Na última semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou uma série de medidas voltadas ao combate à violência contra as mulheres no Brasil. Carro-chefe das mudanças, o feminicídio passa agora a ser classificado como um delito autônomo no Código Penal e não mais uma qualificação do homicídio. Além disso, a pena para essa infração é agravada, podendo chegar a 40 anos de reclusão - a maior prevista pela legislação brasileira.
O chamado "Pacote Antifeminicídio" originou-se do Projeto de Lei (PL) 4.266/2023, proposto pela senadora Margareth Buzetti (PSD-MT). O projeto foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em novembro do ano passado e, após um relatório favorável do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), seguiu diretamente para a Câmara, onde foi encaminhado para a sanção presidencial.
De acordo com o presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (ADPESP), André Pereira, uma das principais vantagens da nova classificação criminal que diferencia o feminicídio do homicídio está na melhoria das estatísticas. Segundo ele, o Brasil enfrenta um déficit de dados sobre essa problemática, o que dificulta o combate efetivo à violência contra as mulheres.
"Todos sabemos o quão importante essa pauta é para o nosso país. No entanto, atualmente, existe uma certa complexidade em medir as estatísticas relacionadas ao feminicídio, uma vez que ele era apenas considerado um homicídio qualificado. A criação de um tipo penal específico permite a formulação de estatísticas mais precisas sobre esse crime. A partir disso, teremos uma maior clareza sobre a real situação que precisamos enfrentar", destaca.
O especialista diz observar com bons olhos o pacote de mudanças como um todo, mas alerta que ele será insuficiente sem uma efetiva atuação do Judiciário na sua implementação. "Não teremos resultados satisfatórios imediatos apenas com o aumento da pena e essa distinção criminal. É fundamental que haja estrutura para que as polícias civis possam investigar os casos e que o Ministério Público e o Poder Judiciário atuem com mais celeridade. Precisamos saber como executar essas leis", ressalta.
Outras medidas
A nova norma também impõe um aumento significativo nas penas para casos de lesão corporal contra a mulher, além de agravar as sanções para crimes contra a honra, como injúria, calúnia e difamação. Da mesma forma, as penas para o crime de ameaça e para o descumprimento de medidas protetivas também serão mais severas.
Em relação às saídas temporárias — conhecidas como "saidões" —, os condenados por crimes contra a mulher, agora, devem utilizar tornozeleira eletrônica durante o período de liberdade. Além disso, esses indivíduos perdem o direito a visitas conjugais.
De acordo com a lei de contravenções penais (Decreto-Lei 3.688/41), para o crime de agressão praticado contra a mulher em razão de sua condição de sexo feminino, a pena de prisão simples, que varia de 15 dias a três meses, será aumentada em até três vezes.
Já o crime de ameaça, que normalmente resulta em detenção de um a seis meses, a pena será aplicada em dobro se a ameaça for direcionada a uma mulher em razão de sua condição de sexo feminino. Além disso, é importante destacar que a denúncia neste caso não dependerá de representação da vítima, permitindo que as autoridades tomem medidas sem a necessidade de uma manifestação prévia da ofendida.
O texto prevê, ainda, tramitação prioritária para os processos que apuram crimes contra a mulher, bem como isenção de custas, taxas ou despesas. Outro ponto importante é a determinação de que, se o preso ameaçar ou praticar novas violências contra a vítima ou seus familiares durante o cumprimento da pena, ele será transferido para um presídio distante do local de residência da vítima.