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Cinema
Hélio Nascimento

Hélio Nascimento

Publicada em 22 de Agosto de 2024 às 19:07

Variações dispensáveis

O filme de Shyamalan é também uma demonstração de como uma obra não é apenas os temas abordado

O filme de Shyamalan é também uma demonstração de como uma obra não é apenas os temas abordado

Warner Bros. Pictures/Reprodução/JC
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Hélio Nascimento
Todo diretor tem o direito de ter os seus modelos, e mesmo ídolos. Assim, há os fascinados por gêneros e aqueles que não escondem sua admiração por nomes que o antecederam. M. Night Shyamalan mostra neste Armadilha que tem grande interesse na obra de Hitchcock. Mais do que isso, pretende revelar neste trabalho que está preparado para deixar sua contribuição ao tema edipiano que aquele cineasta abordou com êxito em filmes como Os pássaros e, principalmente, em Psicose. No entanto, o que vemos é uma verdadeira aula de como desperdiçar uma ideia que merecia tratamento bem melhor do que pode ser visto na tela. Há muito do que era conhecido como o mestre do suspense, mas era muito maior do que sugere tal definição. O filme de Shyamalan é também uma demonstração de como uma obra não é apenas os temas abordado, e tem seus méritos nas variações tecidas a partir da proposta original.
Todo diretor tem o direito de ter os seus modelos, e mesmo ídolos. Assim, há os fascinados por gêneros e aqueles que não escondem sua admiração por nomes que o antecederam. M. Night Shyamalan mostra neste Armadilha que tem grande interesse na obra de Hitchcock. Mais do que isso, pretende revelar neste trabalho que está preparado para deixar sua contribuição ao tema edipiano que aquele cineasta abordou com êxito em filmes como Os pássaros e, principalmente, em Psicose. No entanto, o que vemos é uma verdadeira aula de como desperdiçar uma ideia que merecia tratamento bem melhor do que pode ser visto na tela. Há muito do que era conhecido como o mestre do suspense, mas era muito maior do que sugere tal definição. O filme de Shyamalan é também uma demonstração de como uma obra não é apenas os temas abordado, e tem seus méritos nas variações tecidas a partir da proposta original.
No caso, tudo começa quando um pai leva à filha a um desses espetáculos que costumam esconder suas limitações com lances pirotécnicos muito bem executados. É um sinal dos tempos, mas igualmente uma infantilização que poderia ter méritos maiores se não fosse limitado pelo intuito de explorar desejos de transformar em ritos insatisfações prisioneiras e algemadas. A agressividade está visível principalmente na figura do pai, que nas primeiras cenas ficamos sabendo se tratar de um assassino serial, chamado pela polícia de "o açougueiro", título, por sinal, de um dos melhores filmes de Claude Chabrol.
Eis a proposta principal. A lei e a ordem procuram um criminoso, que pertence a um mundo familiar que parece perfeito. Esta primeira parte do filme até que é interessante. O pai/criminoso percebe desde o começo que está sendo ameaçado de prisão e, por isso, tenta encontrar um meio de burlar a vigilância, que é grande durante o show. É quando aparece a imagem de uma mulher com um ar ameaçador. Claro, é uma referência à atriz Jessica Tandy, a mãe ciumenta de Os pássaros. Aqui, ela não representa em tempo real o matriarcado, como em Hitchcock, mas surge com o simbolismo ampliado, pois também é a representante da civilização, uma especialista em estudar o comportamento e os métodos dos transgressores. À medida que o tempo passa, tal figura vai se mesclando com a imagem materna-repressora. Ela surge como um fantasma do qual o protagonista não consegue se livrar. Dessa forma, a polícia vista no filme não é apenas uma corporação: também suas imagens formam um símbolo poderoso do qual o protagonista se esforça para escapar.
Infelizmente, as limitações do diretor, que tem títulos merecedores de alguma atenção em seu passado - e o nome artístico da cantora certamente é uma referência a Edgar Alan Poe, provável ídolo literário do cineasta - passam a dominar as ações, após o fim do espetáculo. São muitas as confusões ridículas e resoluções inaceitáveis, como se houvesse pressa em concluir o relato. A partir de tal ponto, Shyamalan parece mais interessado em terminar logo com a narrativa, sem dar a mínima atenção para qualquer verossimilhança. É quase uma ofensa ao espectador, o que aparece na tela, tal a confusão armada por um roteiro que parece fruto de amadorismo ou incompetência. E o sorriso do monstro, uma cópia do plano final de Psicose, parece um deboche ao espectador, algo que é acentuado nos créditos finais.
Às vezes, é melhor deixar os clássicos em paz. É verdade também que alguns realizadores de filmes mereceriam mais respeito e atenção se conhecessem suas limitações. E, como tal não acontece, seguidamente chegam às telas produtos como este, mais um a convidar o admirador do cinema a ficar em casa, vendo clássicos indispensáveis em telas pequenas. A indústria do espetáculo escolheu o caminho da autodestruição e, com isso, tem dado alguma razão aos saudosistas, um termo que está perdendo seu significado original para se transformar numa espécie de clamor pela volta do cinema a seu espaço. Aquele no qual, no lugar de elementos deletérios, apareçam sinais renovadores.
 

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