção ameaçada, em especial na gestão de Nelson Marchezan Júnior (PSDB, 2017-2020).
"O OP existe de fato, mas não de direito. E o OP Eletrônico será lei", compara Laura. Ou seja, há receio que o novo formato prevaleça em relação ao antigo e tradicional. Marivane Anhanha Rogério, conselheira da temática Desenvolvimento Econômico, Tributação, Turismo e Trabalho, explica o receio de que o modelo de votação eletrônica desmobilize o conselho e, como consequência, o próprio Orçamento Participativo.
Para ser colocado em prática, a administração municipal terá que criar um site ou aplicativo para smartphone próprio para o OP Eletrônico, com previsão de cadastro que incluirá número de CPF e título eleitoral - Cecchim alega que quer coibir que o morador de uma região vote em assembleia de outra parte da cidade. Ainda, dependerá da retomada das assembleias deliberativas, pois será vinculado ao ciclo do OP, o que está previsto para 2022.
Também é tema do debate o valor destinado para as demandas. Para este ano, estão previstos R$ 10 milhões do recurso público para o Orçamento Participativo - na divisão entre as 17 regiões e as temáticas ativas, foi destinado R$ 476 mil cada para atender o que já foi definido no passado como prioridade. "Vamos ter que disputar migalhas. Por ali (OP Eletrônico) já vai direto para a LOA", critica Marivane.
O valor atual é considerado baixo na comparação com o passado. O plano de investimentos para 2016, último ano antes da suspensão praticada pelo ex-prefeito Marchezan, destinou R$ 80 milhões para o OP. Para este ano, o prefeito Melo coloca na conta do OP R$ 150 milhões que serão destinados para as chamadas obras da Copa e o projeto da Orla.
Para não competir por valores, Laura sugere que a versão eletrônica defina os recursos das emendas impositivas - é a indicação de R$ 1 milhão ao ano que os vereadores fazem para obras e serviços e que o Executivo deve necessariamente cumprir.