O período de transição da Reforma Tributária, em 2024 e 2025, quando serão aprovadas as leis complementares pelo Congresso Nacional, é considerado crucial para equacionar, ou ao menos minimizar, pontos que podem resultar em problemas futuros para alguns segmentos produtivos. Passado este período, dificilmente será possível garantir mudanças no longo prazo.
Outro ponto de preocupação é a vigência, durante a transição, de dois regimes tributários, com bases de cálculos e alíquotas diferentes. O fato pode ser gerador de questões contenciosas, tendo como destino final a judicialização. Mesmo caminho pode ser o dos benefícios fiscais atuais ou individuais do ICMS, que têm prazo de vigência além de 2032, quando a Reforma deverá estar totalmente incorporada. A tendência é de perda de benefícios mesmo com investimentos já feitos.
Os alertas foram feitos pelo advogado Marcos Aurélio Valadão, um dos sócios do grupo Ferraro, Rocha e Novaes, de Brasília, durante o workshop sobre Comércio Internacional: Aspectos Tributários, que marcou a parceria com o escritório Augustin Advogados Associados, de Caxias do Sul, com o objetivo de oferecer ao mercado um suporte especializado e com reconhecimento no exterior. Representante brasileiro na Organização Mundial do Comércio (OMC), Valadão ainda elencou como potenciais problemas a extinção de algumas regras especiais do Reintegra e aduaneiras, o fim da recuperação de créditos sobre o custo da energia, e a cumulatividade residual, pois o consumo pessoal e o imposto seletivo não serão geradores de crédito.
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Mesmo advertindo para estes possíveis problemas, o especialista entende que a Reforma Tributária trará benefícios à sociedade, principalmente quanto à simplificação do sistema com a extinção de impostos cumulativos. Destaca que os dois novos tributos, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), são IVAs típicos, semelhantes aos europeus, que devem reduzir os problemas com a cumulatividade e aproveitamento de créditos. "A expectativa é positiva com o novo sistema. Porém, é preciso prestar atenção na fase de transição para não contaminar os negócios e prejudicar o planejamento da empresa", recomendou.
Marcos Valadão destacou, ainda, que a tributação sobre o mercado internacional, envolvendo exportações e importações, é um tema importante, que merece atenção especial das empresas localizadas em regiões industriais, como a Serra Gaúcha. Segundo ele, a competitividade deve ser o foco central, com destaque para pontos como preço e prazo. "Alguns fatores estão sob controle da empresa, outros nem tanto e há ainda aqueles que podem ser contestados", relatou.
Salientou que o comércio internacional é regulado desde 1947 por meio de acordo mundial que colocou fim às brigas comerciais após a Segunda Guerra. "Existem normas que devem ser cumpridas, como tributação igual para produtos importados e fabricados localmente. Logicamente, países precisam criar subsídios para defender sua economia. Por isso, o tema é complexo e suscetível a vazamentos, o que exige monitoramento contínuo", salienta.
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O especialista assinala que na importação o problema mais sério é a sobreposição de tributos, que às vezes funciona de forma positiva, outras vezes não. "O sistema torna a tributação mais alta na importação do que sobre o produto interno. Pode trazer vantagem de barreira comercial disfarçada", frisa. Já na exportação o problema é a cumulação dos tributos. "Alguns estados são mais eficientes na restituição do ICMS do que. A Reforma Tributária vai equalizar este ponto", sustenta.
Outro entrave para o comércio internacional é a burocracia. Valadão atenta para a demora na liberação de licenças para abertura de empresas ou investimentos. Ele reconhece que são diversas as controvérsias sobre passivos para creditamento de impostos. Para Valadão, a complexidade tem feito com que o Poder Judiciário seja resistente em relação aos contribuintes, embora existam várias janelas para a recuperação dos créditos.
Outras questões aduaneiras com potencial de judicialização são transações não vinculadas com terceiros, como desenvolvimento de marca e manutenção de máquinas; excesso de prazo na conferência aduaneira; e subvaloração e subfaturamento, que embora pareçam similares, são conceitos jurídicos diferentes, que podem levar à multa fiscal indevida.
Mudanças nas leis são recentes
Mudança recente no comércio internacional é tratada na Lei 14.596, do ano passado, e versa sobre preços de transferências que envolvem multinacionais vinculadas.
"Antes da lei, as margens eram fixas. Agora, seguem normas da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que são mais complexas. Nas transações entre empresas relacionadas e com sede em paraísos fiscais, o preço não é necessariamente aquele se pode usar na contabilidade, o sistema é agora pensado para proteger a base tributária do País. Deixou de ser tema jurídico para tornar-se estatístico e de economia", alertou Marcos Valadão.
Como solução para evitar litígios, sugere uma antecipação de acordo de preços, pois a judicialização é um processo demorado. "Em países com Judiciário considerado rápido nas decisões, como na Austrália, por exemplo, o prazo pode de três a cinco anos", citou.
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Outro tema novo, também de 2023, é a criação do Centro de Julgamento de Penalidade Aduaneiras (Cejul). Anteriormente, as penas eram julgadas pelo delegado da Receita Federal, com reduzidas chances de absolvição. Com o Cejul, o julgamento é feito separado da Receita em duas instâncias.
O advogado Sérgio Augustin estima que 3 mil empresas localizadas na Serra Gaúcha atuem no mercado internacional, com importações e exportações. Segundo ele, o tema é de difícil enfrentamento, o que exige especialização.
"O que pretendemos com esta parceria é dar o suporte necessário e qualificado ao setor empresarial. Sabemos o quanto é difícil acessar os órgãos públicos de Brasília. Com um corpo técnico especializado na Capital Federal, garante-se o atendimento diferenciado", reforça.