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Marco A. Birnfeld

Marco A. Birnfeld

Publicada em 27 de Fevereiro de 2025 às 18:32

As três esposas

GERSON KAUER/Divulgação/EV/JC
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Marco Antonio Birnfeld
Ernesto era um "bon vivant". Corretor de seguros, tinha uma agenda de clientes não opulentos, mas fiéis, - e também de algumas parceiras para os envolvimentos de cama, com as quais costumava festejar as sextas-feiras. Sempre em sistema de rodízio.
Ernesto era um "bon vivant". Corretor de seguros, tinha uma agenda de clientes não opulentos, mas fiéis, - e também de algumas parceiras para os envolvimentos de cama, com as quais costumava festejar as sextas-feiras. Sempre em sistema de rodízio.
Um dia, para atingir a meta de produção que, pelo volume mensal, lhe garantiria um penduricalho salarial extra na seguradora, Ernesto contratou, como segurado, um seguro de vida em seu próprio nome. O capital segurado era modesto: R$ 33 mil. Solteiro e sem nenhuma relação estável definida como exclusiva, ele indicou como beneficiária simplesmente "a esposa". E dela não a pôs nome, nem sobrenome.
De repente, numa sexta-feira de fevereiro, véspera do Carnaval, Ernesto sofreu um infarto fulminante, que o levou embora da vida terrena. Poucos dias depois, três postulantes "esposas" se apresentaram na seguradora - todas levando documentos e flagrantes da vida em comum: fotografias, notas de hotéis de uma ou duas estrelas etc. E contas de luz, água e telefone em nome dele, Ernesto - com três endereços diferentes.
O diretor regional da seguradora se disse estupefato. Já tinha visto "matriz" e "filial" discutirem por indenizações securitárias. Ou até mesmo duas - e simultâneas - concubinas. Mas três companheiras brigando por "uma micharia de R$ 33 mil" era inédito. Afinal, pagar para quem?
O departamento jurídico da seguradora optou por uma ação de consignação em pagamento contra as três pretendentes. O juiz sentenciou pelo pagamento integral em favor de uma - a que mantivera a "relação aparentemente estável por mais tempo". Só a segunda das três apelou. Mesmo sem recurso das demais partícipes do bolo, a Câmara Cível do Tribunal de Justiça foi salomônica.
- Proponho que mandemos dividir o dinheiro por três - sugeriu o relator.
Mas o revisor e a juíza convocada empacaram num aspecto processual. Como fazer a divisão de 33,33% para cada das companheiras, se uma delas se conformara com a sentença que nada lhe destinara?
- Sejamos criativos, façamos a nossa parte, talvez o Criador Celeste já tenha feito a sua - propôs o relator, conhecido pelo seu coração de generoso magistrado.
Os outros dois concordaram. E assim foi lavrado o acórdão. Dois meses depois, as três contempladas ingressaram juntas na agência bancária, cada qual com seu alvará na mão. Foram sacar individualmente R$ 11 mil, mais rendimentos.
- A gente já imaginava que o Ernesto nunca iria nos deixar mal - disse a mais jovem das três.
Todas saíram felizes, dinheiro na conta, comemorando que o Ernesto sempre fora "um homem bom em tudo". Em seguida, as três foram à igreja mais próxima, para rezar pela alma do finado. E chorosas se lembraram da sexta-feira - véspera do Carnaval de quatro anos atrás - quando ele partiu para uma viagem sem volta.
 

Penduricalhos já são a parte principal da remuneração

Juízes e desembargadores do Brasil receberam em 2024 mais em penduricalhos e adicionais do que com o próprio salário-base. Foi a primeira vez em que isso ocorre, com a análise dos valores relativos a dezembro. O cálculo foi feito pela ONG Transparência Brasil e considera dados referentes a 21 tribunais - federais e estaduais - em 17 estados e no Distrito Federal.
Os pagamentos adicionais aos integrantes dessas Cortes representaram R$ 7 bilhões em 2024; o custo do salário-base no período foi de R$ 5,4 bilhões em valores corrigidos pela inflação. A tabulação financeira considerou tudo o que não é salário formal. Assim entraram na conta as férias, o 13º salário e o penduricalho mais novo: a licença compensatória. Tal graça eleva em um terço a remuneração anual. Ela é paga nos casos de substituição de colegas em férias, ou a quem assume cumulativamente funções vagas.
Em 2024, um magistrado brasileiro ganhou, em média, 46% a mais do que um norte-americano. Valores informados no site do U. S. Department of Labor (Ministério do Trabalho dos EUA) mostram que, lá, um juiz recebeu US$ 243,3 mil em 2024, enquanto o brasileiro recebeu, em reais, o correspondente a US$ 360 mil no mesmo ano.

Radiocorredor informa

A "emissora" que reúne vozes ativas da advocacia de Brasília propagou, esta semana, uma pérola financeira.
Disse assim: "Em conversas reservadas, conselheiros do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) reconhecem que, quando se trata de criação de benesses para o Judiciário, não há paralelo no mundo com o que ocorre no Brasil".
Não há controvérsias.

Custosa vagareza

Entrementes, o sistema judiciário brasileiro é reconhecido como um dos mais onerosos e ineficientes do mundo. Com um custo anual superior a R$ 100 bilhões e um acúmulo de mais de 80 milhões de processos ativos, a morosidade na tramitação de ações é um problema crônico.
Em média, uma decisão definitiva leva mais de cinco anos para ser proferida. Apesar dos altos investimentos, o excesso de burocracia e o desperdício de recursos impedem melhorias significativas no acesso à justiça.

Vínculo inexistente

O precedente está criado. Shopping centers não são empregadores e, assim, não são obrigados a seguir uma das regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Segundo esta, toda a empresa que possui mais de 30 empregadas, com idade acima de 16 anos, deve fornecer local para o cuidado dos filhos durante o período de amamentação.
O entendimento é da 2ª Turma do STF, que manteve decisões inferiores que desobrigam o Shopping Partage, de Campina Grande (PB) de oferecer creche para os filhos de trabalhadoras das lojas. Conforme o acórdão, "não há vínculo de trabalho entre o shopping e as empregadas das lojas". (Agravo em recurso especial nº 1499584).

Responsabilidade solidária

É abusiva a cláusula de contrato entre aplicativo de transporte de passageiros e motociclista que isente o primeiro de responsabilidade em caso de acidente. Isso porque os termos contratuais não são conhecidos pelos clientes da plataforma. No caso julgado, a autora da ação precisou passar por uma cirurgia depois de cair durante viagem de moto contratada por aplicativo. A decisão é do 12º Juizado Especial Cível da Regional do Méier, no Rio de Janeiro.
A inexitosa tese defensiva da empresa fora a de que "o serviço foi contratado por meio de um motociclista parceiro e que o contrato firmado entre eles tem uma cláusula que exime a plataforma de culpa em caso de acidente". (Processo nº 0831907-73.2024.8.19.0208).

Respeito à soberania

O Gabinete de Departamento de Assuntos do Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado dos Estados Unidos afirmou na rede social X, na quarta-feira, 26 de fevereiro, que "bloquear o acesso à informação e impor multas a empresas sediadas nos EUA por se recusarem a censurar pessoas que vivem nos Estados Unidos é incompatível com os valores democráticos, incluindo a liberdade de expressão".
O texto refere, nominalmente, o Brasil. Mas não menciona o Supremo Tribunal Federal (STF), embora faça referência a decisões do ministro Alexandre de Moraes.
A manifestação, traduzida e repostada pela Embaixada dos EUA em nosso País, afirma que "o respeito à soberania é uma via de mão dupla com todos os parceiros dos EUA, incluindo o Brasil".

Justa causa diferente

Um vendedor da Cargill Agrícola que atuava como dirigente sindical concedeu um "desconto-aniversário" de R$ 95 mil a uma empresa cliente, sem a autorização dos gerentes regional e nacional. Como o trabalhador tinha direito à estabilidade sindical, a Cargill entrou na Justiça buscando o reconhecimento de que o caso era de justa causa.
O Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (RN) rechaçou a justa causa. Fundamento: "a conduta do vendedor não caracteriza falta grave, porque o valor não impactou os lucros da empresa, pois os R$ 95 mil não corresponderam nem a 2% do lucro obtido pela Cargill sobre o cliente naquele ano, que foi de R$ 7 milhões".
Ao acolher a pretensão da empresa, a 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) considerou que o vendedor cometeu falta grave ao ignorar as regras da empresa e subverter a ordem hierárquica. (Recurso de revista nº 210060-57.2013.5.21.0010).

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