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Opinião Econômica

Publicada em 04 de Novembro de 2024 às 19:41

Novo Fundeb não trouxe a revolução alardeada

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Marcos Mendes
Marcos Mendes
O governo estuda medidas para controlar gastos e aumentar a eficiência das políticas públicas. A complementação da União ao Fundeb (Fundo do Ensino Básico) é um dos pontos sob análise.
Essa despesa pulou, em termos reais, de R$ 21 bilhões para R$ 44,5 bilhões em apenas quatro anos. É resultado da aprovação da emenda constitucional 108/20, que determinou a elevação da participação da União no fundo de 10% para 23% do aporte feito por estados e municípios. Como o aumento desse percentual é gradual (atualmente estamos em 19%), o crescimento do gasto continuará pelo menos até 2026, quando chegaremos aos 23%.
O objetivo inicial da emenda era meritório: redistribuir o fundo em favor de municípios mais pobres, sem aumentar a despesa. Mas incorporou o aumento de aportes da União, sob o argumento de que mais dinheiro seria fundamental para melhorar a qualidade da educação.
Passados quatro anos, não se vê a revolução propalada pelos entusiastas da PEC. No exame internacional Pisa, continuamos atrás de países cujo gasto por aluno é similar ao nosso, como Colômbia, México, Turquia e Chile.
Durante a discussão da PEC, argumentei em colunas, artigos e audiência pública que o problema não era pouco dinheiro, mas falta de incentivos à boa gestão. A emenda deu mais dinheiro e piorou os incentivos.
Houve forte resistência, durante a tramitação, a premiar os municípios por melhoria nas notas médias dos alunos. A pequena fatia do fundo que acabou destinada para este fim não foi regulamentada até hoje.
Aumentou o engessamento na alocação dos recursos: a parcela do fundo carimbada para pagar salários passou de 60% para 70%, reduzindo o espaço para gestores locais decidirem a alocação do dinheiro, conforme suas diferentes necessidades.
A PEC também induziu forte crescimento do piso salarial do magistério. Em 2008, lei proposta pelo então ministro da Educação, Fernando Haddad, indexou o piso salarial ao crescimento do valor gasto por aluno. Mais dinheiro no Fundeb significou mais gasto por aluno, implicando seguidos reajustes anuais de dois dígitos no piso do magistério, que hoje está em R$ 4,6 mil.
A literatura só encontra relação causal entre aumento da remuneração de professores e desempenho dos alunos quando o pagamento a maior se faz por premiação de desempenho. Além disso, é preciso que haja liberdade para demitir por mau desempenho. Condições não observadas no Brasil.
Os aposentados do magistério também têm direito ao piso, mas recursos do Fundeb não podem custear aposentadorias. Logo, os municípios têm que tirar dinheiro de outras políticas para pagar os aposentados. Não é de admirar que reajam, indo a Brasília para obter desoneração de alíquotas previdenciárias e outras ajudas fiscais, propagando o custo de políticas mal desenhadas.
Esses problemas eram previsíveis no momento de votação da PEC. Foram debatidos publicamente. Não obstante, ela foi aprovada por 499 x 7 na Câmara, e por 79 x 0 no Senado.
Pesquisador associado do Insper, é organizador do livro 'Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil'

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