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Cinema
Hélio Nascimento

Hélio Nascimento

Publicada em 17 de Outubro de 2024 às 19:36

A Garota da Vez, de Anna Kendrick: Os disfarces de um assassino

Dirigido e estrelado por Anna Kendrick, A Garota da Vez estreia nos cinemas

Dirigido e estrelado por Anna Kendrick, A Garota da Vez estreia nos cinemas

DIAMOND FILMS/DIVULGAÇÃO/JC
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Hélio Nascimento
Provavelmente, a maioria dos que forem ver A garota da vez, que marca o primeiro passo da atriz Anna Kendrick como diretora, concordarão com os jurados do Festival de Toronto, que no ano passado conferiram ao filme um prêmio especial destinado a chamar atenção para a nova realizadora. A agora cineasta, conhecida, entre outros, por seu papel em Amor sem escalas, de Jaison Reitman, realizado em 2010 e no qual atuava ao lado de George Clooney, que por vezes também dirige, com êxito, por sinal, mostra segurança na narração e apoiada num roteiro de Ian McDonald, conduz de maneira correta e por vezes inspirada um relato que tem a ver com fatos reais. Não se trata de alguma contribuição marcada por altas doses de criatividade, porém, sem dúvida, em muitos aspectos o filme toca a originalidade e sabe manter a atenção. Ressalte-se também a maneira sóbria como acontecimentos marcados pela violência extrema são registrados, nos quais os apelos para a grosseria e o sensacionalismo são rejeitados. Apostando mais na imaginação do espectador do que na grosseria praticada pelos sem talento, o filme se sustenta como uma boa narrativa, na qual o tema do assassino serial, essa figura que tanto tem fascinado cineastas de vários níveis e propostas, é a figura central, a ameaça não percebida pela sociedade, símbolo de uma civilização que permite sua atuação pelo desleixo, pela burocracia e pela incompetência quase generalizada.
Provavelmente, a maioria dos que forem ver A garota da vez, que marca o primeiro passo da atriz Anna Kendrick como diretora, concordarão com os jurados do Festival de Toronto, que no ano passado conferiram ao filme um prêmio especial destinado a chamar atenção para a nova realizadora. A agora cineasta, conhecida, entre outros, por seu papel em Amor sem escalas, de Jaison Reitman, realizado em 2010 e no qual atuava ao lado de George Clooney, que por vezes também dirige, com êxito, por sinal, mostra segurança na narração e apoiada num roteiro de Ian McDonald, conduz de maneira correta e por vezes inspirada um relato que tem a ver com fatos reais. Não se trata de alguma contribuição marcada por altas doses de criatividade, porém, sem dúvida, em muitos aspectos o filme toca a originalidade e sabe manter a atenção. Ressalte-se também a maneira sóbria como acontecimentos marcados pela violência extrema são registrados, nos quais os apelos para a grosseria e o sensacionalismo são rejeitados. Apostando mais na imaginação do espectador do que na grosseria praticada pelos sem talento, o filme se sustenta como uma boa narrativa, na qual o tema do assassino serial, essa figura que tanto tem fascinado cineastas de vários níveis e propostas, é a figura central, a ameaça não percebida pela sociedade, símbolo de uma civilização que permite sua atuação pelo desleixo, pela burocracia e pela incompetência quase generalizada.
Os fatos narrados são reais e sua reconstituição coloca na tela Rodney James Alcala, que morreu na prisão, em 2011, depois de ter praticado dezenas de assassinatos, iludir a polícia durante vários anos e até mesmo conseguido a liberdade depois de ser preso pela primeira vez. Inclusive participou, em 1978, de um show de televisão no qual foi um dos três homens que, entrevistados por uma moça, deveria ser o escolhido por ela. Uma farsa como tantas outras, mas que colocou em rede nacional uma fera das mais perigosas, especialista em disfarces criados pelo comportamento, nunca por máscaras e sempre por demonstrações de simpatia, cultura e inteligência. No show que o filme reconstitui, ele se mostra capaz de responder perguntas e até mostrar cultura. Aliás, mais tarde, quando consegue um encontro com a jovem entrevistadora, ele se mostra conhecedor do teatro americano atual. A protagonista do filme, uma aspirante a atriz à procura de visibilidade, representa o outro lado de um universo, aquele que busca a fama, sem outro objetivo do que obter sucesso na pretendida a carreira. Mas há algo curioso a ligar as duas personagens. Há um terceiro, que, ao acariciar os cabelos da jovem, antecipa o mesmo gesto do assassino em uma cena seguinte. Essa ligação entre um e outro é também feita num plano em que durante a mudança, o agente é filmado de forma sombria e evitado pela protagonista. Eis o cotidiano unindo uma figura aparentemente normal a uma fera perigosa.
O filme de Kendrick também segue uma lição hitchcockiana: o assassino já aparece na primeira cena. Não é a investigação que interessa e sim a exposição de um perigo não percebido. A cena em que uma personagem é ridicularizada por um funcionário da televisão é mais uma evidência de imaturidade e despreparo. Mais tarde, até numa repartição policial, os apelos são outra vez rejeitados. Outro aspecto a ser destacado são os retrocessos visuais que mostram crimes passados, quando um novo assassinato está sendo preparado. Não estamos diante de uma obra-prima, mas de um filme que, numa época em que são poucos os novos nomes do cinema americano a se destacar, não deixa de ser uma surpresa. A obra de Anna Kendrick procura se afastar das irritantes explosões na faixa sonora e mostra repúdio ao grotesco tão praticado atualmente. E até compensa a exibição daqueles filmezinhos com apresentadoras sorridentes anunciando dramas para breve. Por causa do filme principal, vale a pena suportá-los num cinema que antes primava pela sobriedade e o respeito ao ritual do espetáculo cinematográfico, em vez de imitar a televisão. Se isso é modernidade, então viva o passado. Mas projeção e som continuam ótimos.
 

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