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Publicada em 25 de Junho de 2024 às 01:25

Aborto legal e as idiossincrasias reinantes no Congresso Nacional

Artigos de renomados juristas gaúchos e do Brasil

Artigos de renomados juristas gaúchos e do Brasil

/Arte/JC
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Jornal do Comércio
A Câmara dos Deputados, em uma manobra pouco ortodoxa do seu presidente, aprovou, na última semana, a tramitação em regime de urgência do Projeto de Lei 1904/2024, proposto pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), integrante da ala bolsonarista e evangélica, que altera, sensivelmente, as regras de tratamento do crime de aborto.
A Câmara dos Deputados, em uma manobra pouco ortodoxa do seu presidente, aprovou, na última semana, a tramitação em regime de urgência do Projeto de Lei 1904/2024, proposto pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), integrante da ala bolsonarista e evangélica, que altera, sensivelmente, as regras de tratamento do crime de aborto.
O deputado propõe a criação de duas aberrações: a primeira é a figura da viabilidade fetal presumida nas gestações acima de 22 semanas. A segunda, decorrente da primeira, estabelece uma exceção da exceção, ou seja, passadas as 22 semanas, a mulher estuprada, terá que seguir com a gestação de uma gravidez decorrente de um ato de violência sexual e terá que carregar um feto fruto de um estupro em seu ventre.
Os congressistas que apoiam esse PL esquecem que o Brasil tem dimensões continentais, para além disso, há muitos locais desatendidos ou sub atendidos em relação ao serviço público de saúde. Nessas localidades, que sequer há médicos, não ocorrem estupros que resultam em gravidez? Como ficam as mulheres grávidas nessa situação, que têm que procurar assistência médica em municípios mais estruturados e longe da sua residência, assistências médicas que demoram meses e meses para serem agendadas?
Ademais, não se pode olvidar que as autorizações legais para a prática do aborto, em especial o decorrente de estupro, estão atreladas à dignidade da gestante. A Organização Mundial da Saúde destaca que a gravidez resultante de estupro é um fator de risco para a saúde mental das mulheres, recomendando que os sistemas de saúde ofereçam suporte psicológico adequado e acesso ao aborto seguro. Era isso que o Congresso deveria estar preocupado em legislar, bem como fiscalizar se o Poder Executivo está oferecendo atendimento à gestante nessa situação.
Esse PL tem o apoio da Frente Parlamentar Agropecuária, da Frente Parlamentar Evangélica e da bancada da bala, três dos grupos mais conservadores do Legislativo brasileiro - causa inveja aos países fundamentalistas como o Irã que, desde 2004, autoriza o aborto em situações de risco à gestante e nas hipóteses de má formação do feto, bem como no caso de estupro. Que Deus ilumine o parlamento, para rejeitar esse aberrante projeto, que pune a vítima duas vezes.
Advogado criminalista

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