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Cinema
Hélio Nascimento

Hélio Nascimento

Publicada em 04 de Julho de 2024 às 19:56

Prelúdios

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Hélio Nascimento
Todos têm seus filmes preferidos, geralmente listas formadas por dez títulos, o que - de certa forma - é uma injustiça, pois a História do Cinema não deveria ser marcada por uma espécie de tirania criada pela tradição resultante do fascínio pelas dezenas. E há também grandes cenas a serem lembradas, partituras não esquecidas e epílogos marcantes a ser relacionados. É um direito de cada espectador colocar naquela galeria erguida pela memória trechos diversos, imagens que permanecem intactas diante da força dos ventos criada pela indispensável e eterna renovação.
Todos têm seus filmes preferidos, geralmente listas formadas por dez títulos, o que - de certa forma - é uma injustiça, pois a História do Cinema não deveria ser marcada por uma espécie de tirania criada pela tradição resultante do fascínio pelas dezenas. E há também grandes cenas a serem lembradas, partituras não esquecidas e epílogos marcantes a ser relacionados. É um direito de cada espectador colocar naquela galeria erguida pela memória trechos diversos, imagens que permanecem intactas diante da força dos ventos criada pela indispensável e eterna renovação.
Por tudo isso - e até por antecipar o valor mais relevante de certas obras - as aberturas, os prelúdios, os prólogos (tomando emprestado termos de outras artes) de certos filmes também mereceriam ser lembrados, até porque antecipam e resumem o que será visto depois. Mesmo os que, felizmente em bom número, permanecem fiéis às salas de exibição, sobretudo àquelas cujas condições técnicas respeitam o espectador, reconhecem que meios de reprodução de filmes em casa possibilitam que clássicos sejam vistos, tornando assim mais familiares obras que antes eram apenas referências e até lendas cinematográficas. Antes, raramente as empresas produtoras providenciavam reapresentações de filmes realizados anos antes, mas o número era reduzido, nada comparável ao que meios atuais permitem. Portanto, será curioso e, de certa forma, importante lembrar obras inteiras e trechos memoráveis.
Alguns cineastas aproveitavam os créditos iniciais e faziam os mesmos acompanharem a cena de abertura. Uma das mais notáveis - e talvez a que mais expressa a função de tal recurso - é aquela que David Lean realizou para Lawrence da Arábia, dirigido em 1962. Num filme que trata do tema da alienação, da crença de um personagem fascinado por uma missão destinada a valorizar seu papel na História (quando, na verdade, ele é um instrumento de interesses mais fortes) e, ao concretizar de maneira falsa uma espécie de sonho (na verdade, uma maneira de ocultar aspectos de sua personalidade), a abertura resume tudo.
Ao som de uma expressiva partitura de Maurice Jarre, regida por Sir Adrian Boult, com a câmera colocada no alto e assim reduzindo o tamanho do personagem, ele aparece como dono da situação, preparando sua máquina que logo em seguida o transformará em um soberano das estradas, com a visão alterada por óculos que transformam seu rosto. Quando a realidade intervém na cavalgada deste herói imaginário, sobram aqueles óculos, pendurados numa árvore. O filme fica assim resumido.
Outro grande prologo é o que Henry Hathaway realizou para a A raposa do deserto, filme produzido em 1951. Uma tentativa de eliminar o Marechal Rommel durante a Segunda Guerra Mundial é encenada com grande virtuosismo e serve para explicar a fama daquele comandante alemão durante sua permanência na África. E seria injusto esquecer o nome do montador desta prodigiosa sequência: James B. Clark.
Outra abertura notável e antológica é a de A marca da maldade, que, em 1958, pontuou a volta de Orson Welles a um estúdio de Hollywood. Mas ao contrário do que o cineasta pretendia, a Universal colocou os créditos sobre as imagens, quando Welles queria colocá-los no final - abrindo, assim, todo o espaço para aquele plano-sequência. Só anos mais tarde, a empresa produtora editou o filme de acordo com os planos do cineasta, com os créditos apresentados depois do fim da narrativa. A sequência também utiliza a faixa sonora para anunciar o atentado que dará início à trama.
E há um filme nacional marcado por uma notável sequência de abertura: Tocaia no asfalto, realizado por Roberto Pires, em l962. O próprio diretor, que viveu entre 1934 e 2001, é o responsável pela montagem, sendo ele, portanto, inteiramente o autor desta cena perfeita em todos os sentidos. Antes, Pires tinha realizado A grande feira, o primeiro filme de um ciclo baiano, mas depois de Tocaia... não conseguiu a mesma repercussão. O longa-metragem integrou uma mostra comemorativa e destinada a assinalar os 80 anos da primeira filmagem feita no Brasil, pelo, italiano Affonso Segreto, organizada pela Embrafilme e exibida em Porto Alegre pelo cinema Scala, em maio de 1978.
 

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