A Ceitec está em hibernação, mas funcional. É dessa forma que o presidente da Associação dos Colaboradores do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Acceitec), Silvio Luís dos Reis Santos Júnior, define a situação atual da empresa depois do início do processo de liquidação, anunciado em 2020, e pausado depois de um tempo.
“Hoje somos 67 funcionários de carreira, e a empresa não está em produção. Para a retomada, há necessidade de investimentos em pessoal, infraestrutura e equipamentos de produção que estão parcialmente parados devido à liquidação e os baixos investimentos recebidos após 2014”, ressalta. Antes da liquidação eram 180 concursados.
A notícia dada essa semana pela titular do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), Luciana Santos, de que a liquidação da empresa está oficialmente suspensa, é mais um capítulo desta turbulenta história que começou com o sonho do Brasil colocar o seu nome no seleto mapa mundial de produtores de semicondutores.
A Ceitec foi criada em 2008, em Porto Alegre, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. O modelo estatal, como se sabe, não deu a agilidade necessária na tomada de decisões que uma empresa que se propõe a ser competitiva em um mercado tão dinâmico como o dos chips precisa. Foram muitas trocas de presidentes e estratégias.
Sempre questionada por parte da sociedade por ainda ser dependente de recursos do Tesouro, a empresa enfrentou no início de 2019 os primeiros rumores de que seria fechada e os funcionários demitidos. Na época, a informação foi negada pelo MCTI. Meses depois, porém, veio a decisão.
O então secretário executivo do MCTIC, Julio Semeghini, destacou o quadro técnico da Ceitec, com mestres, doutores e especialistas, e grande quantidade grande de patentes e designs de circuitos desenvolvidos, e que, segundo ele, precisam ser preservados.
Mas, reforçou a posição da baixa receita. “O investimento na Ceitec é de mais de R$ 800 milhões ao longo dos anos, e os resultados não têm sido atingidos. A empresa fatura cerca de R$ 15 milhões, e tem um orçamento por ano de R$ 86 milhões”, comentou.
Em 2020, veio a recomendação para a extinção da Ceitec, decisão anunciada pelo Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) – em dezembro do mesmo ano, foi publicado o decreto presidencial que oficializava a decisão. A perspectiva do governo Jair Bolsonaro era transferir projetos e patentes da empresa para uma Organização Social (OS), que ainda seria criada.
“A decisão pela liquidação foi um equívoco, pois ignorou efeitos de atração de investimentos positivos que a empresa vinha tendo à época, mesmo com as dificuldades. Faltaram justificativas robustas para avaliar a companhia. Sem falar que não respeitada a curva de maturação de uma operação de semicondutores que, como se sabe pelos eventos que vemos no mundo todo, é longa”, avalia o engenheiro e professor Adão Villaverde. Ele foi um dos principais articuladores da vinda da empresa para o Rio Grande do Sul e era secretário da Ciência e Tecnologia quando, em 1999, a Motorola bateu martelo e fez a doação dos equipamentos que deram o início à fábrica na capital gaúcha.
Outra questão importante era que uma das expectativas que existia era que a Ceitec pudesse se tornar superavitária a partir de compras feitas pelo próprio governo - é desta forma que companhias deste perfil conseguiram avançar em outros países. A Ceitec projetou e produziu circuitos integrados de nível comercial, com certificações internacionais (Common Criteria, ICAR, EPCglobal, ISSO 9001, IGSEST), para várias aplicações.
“Muitos desses projetos se originaram em demandas específicas do próprio governo federal, que posteriormente não comprou os produtos, como o chip do passaporte, SINIAV, SISBOV, entre outros), frustrando o retorno de anos de investimento da empresa. Esses produtos estão disponíveis para comercialização, com a consequente geração de resultados financeiros”, afirma em nota a Associação dos Colaboradores do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Acceitec).