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Opinião Econômica

Publicada em 16 de Outubro de 2024 às 18:57

Desequilíbrio fiscal ainda não é visto como questão urgente

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Solange Srour
Solange Srour
As incertezas sobre nossas contas públicas têm trazido pressões altistas para a curva de juros e impedido que o real se valorize com o aumento do diferencial de juros. Prova disso é que, na semana passada, tivemos a pior performance entre as moedas de economias emergentes. Nem mesmo a divulgação de mais um IPCA bem comportado, na última quarta-feira (9), evitou que a curva de juros chegasse a embutir uma Selic perto de 13,5% ao final de 2025.
A discussão sobre a isenção de Imposto de Renda para salários até R$ 5.000, cujo custo será elevado mesmo se implementado de forma mais restrita, foi um fator de estresse. Além de aumentar a desconfiança dos investidores sobre a estabilidade de nossa dívida, a proposta confirma que a direção da política fiscal continuará sendo expansionista, apesar de a economia não dar sinais de desaceleração.
A iniciativa também expõe a falta de coordenação entre as políticas econômicas. Isso porque é tratada ao mesmo tempo em que o ministro da Fazenda busca novas receitas para sustentar metas desafiadoras de superávit primário, enquanto o Banco Central tenta conter a deterioração das expectativas de inflação que, em parte, sobem pela falta de uma âncora fiscal.
Até agora, a maioria dos sinais revelavam que nosso desequilíbrio fiscal não era visto como uma questão urgente por quem deveria liderar o processo de ajuste. A inconsistência que está sendo questionada no arcabouço fiscal é o ritmo da redução das despesas obrigatórias, e sobre isso havia, até agora, pouca ênfase nos pronunciamentos da equipe econômica.
No entanto, nos últimos dias, temos visto uma reação importante do Ministério da Fazenda. A "batata quente", como afirmou Fernando Haddad em entrevista a Mônica Bergamo nesta terça-feira (15), teria virado prioridade e está sendo analisada pelo presidente.
Para os investidores, endereçar a questão do arcabouço significa fazer uma revisão significativas de gastos -como seguro-desemprego, BPC e abono salarial, além da desvinculação da saúde e educação.
Se medidas relevantes não vierem neste ano, os preços dos ativos domésticos irão incorporar a volta da Nova Matriz Econômica e as conversas de dominância fiscal retornarão. Em 2015, esse ambiente levou os juros reais de dez anos no Brasil a um patamar perto 8%, na esteira de uma depreciação cambial de mais de 60%.
Alguns pontos de comparação entre nossa situação atual e a de 2015 são preocupantes. Temos agora uma dívida/PIB de cerca de 78%, sendo 45% dela pós-fixada. Em 2015, tínhamos cerca de 64% de dívida/PIB, com 22% dela pós-fixada. Ou seja, tanto a alta da Selic quanto o comportamento da nossa curva de juros têm hoje um impacto bem maior na dinâmica da dívida.
O contexto internacional também é outro atualmente. Há nove anos, o juro nominal americano de dez anos estava perto de 2% e agora está em cerca de 4%. Ou seja, nosso diferencial de juros está muito menor do que em 2015.
O teto de gastos foi criado em 2016, depois de passarmos por uma crise econômica gravíssima, que deixou a classe política muito preocupada. Se não enfrentarmos a questão fiscal em breve, nosso crescimento será sacrificado para que, enfim, possamos trazer regras fiscais críveis e juros mais baixos.
 Economista-chefe do Credit Suisse Brasil

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