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Opinião Econômica

Publicada em 16 de Dezembro de 2024 às 19:27

A crise foi causada por Joaquim Levy?

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Samuel Pessôa
Samuel Pessôa
Com o passar do tempo e a consolidação das estatísticas, podemos olhar para o passado recente e entender o ocorrido. Em outubro de 2023, documentei que a desorganização da economia que desaguou na grande crise de 2014 até 2016 começou no segundo mandato de Lula, não no primeiro de Dilma.
Há uma tese, cara ao presidente Lula, de que o ajuste fiscal de Joaquim Levy de 2015 foi a causa da crise econômica e da perda de popularidade de Dilma 2. Na coluna de outubro, documentei que, já em 2013, os desequilíbrios eram expressivos. De qualquer forma, vale olhar para a questão novamente: foi o corte dos gastos de Levy que causou a crise?
O quadro apresenta a taxa de crescimento real, ano sobre o ano anterior, do gasto público primário. A série mensal foi colocada a preços de setembro de 2024, deflacionada pelo IPCA, e foram feitos ajustes contábeis para que se aproxime ao máximo do conceito de gasto primário. Em razão da pandemia, o crescimento do gasto primário foi de 31,1% em 2020 e de -23,6% em 2021. Para os demais anos, o valor representa a taxa de crescimento.
Há duas informações importantes. Primeiro, o gasto público teve crescimento negativo em só três anos, 2003, 2016 e 2017. Em 2003, o crescimento do PIB foi de 1,1%, bem maior que o 0,5% em 2014, quando o gasto público avançou 6,4%! Em 2015, ano do agravamento da crise, o gasto público real subiu 1,9%. O freio na economia e a crise precedem a queda do gasto público. Por outro lado, a recuperação da atividade -em 2017, o PIB cresceu 1,7%- ocorre antes da do gasto público. Em 2017, o gasto público real ainda caiu. Não parece que o ajuste de Levy seja responsável pela grande crise do final da primeira hegemonia petista.
A segunda informação importante é que a média das taxas de crescimento do gasto público primário real no período foi de 5% ao ano. Essa taxa é muito maior do que o potencial de crescimento da economia. Esse fato evidencia a disfuncionalidade da economia política brasileira. Nosso contrato social demanda que a economia entregue algo impossível: um gasto público como proporção do PIB que cresce permanentemente. Enquanto não conseguirmos construir instituições fiscais críveis, que garantam que o aumento do gasto primário seja a taxas iguais ou ligeiramente inferiores à expansão da economia, não conseguiremos engatar um longo ciclo de crescimento.
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP

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