A cheia histórica de maio de 2024 mudou negócios e seus gestores. Os empreendimentos de varejo afetados pela água e que se refizeram dos impactos, principalmente em áreas como o Quarto Distrito, na Zona Norte de Porto Alegre, tiveram diferentes condutas.
A coluna Minuto Varejo mostra três exemplos dos setores de materiais de construção e elétrico, livros e alimentação. Dois deles permaneceram nos pontos (Drystore e Livraria Fergs), mas um (Mark Hamburgueria) abriu duas unidades em outros bairros.
"Tem de voltar para o jogo", resume Fábio Ghesse, diretor e fundador da Drystore, no bairro São Geraldo, na Capital, que atua com itens como componentes de painéis fotovoltaicos. Ghesse teve a loja, depósito e outra operação de construção afetados, com prejuízo de R$ 4,3 milhões.
Loja fica no bairro São Geraldo e ficou mais de 20 dias com água acima de um metro
DRYSTORE/DIVULGAÇÃO/JC
"Cheguei a pensar que não ia conseguir continuar, que teria de demitir os 40 funcionários, mas focamos na ajuda às pessoas do bairro e depois todos (equipe) pegaram junto para voltarmos", recorda o comerciante. Além disso, a vizinhança e os clientes foram decisivos.
"Muitas pessoas diziam que não sabiam o que iam fazer com os produtos, mas que estavam comprando para ajudar a loja", recorda. Resultado é que julho de 2024, logo depois da cheia e da reabertura da Drystore, foi o mês de venda recorde nos 23 anos do negócio, que agora começa a se estabilizar e deve crescer 15% em 2025. No ano passado, o efeito climático foi inevitável: o faturamento caiu 10% no ano.
O diretor lembra que chegou a ter em cima da mesa contrato para alugar imóvel e transferir o comércio a outro bairro, mas decidiu ficar na rua Santos Dumont, no bairro São Geraldo. Ele se deu conta que seria mais rápido remontar a loja, mas muita coisa mudou na condução da Drystore.
Todos os produtos e estoques, além de computadores e redes, foram perdidos
DRYSTORE/DIVULGAÇÃO/JC
"Repensamos de forma geral, com foco em melhoria da área comercial. Estou hoje muito mais atento, na linha de frente com clientes", resume o varejista. "Temos um passivo de R$ 5 milhões para pagar em cinco anos", cita Ghesse, sobre os financiamentos que a empresa obteve com bancos públicos de programas de reconstrução do Estado.
Na retomada, ele recorda que montou uma marcenaria dentro da loja para refazer o mobiliário. Para o futuro, algumas medidas: computadores foram trocados por notebooks e sistemas estão na nuvem, áreas físicas podem ser movimentadas, caso tenha nova inundação, e a meta de retomar a captação de clientes nos Estados Unidos para o braço de construção.
Livraria reabre após doação até do Exterior
Fergs perdeu mais de 20 mil livros na cheia e voltou com nova estrutura da loja
FERGS/DIVULGAÇÃO/JC
"Reconstruímos toda a livraria", conta Antonio Nascimento, presidente da Federação Espírita do RS (Fergs), que é dona da unidade, na Travessa Azevedo, no bairro Floresta, na Zona Norte de Porto Alegre. Tamanho foi o dano que a livraria só foi reaberta em 23 de abril, quase um ano após a água "destruir" a operação.
A região onde fica a Fergs, com mais de 70 anos de história, teve mais negócios no segmento afetados, como a sede e estoques das livrarias Santos e Cameron, que também perderam centenas de milhares de livros, no Quarto Distrito.
"Na retomada, instalamos materiais mais resistentes, caso se tenha nova inundação. O gasto para reconstruir a unidade foi de R$ 1,2 milhão", contabiliza o presidente.
"Tivemos doações e ajuda de muitos simpatizantes do Rio Grande do Sul, Brasil e até do Exterior. Foi o que permitiu fazer a obra", valoriza Nascimento. A enchente arrasou mais de 21 mil publicações. Foram mais de 20 dias sob a água.
Área da nova livraria ganhou mais mobilidade (mobiliário), espaços e ficou mais "agradável"
FERGS/DIVULGAÇÃO/JC
O impacto na livraria afetou também a distribuição, já que a operação abastece 500 centros espíritas no Estados e tem quase 4 mil associados no clube do livro.
A loja voltou diferente. "Mudamos o layout, com entrada pela travessa agora e integrando com a sede da Fergs. O espaço está mais aconchegante, com área de leitura e convivência", contrasta o presidente.
Mark Hamburgueria: novo conceito e expansão com franquia
"Novo conceito para um novo ano." A definição é do dono da Mark Hamburgueria, Mark Bandeira, ao narrar a trajetória do negócio desde maio de 2024.
Depois de ter a loja inundada no Boulevard Laçador, ao lado do Aeroporto Salgado Filho, Zona Norte de Porto Alegre, o proprietário da hamburgueria partiu para outras regiões. Foi um caminho diferente de outros que preferiram ficar no ponto inundado.
"Foi um recomeço. Perdi a loja do Laçador e ficamos 15 dias com a da Cidade Baixa debaixo da água", lembra o empreendedor. Mark cita que a lição da enchente foi a readaptação. "Sessenta dias depois, abrimos uma loja no Bom Fim, com equipamentos que conseguimos resgatar do Laçador. Na Cidade Baixa, a gente voltou em 24 horas depois que a água baixou", relembra.
Bandeira abriu duas unidades pós-cheia, a mais recente no bairro Auxiliadora
HENRIQUE PIZZATTO/DIVULGAÇÃO/JC
"É uma nova loja (na Vila Roubadinhas e segunda no bairro Auxiliadora), com 'menos variedade de lanches, na contramão do mercado'. É um fast-food com qualidade, com mais praticidade para resolver a vida do cliente", define Bandeira, agora com cinco pontos, após a abertura da unidade.
Na nova operação, a segunda do bairro, ele diz que a novidade é o autoatendimento, com tela onde são feitos os pedidos. O segredo, conta Mark, está na cozinha, em como chega o pedido (disparado na interface do totem no salão). P
ara completar o "cardápio" da filial, o empreendedor criou uma lojinha da marca, com camisetas, bonés, copos, chaveiro e ecobags. "Para os fãs que quiserem levar a Mark para casa", valoriza ele.
No futuro, o empreendedor planeja reativar a ideia de expandir a rede como franquia. "Já tem pessoas interessadas. O modelo será o da nova loja, com custo mais baixo de implantação e retorno mais rápido do investimento", elenco Bandeira.