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Minuto Varejo
Patrícia Comunello

Patrícia Comunello

Publicada em 30 de Janeiro de 2024 às 20:02

"Formamos uma geração de novos empreendedores", orgulha-se CEO do Pop Center

"Quando assumi, diziam: 'Tu é louca'. Ninguém acreditava que podia dar certo", recorda Elaine Deboni

"Quando assumi, diziam: 'Tu é louca'. Ninguém acreditava que podia dar certo", recorda Elaine Deboni

TÂNIA MEINERZ/JC
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Patrícia Comunello
"Gosto de falar do meu coração." Uma conversa com Elaine Deboni, que há 14 anos comanda o Pop Center, fincado na muvuca do varejo do Centro Histórico de Porto Alegre, só podia começar com esta frase. Elaine, CEO do complexo com mais de 600 lojas, mas ainda estigmatizado como "antigo camelódromo", foca em novidades, entre elas novas operações e lojistas e mais fluxo, tudo que o comércio mais deseja em 2024.
"Gosto de falar do meu coração." Uma conversa com Elaine Deboni, que há 14 anos comanda o Pop Center, fincado na muvuca do varejo do Centro Histórico de Porto Alegre, só podia começar com esta frase. Elaine, CEO do complexo com mais de 600 lojas, mas ainda estigmatizado como "antigo camelódromo", foca em novidades, entre elas novas operações e lojistas e mais fluxo, tudo que o comércio mais deseja em 2024.
Depois de conquistar a inclusão no Pacto Global da ONU - obtido em menos de um mês entre inscrição e resultado -, a executiva, com origem no varejo de moda de luxo, está animada com a abertura em breve do Tudo Fácil, ligado ao governo estadual e o único do Centro, a chegada de 100 novos ocupantes - desafio de formar e agregá-los aos 620 já estabelecidos -,  e novas operações em alimentação. "Vai ser um divisor de águas", traduz ela, sobre a unidade com serviços públicos.
O complexo ainda busca uma farmácia e mais serviços. Quase 100 espaços ainda estão ociosos.  
Na conversa mais "de coração do que razão", como ela frisa, com o Minuto Varejo, Elaine fez questão de valorizar a trajetória dos lojistas que estão desde o começo do Pop, entre gerações que se formaram no complexo e as veteranas e tenta vencer "o estigma de camelódromo" com uma provocação: "Camelô é o que tá na rua. Quando tem endereço, não é mais".
O preconceito e as resistências que ela diz sentir até hoje ao negócio, que se estende entre a avenida Mauá e a rua Voluntários da Pátria, recebem uma resposta que está na ponta da língua da CEO: "Formamos aqui uma geração de novos empreendedores". A seguir, como foi o bate-papo e o que vem por aí no Pop Center, que completa oficialmente 15 anos em 9 de fevereiro:   
Minuto Varejo - Como foi o começo à frente do Centro Popular de Compras?
Elaine Deboni - Deus fez os loucos para confundir os sábios, não é? (risos). Quando assumi aqui, diziam: 'Tu é louca'. Ninguém acreditava que podia dar certo. Tinha trabalhado 25 anos no mercado premium (luxo) de moda, o que me deu muita credibilidade. Tive sabedoria de escolher os caminhos certos, apesar da loucura, ao encarar este projeto. As pessoas precisam de sonhos e de reconhecimento. Não dei R$ 1,00 para ninguém aqui. A única coisa que fiz foi trabalhar a autoestima e mostrar a eles (lojistas) que seria possível fazer dar certo. Para quem consegue sobreviver nas intempéries da rua, imagina tendo um teto? Tivemos prejuízo no começo, pois muitos não pagavam aluguel. Hoje nossa inadimplência é zero. Tive um abdômen forte para segurar a barra (risos). As pessoas que não desistiram e tiveram vontade cresceram. Fizemos muito treinamento também em gestão e o que precisaram para formalizar e administrar os negócios. Muitos que estão aqui hoje são de segunda e terceira geração, de pais e avós que saíram da rua para trabalhar aqui. Mais de 60% de jovens que estariam na rua, netos e filhos de camelôs, não é?  
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Elaine na escadaria, com nomes de escritores e livros gaúchos, no acesso pela rua Voluntários da Pátria. Fotos: Tânia Meinerz/JC  
MV - Como foi essa transformação?
Elaine - Formamos uma geração de novos empreendedores. Essa gurizada é muito rápida. Temos pessoas que daqui abriram negócios fora. Fomos um dos complexos que menos sofreu na pandemia. Quando surgiu a crise, conversamos, decidimos abrir os fundos do Pop para fazer drive-thru. Incentivamos todos a trabalharem nas redes sociais, que foi o que deu o boom para quem soube trabalhar com essas ferramentas. A pandemia foi um grande negócio para os jovens. Os mais velhos se perderam. Sempre usei a metáfora da Fórmula 1: o piloto para em algum momento para abastecer e trocar os pneus, mas não desce do carro, pois não pode perder o ritmo. Aqui, não temos criança fora da escola e ela são as melhores da sala de aula. Elas fazem questão de ser melhores! Trabalhamos muito com os que eram criança (quando chegaram aqui com os pais) para que tivessem amor de estar no Pop Center. Hoje temos 95% de formalizados. O faturamento é de mais de R$ 1 milhão ao ano. Passam 40 mil pessoas ao dia por aqui. E elas adoram comprar no Pop!

MV - Mesmo com todo esse trabalho, o Pop ainda é chamado de camelódromo. O estigma vai desaparecer algum dia?
Elaine - As pessoas ainda chamam de forma preconceituosa de camelódromo, mas camelô é o que tá na rua. Quando tem endereço, não é mais. Aqui sempre foi um centro popular. Os consumidores podem voltar e trocar produtos, eles seguem as regras e concorrem com o varejo da vizinhança, claro, e porque são bons! Eles estão formalizados, têm produto bom e baixo custo para operar. Hoje temos atacadista aqui dentro que fazem produtos. Uma família que atuava em seis pessoas em quatro metros quadrados agora tem espaço muito maior, fábrica e e-commerce. Uma vez um dirigente do comércio da Capital nos visitou e mostrei a ele que havia jovens com faculdade com lojas aqui dentro. Ele me olhou e disse: 'Eles não deveriam estar aqui'. Olha, tem muito lojista penando que estaria melhor no Pop. O preconceito é fogo. O único prefeito de Porto Alegre que veio aqui foi o José Fogaça, mas apenas no primeiro ano do complexo.  
MV - Ainda tem produto sem origem e sem nota?
Elaine - Não faço publicidade de quem vende mercadoria falsa, não incentivamos. Mostramos quem está legalmente aqui. Além disso, somos muito mais fiscalizados que todo o comércio por todos os órgãos públicos, da prefeitura à Receita Federal. Gosto que seja assim, porque nos dá tranquilidade. Tem um "chicote" aqui (risos). Se algo não estiver bem, já resolvemos. 
MV - A sublocação acabou?
Elaine - A melhor coisa que aconteceu em 2023 foi o decreto que alterou a sublocação e quem fiscaliza somos nós. Hoje 100% dos ocupantes das lojas são donos. Agora eles vão crescer de verdade, podem ter até até 40 metros quadrados aqui. Antes tinham de pagar quem era o proprietário.  
MV - Como foi a entrada no Pacto Global da ONU? De repente o Pop estava em um seleto grupo com grandes marcas e com este compromisso.
Elaine - Costumo dizer que ficamos 15 anos nos habilitando ao Pacto. Isso começou desde o primeiro dia que entramos na gestão. Atendemos 10 dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Nos inscrevemos em 29 de julho de 2022 e, em 19 de agosto, no mês seguinte, fomos aceitos. Um prazo recorde. São 16 mil empresas no mundo no Pacto. O Pop significa a inclusão em todos os sentidos, do emprego ao meio ambiente. Quando entrei aqui, sabia que tinha uma mina de ouro (pessoas) na mão. Fico realizada vendo quem está aqui falando: "O Pop mudou minha vida". Este é o quesito número 1 para o Pacto Global. Fui recentemente em uma reunião do Pacto com grandes companhias, como Johnson & Johnson e Volvo. Falei quase em voz baixa diante daqueles grandões. Depois que falei, todos me cumprimentaram pelo trabalho que fizemos e estamos fazendo com as pessoas.
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Elaine com Otélio Drebes e prefeito da Capital no evento que teve mais de 900 pessoas no Parque da Harmonia
MV - A entrada no Pacto Global pode derrubar o preconceito? 
Elaine - Dizia para mim: só vou ser feliz quando tiver reconhecimento internacional, porque aqui dentro (Capital) não tenho. Logo que entrei na gestão, o primeiro lugar que fui foi na CDL Porto Alegre, a convite do então presidente na época, Guga Schifino. Fui convidada para participar de uma reunião do conselho da entidade. Mas aí um sócio pediu para eu me retirar dizendo que "ali não era lugar de camelô". Aí respondi: "Não sou camelô. Estou no Pop para transformá-los". Depois disso, nunca mais voltei à CDL. Mas participamos do Liquida, somos um dos mais engajados. Contei isso tudo ao atual presidente, Irio Piva, no evento dos 15 anos, nessa terça-feira (30 de janeiro). Quase 900 pessoas no Parque da Harmonia, entre as principais entidades do comércio e autoridades da cidade. Foi demais! Acho que (e falo de coração) começamos a escrever um novo momento na relação entre o Pop e Porto Alegre.
MV - Qual vai ser o efeito do Tudo Fácil para o Pop?
Elaine - Vai ser um divisor de águas. As pessoas vão ter um local com estacionamento. A expectativa é que circulem pelo posto nove mil a 10 mil pessoas por dia no local. O tempo máximo para ficar pronto um documento é estimado em duas horas. Enquanto espera, a pessoa pode dar uma passeadinha nas lojas.

MV - O que vai ter de novidade este ano e que tipo de operação falta aqui?

Elaine - Vamos complementar a área com mais 100 lojas, reduzindo as atuais 180 vazias. Estamos treinando os ambulantes que vão entrar. É uma exigência nossa. Eles precisam ter sonhos, isso é importante. Falo para todos: "Imaginem que estão em um avião e vão se lançar de paraquedas. O único risco é ficar engatado no avião. Se soltar, vão voar". Ou seja, o avião é a coisa velha, é a rua. Digo a eles: se soltem. Vai abrir um galeto na área da alimentação, mas precisamos mais variedade de temos espaço para quem quiser abrir aqui. Muitos ocupantes e clientes reclamam que falta barbearia. É compreensível: 60% dos consumidores são homens! A gente brinca que, quando as mulheres quiserem encontrar homens, têm de vir no Pop (risos). Também falta farmácia. Tivemos uma há muito tempo, mas a rede não usou sua logomarca mais conhecida. Colocou o nome de Farmacolândia porque não queria ser associada ao "camelódromo". Um dia um idoso me pediu que carimbasse a nota para comprovar que era verdadeira a medicação que comprou. Foi a gota d'agua. Pedimos que a farmácia saísse, a menos que estampasse o nome da rede. Tenho de escrever um livro sobre o Pop. Sou uma sobrevivente. Meu pai dizia que "o lombo só alivia, enquanto sobe o relho" (risos). Fomos selecionados para ser um dos espaços da Bienal, mas precisamos de patrocinadores. Quem se interessar pode falar comigo! Vamos fazer a semana de moda este ano. Aqui a gente não fala, a gente faz!

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