A legalidade de decretos municipais regrando o funcionamento do Conselho do Plano Diretor, em Porto Alegre, é questionada pelo Ministério Público (MP) Estadual em um inquérito civil instaurado no mês de junho e tornado público esta semana.
No despacho, a promotora Débora Regina Menegat aponta divergência de atos que regram o funcionamento do conselho, tomados por iniciativa exclusiva do poder Executivo, e a Lei Geral de Conselhos, de abrangência federal e que garante essa prerrogativa ao colegiado.
Em relação aos dois primeiros, a promotora encontrou elementos que condizem com a organização e o funcionamento do conselho, matéria que deve ser tratada pelo regimento interno, objeto de elaboração e aprovação pelos membros do conselho. Também é questionada a resolução nº 01/2020, que disciplina artigos do regimento interno. Neste ponto, o documento pede revisão ou anulação dos atos.
Ainda, o inquérito aponta divergência na restrição à análise de projetos especiais pelos conselheiros com a lei do Plano Diretor, que atribui ao colegiado a incubência de aprovar projetos especiais, garantindo a este a decisão final. Nesse ponto, argumenta a promotora, “há claro cerceamento da sua atuação se esta decisão for restringida, de plano, apenas ao exame do mérito do projeto”. O despacho orienta o município pela correção deste ponto.
Já em relação às reuniões virtuais, a promotora pondera que é necessário o ato disciplinando, porém entende que esta definição deve ser dada pelo próprio colegiado.
A Promotoria de de Justiça de Habitação e Defesa da Ordem Urbanística, responsável por instaurar o inquérito, acompanha o andamento da revisão do Plano Diretor em Porto Alegre por um expediente próprio, tendo realizado reuniões de mediação entre a prefeitura e representantes da sociedade em diversas ocasiões, sendo
a mais recente em 19 de junho, de forma virtual.
Embora sejam matérias correlatas, pois compete ao Conselho acompanhar a revisão do Plano, esta não é a única função do colegiado, o que motivou a instauração de inquérito específico para este caso.
O secretário Germano Bremm, titular da pasta de Meio Ambiente e Sustentabilidade e presidente do Conselho do Plano Diretor, entende como natural o procedimento, por parte do Ministério Público, de acompanhar as atividades do Executivo em atendimento às demandas da sociedade.
Bremm afirma que o município irá responder,
assim como já fez com recomendações, e encara a atitude da Promotoria como uma tentativa de conciliar, evitando a judicialização destas questões. Sobre a disciplina da organização e do funcionamento do Conselho, dada por decreto, Bremm sustenta a legalidade, citando que essa prerrogativa consta na lei do Plano Diretor.
Conselheiros e entidades denunciam violações à participação no Conselho
Denúncia encaminhada ao Ministério Público e assinada por quatro entidades e três regiões de planejamento que compõem o Conselho do Plano Diretor de Porto Alegre pede "a abertura do inquérito ou o ajuizamento da ação que julgar cabível sobre graves violações à participação social e ao controle social".
O envio da denúncia é posterior à instauração do inquérito sobre o funcionamento do colegiado e indica outros elementos, além dos já questionados pelo MP. Em 12 páginas é apresentado um histórico dos atos praticados desde o início da atual gestão municipal, afetando diretamente a gestão do conselho.
Um dos pontos novos apontados na denúncia é o
atraso nas eleições do atual colegiado em 2018, interrompendo o trabalho do Conselho por seis meses. O documento acusa que atos do Executivo "padecem de legalidade, limitam a participação popular e cerceiam o devido controle social".
Segundo o arquiteto e urbanista Rafael Passos, "o Plano Diretor delega ao Conselho a avaliação de Projetos que têm grande impacto na cidade, a definição das contrapartidas desses empreendimentos em prol do interesse público e alterações nas regras do Plano para alguns casos. As restrições impostas por essas medidas ferem essa delegação".
Passos é presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil no Rio Grande do Sul (IAB RS), que integra o conselho e é uma das entidades signatárias da denúncia. "É o contribuinte, o ambiente e a cidade que acabam pagando. As medidas impostas recentemente pelo Executivo, além de aparentemente ilegais, restringem esse papel dado ao CMDUA pelo legislador, e em última instância, pela sociedade", completa.
O documento é assinado pela Acesso Cidadania e Direitos Humanos; Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento RS (IAB RS); Sociedade de Economia do Rio Grande do Sul (SOCECON); e Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas no Estado do RS (SAERGS); e os conselheiros Felisberto Luisi Seabra, da Região de Planejamento (RP) 1; Tânia Maria dos Santos da RP4; e Maristela Maffei da RP7.