Ainda não está próximo do fim o caso da juíza Lourdes Helena Pacheco da Silva, titular da Vara do Júri de Porto Alegre. No próximo dia 6 de maio serão, já, dois anos de existência. Ela já recebeu duas penas de censura que a impossibilitam de ser promovida na carreira. As pendengas são notórias no meio forense. E a peça central é a ação cível em que o cadeirante Magnus Rodrigo Cardoso busca reparação por dano moral - por ter sido chamado de "aleijado". A seu turno, a magistrada, como reconvinte, quer indenização - por ter sido chamada de "gorda". A desavença foi na garagem coberta do Shopping Iguatemi.
A sentença condenando a juíza a pagar reparação moral de R$ 7 mil foi proferida em 10 de outubro de 2024, pelo juiz Paulo de Tarso Carpena Lopes, da Vara Cível do Foro Regional do Alto Petrópolis. Uma passagem do julgado: "A requerida Lourdes preferiu outra postura mais agressiva, em vez de se retratar e se retirar".
Na semana passada prosseguiu, na 10ª Câmara Cível do TJRS, o julgamento dos dois feitos cíveis conexos, que desde 26 de março apontavam empate (1 x 1). O desembargador relator Jorge Alberto Pestana isentou a juíza. Na mesma sessão, o desembargador revisor Tulio Oliveira Martins manteve a indenização (R$ 7 mil) e negou a pretensão reconvencional da magistrada. O desembargador vogal Jorge André Pereira Gailhard pediu vista e, na última quinta-feira (24), manteve a condenação cível da juíza.
Esse terceiro voto firmou convicção a partir de som e imagens captados na câmera pessoal usada pelo segurança do Iguatemi que primeiro atendeu a ocorrência. "A discussão não teria ocorrido se a juíza demandada tivesse respeitado o direito do autor, e estacionado nas vagas comuns, destinadas ao grande público" - concluiu o voto. Outro trecho: "As ofensas recíprocas somente tiveram início em razão do agir desmesurado da ré/reconvinte, que optou por estacionar o seu carro na vaga para pessoa com deficiência".
Os 2 x 1 do placar não acabaram com a contenda jurídica. Pelo artigo 942 do Código de Processo Civil devem ser convocados dois outros desembargadores para chegar ao desfecho, em 29 de maio. A lei prevê que "quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento prosseguirá em sessão com a presença de outros julgadores convocados nos termos definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial". (Processo nº 5004771-82.2023.8.21.2001).
Filha secretária contra mãe advogada
Uma surpresa na rotina jurídica: litígio laboral entre filha e mãe. A Justiça do Trabalho gaúcha afirmou a negativa de vínculo empregatício entre uma estudante de Direito e o escritório advocatício de sua genitora. O caso é de Alvorada (RS) e a sentença de improcedência da ação (valor da causa: R$101.279,09) foi confirmada pela 6ª Turma do TRT da 4ª Região (RS). As duas instâncias não identificaram a presença de subordinação e habitualidade, que são elementos exigidos para a caracterização do emprego.
A contenda jurídica colocou em polos opostos Fernanda Roncuni Bica (sem inscrição na OAB/RS como estagiária) e sua mãe Maria Salete Roncuni Bica (OAB/RS nº 31.676). A primeira alegou que "a relação havida, em escritório de advocacia unipessoal, implicava em subordinação técnica inerente à atividade, reforçada pela sua hipossuficiência". A mãe-reclamada sustentou que "a reclamante ia esporadicamente no escritório, na condição de filha, sem horários estabelecidos, levando inclusive os filhos ao escritório". E que, como decorrência familiar, recebia de R$ 1, 5 mil a R$ 2 mil, por mês, "ajudando na redação da parte técnica". Os julgados, nos dois graus de jurisdição, reconheceram ter havido "prestação de serviços pessoais e de forma onerosa". Mas concluíram "não comprovadas a subordinação e a habitualidade necessárias". Detalhe: os depoimentos testemunhais "foram contraditórios quanto à frequência e aos horários de trabalho".
A demanda iniciou em 24 de março de 2023. No recente 15 de abril houve o trânsito em julgado. A filha não ingressou com recurso de revista ao Tribunal Superior do Trabalho. (Processo nº 0020306-07.2023.5.04.0241).
O novo jeito de julgar
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) discordam menos quando julgam os casos no Plenário Virtual. Nesta modalidade os votos são enviados pelo sistema eletrônico da Corte, sem troca de debates nem interação direta entre os magistrados e os advogados das partes. A constatação é de pesquisa inédita realizada por pesquisadores do Insper e da Universidade de Southampton, no Reino Unido. Foram analisados 2,3 milhões de votos e decisões a partir de 1988. A conclusão foi a de que "a chance de um ministro divergir da maioria cai pela metade nesse formato de julgamento".
Pela rotina de agora foram julgados - por exemplos - os recursos de: a) a ação penal contra Fernando Collor; b) os decretos que flexibilizaram o acesso a armas de fogo; c) as ações contra envolvidos nos atos turbulentos de 8 de janeiro.
No ano passado, 98,5% das decisões colegiadas do Supremo foram tomadas nesse formato. Há efetivos avanços em celeridade, mas ficam (irreversíveis) as fragilidades de transparência e a inexistência do debate verbal.
Milhões desconhecidos...
Fernando Affonso Collor de Mello, 75 de idade atual, foi o 32º presidente do Brasil (1990/1992), quando renunciou ao mandato, enquanto respondia a um processo de impedimento aprovado pelo Senado Federal. Agora - 33 anos após o impeachment - ele passa o início de uma temporada no cárcere (até quando, STF?...), para cumprir pena de oito anos e dez meses de prisão. Como se sabe, o pretenso "caçador de marajás" foi também um dos muitos usufrutuários do escândalo do petrolão. Este consistiu na notória dilapidação da Petrobras pelos governos petistas de Lula e Dilma.
Na conjunção, já como senador, Collor se associou à corrupção do PT, o partido que ele mesmo combateu em 1989, como candidato a presidente, então derrotando Lula no segundo turno. Conforme a denúncia que o levou à condenação em 2023 - e só agora ao cárcere - ele recebeu R$ 20 milhões em propina. Tal dinheiro "apareceu" do nada em sua conta, enquanto ele dizia não ter "a menor ideia" da origem -, conforme entrevistas que concedeu durante a tramitação do processo criminal.
Os ministros do STF consideraram que, entre 2010 e 2014, o então senador recebeu a dinheirama como propina para viabilizar contratos da construtora UTC Engenharia com a BR Distribuidora (subsidiária da Petrobras à época). O compromisso "collorido" era também de apoio político para a indicação e a manutenção de diretores da estatal. (Ação penal nº 1.025).
A polêmica: médico x clube
Iniciada em 30 de abril de 2019, a ação trabalhista do ex-médico tricolor Marcio Augusto Bolzoni contra o Grêmio Porto-Alegrense terá - seis anos e uma semana depois - nova etapa no próximo 7 de maio. O reclamante busca exatos R$ 2.441.450,00 a título de horas extras, adicionais noturno e de insalubridade, férias, gratificações, diferenças de FGTS, indenização dobrada, repouso semanal remunerado, sobreaviso, prontidão e tempo à disposição do clube.
Há um ano saiu a sentença, proferida pelo juiz Ricardo Fioreze, da 15ª Vara do Trabalho de Porto Alegre. Foram deferidos: (a) horas extras do trabalho além de 8 horas ao dia, mas só nos dias em que o médico atuou em jogos em Porto Alegre; (b) Dobra sobre a remuneração de férias (com 1/3), em relação a cinco períodos aquisitivos, de 2013 a 2018; (c) Diferenças de repousos semanais remunerados, considerando os valores pagos a título de gratificação-prêmio, por vitórias e títulos; (d) adicional de insalubridade; (e) reparação de R$ 20 mil por dano moral.
Ambas as partes são recorrentes. O recurso será julgado pela 3ª Turma do TRT gaúcho. O relator é o desembargador Francisco Rossal de Araújo - tido por advogados gremistas e colorados como uma das mais lúcidas cabeças da Corte. Na eventual fase de liquidação, o Grêmio deverá fornecer o perfil profissiográfico previdenciário do reclamante, relativo às atividades que importavam na sujeição dele a condições de trabalho insalubres. Em tese, tal detalhe poderá tornar a conta mais pesada. E servirá também para comprovar o direito à aposentadoria especial.
Os advogados Cicero Hartmann e José Pedro Pedrassani atuam em nome do médico. O clube é defendido pelos advogados Mônica Canellas Rossi e Benoni Canellas Rossi. (Processo nº 0020456-26.2019.5.04.0015).