A Track & Field (T&F), focada em moda esportiva, está bem em forma. Segundo o CEO da companhia, que estreou em agosto no posto, Fernando Tracanella, os números do balanço mais recente validam os acertos da marca. Para 2024, a expansão de lojas físicas deve repetir a média de 35 a 40 unidades, e o Rio Grande do Sul é prioridade.
A coluna Minuto Varejo conversou com Tracanella sobre as razões do desempenho, em meio a uma conjuntura em que varejo de moda e outros segmentos ainda tenta se reerguer pós-pandemia, impactos da omnicanalidade e do novo modelo de loja nos resultados da companhia, além de novas apostas, como o marketplace e uma plataforma de wellness, que está em gestação:
Minuto Varejo - O que explica o desempenho da T&F?
Fernando Tracanella - Os números foram muito bons, A companhia vem de um período longo de crescimento robusto. Quando se olha o período de 2019 a 2022, a rede mais do que dobrou de tamanho. As vendas cresceram, em média, 27% ao ano, apenas com expansão orgânica e crescendo na mesma base de loja, sem aquisições. Tem muito varejo que cresce mais, mas comprando outras marcas. Em 2023, mantém o mesmo ritmo, próximo a 20% no trimestre, que foi o do terceiro frente a 2022. O Ebtida (lucro operacional) cresceu 22%. Muito parecido do primeiro semestre, portanto, sobre uma base mais forte.
MV - O que explica este nível e ritmo de crescimento?
Tracanella - Primeiro, uma situação externa à companhia, com tendências muito favoráveis ao negócio. As pessoas cada vez mais preocupadas com a saúde, querendo se cuidar mais, o que se acentuou muito com a pandemia, com uma preocupação de praticar atividade física, e buscando roupas mais confortáveis. Isso se reforça ainda com o trabalho mais híbrido, usando vestuário mais confortável para trabalhar, o que nos favorece muito, até porque a nossa missão corporativa é conectar as pessoas ao estilo de vida ativo e saudável. A companhia também tem acertos internos, além de ser favorecida por esse ambiente externo. Digitalizamos muito a operação, com crescimento do e-commerce e do que chamamos de omnicanalidade, que é o consumidor se relacionar com a marca independentemente do canal. O cliente está sempre no centro. Mais de 80% do que é capturado pelo e-commerce é faturado e entregue pelas lojas físicas, o que reflete sempre a ideia de fazer o produto chegar mais rápido ao cliente, com o menor custo de frete também e ainda engajando a rede de franquias, que são a maior parte da rede. Das 343 lojas atuais, 45 são próprias (incluindo 10 outlets e e-commerce) e 298 são franquias. No Rio Grande do Sul, são cinco próprias e 33 franquias.
MV - Como é este processo de venda digital usando as lojas?
Tracanella - A gente capta a venda, e o sistema localiza a loja mais próxima do cliente, que nem perceberá de onde sai o produto. As lojas cada vez mais minihubs de logística. O novo CD é cada vez mais para abastecer loja e não para enviar produto ao consumidor. O e-commerce ganha também cada vez mais relevância e já 7% do negócio, mais que dobrando frente ao pré-pandemia que era ao redor de 3% do faturamento.
MV - A T&F tem novo modelo de loja. Quanto isto vem impactando os resultados?
Tracanella - O novo modelo (algumas em Porto Alegre) tornou a exposição de produtos mais eficiente. Algumas categorias que ficavam mais escondidas e mais difícil de vender, como acessórios, conseguimos fazer o varejo cross-selling, que é expor um item perto do que é produto de referência. Visualiza raquete e junto uma mochila, bolinha, viseira ou boné, o que ajuda na venda. A loja ficou mais agradável, tem mais provadores. Em pontos com maior área, colocamos cafeteria, que traz conceito de alimentação e gera muito fluxo. Não divulgamos números individualizados disso, mas as lojas com café acabam crescendo mais que outras. Outro número: lojas reformadas crescem muito próximo do dobro da velocidade do restante. O foco também é crescer com franquias e aumentar a capilaridade, pois hoje estamos em 150 cidades. A ideia é manter o ritmo atual de abertura de 35 a 40 novas lojas. Não acelera este ritmo porque tem preocupação muito grande em escolher o franqueado correto e ponto.
MV - Quando começam as reformas e quais são as metas?
Tracanella - Começaram em 2021, pelo Iguatemi de São Paulo, e agora estamos acelerando, mas ainda a tem 70% da rede para fazer a reformulação. A boa notícia é que é uma fonte de aumento de venda que vai durar bastante tempo nas mesmas lojas. O investimento é como abrir uma loja nova.
MV - A T&F chegou ao modelo de como tem de ser a loja física no contexto pós-pandemia ou ainda estão testando?
Tracanella - 2022 foi o ano de entender e fazer ajustes. Mas agora está maduro e vamos acelerar as reformas em 2024, mas o número ainda não foi divulgado. Vai levar alguns anos para virar, pois muitas dependem do franqueado. Até fim de dezembro, vamos chegar a 21 unidades no novo modelo.
MV - Quais são os planos para o Rio Grande do Sul?
Tracanella - Abrimos lojas no modelo novo em Porto Alegre (bairro Mont'Serrat) e em Passo Fundo. As unidades do Iguatemi Porto Alegre e Praia de Belas foram reformadas. Tem muita oportunidade de abrir lojas no Estado e é uma das prioridades. Tem muito pontos que estão no radar no mercado gaúcho. Hoje a Track & Field está muito concentrada no Sudeste e depois vem Nordeste. Sul e Centro-Oeste têm presença parecida. A tendência é que se abra mais lojas nas três regiões, além de Sudeste.
MV - Onde vocês gostariam de ter loja no Estado?
Tracanella - É um estado importante, com poder aquisitivo maior. Estamos planejando e temos muita preocupação em identificar o ponto e franqueado. Estamos definindo o plano internamente, com geolocalização. Olhamos poder aquisitivo e proximidade com academias. Tem de ser um lugar onde tenha densidade demográfica mínima, com pelo menos 200 mil habitantes e cliente de classe A e B. A ideia é estar presente em muitos momentos de vida da pessoa, no passeio de bike, jogo, por isso fazemos muitos eventos, como corridas, aulas gratuitas via streaming. São quase 20 anos fazendo isso. Este ano serão mais de 2 mil eventos esportivos. O que reforça que a marca não é só produto, mas experiências ligadas a um estilo de vida saudável.
MV - Como deve fechar o ano?
Tracanella - A nossa marca é muito usada para presente, por isso temos boa performance em Dia das Mães e Dia dos namorados. Mas o fim de ano é muito forte, por isso os primeiros três trimestres são muito parecidos nas vendas e o quarto trimestre realmente destoa. A rentabilidade (lucro líquido sobre vendas líquidas) no acumulado de nove meses foi de 18,% e no terceiro trimestre de 17,7%. É uma rentabilidade muito boa com geração de caixa, o que nos possibilita trabalhar sem nenhuma dívida no balanço. A discussão interna é muto mais em crescimento e não em como refinanciar dívida, que é o cenário de muitas varejistas.
MV - O que explica o desempenho da T&F em meio ao cenário do setor de vestuário com dificuldades nas vendas?
Tracanella - Além de as pessoas estarem se cuidando mais, tem também o fato de não vendermos produtos de commodities, que são os segmentos que sofrem mais, além de termos um consumidor com renda mais alta. Também quase não dependemos de parcelamento e não temos a concorrência de sites chineses.
MV - Os produtos esportivos vêm cada vez mais com tecnologia, o que são aposta da T&F?
Tracanella - Fazemos todo o desenvolvimento e terceirizamos a produção. Cada vez mais tem tecido com proteção solar, anti-odor, mais leve para a transpiração. São tendências e devem ter cada vez mais.
MV - Como é a concorrência de marcas no Brasil, com as gigantes abrindo lojas?
Tracanella - Temos muita concorrência, as marcas globais estão aqui e tem competidores regionais, mas buscamos nos diferenciar com produtos e experiência em loja. Agora estamos desenvolvendo o marketplace de artigos esportivos, que é o TFmall, onde estamos incluindo outras marcas de sellers (vendedores). Mais importante é ter muita consistência na nossa história, de não cair na tentação de ser muito promocional, muito oferteira, além da aposta de eventos que geram fluxo em loja, pois a retirada dos kits é no ponto físico.
MV - Como está a implantação do marketplace?
Tracanella - Ele já está funcionando, com link em nosso site. Tem marcas de tênis mais técnicos para corridas mais longas, por exemplo. É bastante complementar a nossas linhas. Terá muita curadoria e vamos privilegiar a qualidade e não a quantidade de sellers. Não somos uma marca de artigos esportivos, mas de moda esportiva focada em alguns acessórios. Muitos itens nem cabem na loja, então o marketplace acaba endereçando e cumprindo funções importantes.
MV - O que está no radar no conceito de omnicanalidade?
Tracanella - Agora teremos uma segunda onda, que é a chamada vitrine infinita. Vendedora poderá enxergar mais produtos, além do que já tem na loja. Poderá buscar o item para poder enviar para a casa do cliente, o que eleva o potencial de crescimento do e-commerce. Além disso, vamos acelerar a TF Sports, que tem como CEO o Fred Wagner, um dos fundadores da companhia, com ideia de captar treinadores para oferecer aulas a clientes, aumenta usuários e oferecer produtos da T&F e do TFmall. Outra área que estamos vislumbrando é ter marketplace de alimentação saudável, mas estamos construindo e pode começar em 2024. Ainda está sem data um marketplace de saúde, com medicina preventiva. A ideia é ter uma plataforma de wellness, reunindo o grande potencial de entrega da marca, com produtos e serviços. Não tem definição sobre como será a adesão, se por clube de assinatura ou outra forma. Estamos avaliando.
MV - Vocês têm algum benchmark?
Tracanella - Não, esta é uma dificuldade. Seria bom se tivesse para nos inspirar, mas acho que estamos construindo uma coisa diferente, como esta plataforma de wellness.