As chuvas intensas que atingem o Estado neste mês de setembro, o mais chuvoso em Porto Alegre desde 1916, tornaram mais evidentes os problemas que a Cooperativa Mãos Unidas enfrenta desde que foi concluída a obra de ampliação da Avenida Severo Dullius e obras na Avenida Sérgio Dietrich há mais de um mês. Com a elevação do nível da via, o terreno - próximo do aterro do antigo lixão da Zona Norte - fica alagado sempre que chove. Sem área para escoamento, a água fica acumulada, às vezes por dias.
Este é o cenário há três semanas na cooperativa - classificada pela prefeitura como Unidade de Triagem (UT) Zona Norte. Mas, no início desta semana, o caso se agravou: a água atingiu a área interna do galpão de triagem, local que recebe os resíduos da coleta seletiva. Isso impede que seja realizado o trabalho de separação dos materiais que serão encaminhados para a reciclagem.
O lixo que já estava no local ficou debaixo d'água, assim como toda estrutura de trabalho, a exemplo do maquinário usado para prensar e fazer os fardos de resíduos. Sem ter como armazenar o material, a cooperativa não está recebendo as cargas da coleta seletiva, o que pode resultar em penalização, com desconto no repasse feito pela prefeitura, conforme previsto no contrato de prestação de serviço.
Sem área para escoamento, água acumulou e trabalho foi prejudicado. Foto: COOPERATIVA MÃOS UNIDAS/DIVULGAÇÃO JC
Nestes dias sem conseguir trabalhar, os 15 catadores cooperados perdem sua fonte de renda, que vem da venda dos recicláveis. "Está complicada demais a situação", conta Josué da Roza Moreira, presidente da Mãos Unidas. Ele reclama que "não estamos vendo movimento nenhum do poder público para resolver o problema". Na tarde de quarta-feira ele conseguiu equipamento e começou a drenar a água para fora do terreno. O volume era tanto que na tarde de quinta-feira a retirada da água ainda não tinha sido concluída.
A prefeitura de Porto Alegre reconhece a situação. Designado para lidar com o caso, o secretário de Desenvolvimento Social, Léo Voigt, explica que a cooperativa está "numa zona problemática e alagadiça" e que, com as obras da avenida, a área "foi ainda mais aterrada". Para isso, o governo sinaliza com duas possibilidades: realocar a UT para algum terreno próximo ou instalar no local um sistema de bombeamento para drenar a água.
Para resolver este caso será necessário investimento, aponta Léo. Investimento, aliás, é demanda comum às demais cooperativas de catadores que prestam serviços para o município, muitas com problemas de infraestrutura. "Temos garantido recursos para a elaboração de projetos de reformas e adaptações. Estamos negociando com agências internacionais para obras específicas para as unidades de triagem do sistema da Prefeitura", informa o secretário. Ainda não se sabe qual o valor nem quando estará disponível.
Antes de qualquer medida que vá solucionar este caso, representantes do Executivo terão que explicar o que está acontecendo com a UT Zona Norte ao Ministério Público Estadual. Nesta quinta-feira a promotora de Justiça Annelise Monteiro Steigleder notificou a Prefeitura e a cooperativa para uma audiência para "apurar situação de calamidade (...) provocada pelo descaso, pelo abandono da Gestão Municipal a esta UT e pela ocorrência de alagamentos sem escoamento causada pelas construções" das avenidas.