Walter Nunes Oleiro
Professor e integrante da Comissão de Estudos de Auditoria Independente do CRCRS
O estudante do curso de graduação em Ciências Contábeis tem, em sua perspectiva profissional, várias possibilidades de atuação. Dentre elas, a auditoria independente é a carreira que desperta muitas curiosidades e atenção.
Os escândalos promovidos pelas fraudes no início do século, tal como o caso da Enron, que teve grande repercussão na atuação das auditorias e, mais recente o caso das Americanas, são cases que motivam discussões acadêmicas entre a fundamentação teórica e as práticas do mercado.
Na sua trajetória acadêmica, o estudante vivencia trilhas de conhecimentos, arranjadas por uma matriz curricular, com o objetivo de desenvolver as habilidades e competências para o exercício da profissão. O Projeto Pedagógico do Curso (PPC), instrumento com a clara concepção de cada curso, com suas peculiaridades, seu currículo pleno e operacionalização, além de elementos estruturais, deve estabelecer a organização curricular explicitando, dentre outros, os seus componentes curriculares integrantes.
Diante disto, a complexidade de um currículo exige que se pense na multiplicidade de fatores que intervêm no processo educativo, os quais são intimamente associados às determinações socioculturais que perpassam o processo. Fundamental se torna, pois, entender o currículo como expressão de um projeto pedagógico construído coletivamente, que possibilite a construção de conhecimentos fundamentais à formação de cidadãos, dentro de uma visão ampliada, participativa e contextualizada ao seu entorno social.
As atuais Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) do curso de graduação em Ciências Contábeis, instituídas pela Resolução CNE/CES Nº. 1 de 27 de março de 2024, como resultado de uma proposta encaminhada pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), não define eixos de formação, mas estabelece uma estrutura para a organização do curso no seu PPC.
Sem especificar conteúdos curriculares de formação básica e formação profissional, indica para a organização curricular uma matriz com componentes obrigatórios e optativos, formada por um conjunto de conteúdos, incluindo as formas de realização da interdisciplinaridade, modos de integração entre conceitos e práticas e inserção da inovação.
O Apêndice I (Resolução nº. 1), elenca cinco tópicos de habilidades gerais e sete tópicos de competências e respectivas habilidades técnicas. Dentre as habilidades gerais, destaca-se a realização de trabalhos de auditoria e asseguração. No rol das competências, ressalta-se o de auditar informações financeiras e não financeiras e fornecer outros serviços de asseguração e suas respectivas habilidades.
Na ótica do mercado, a respeito da carreira de auditor, pesquisas têm demonstrado que ainda existem lacunas a serem preenchidas na formação do profissional contábil que pretende atuar no segmento da auditoria. Os pontos levantados indicam que os programas de ensino na graduação de Ciências Contábeis são inferiores aos padrões adotados internacionalmente.
Aliado a isso, tanto os atores da academia como os de mercado acreditam que os assuntos discutidos nos cursos não contemplam plenamente as exigências do mercado de trabalho. Temas como auditoria de entidades do terceiro setor, auditoria de órgãos governamentais, auditoria de sistema de informações e recomendações à política de gestão da empresa são pouco discutidos em detrimento de outros, tidos como de maior relevância (assuntos relacionados à estrutura do relatório de auditoria, sistema de controle interno e ao ambiente propicio à fraude).
Conhecimentos sólidos sobre o controle interno, em especial à sua avaliação pela auditoria e os conhecimentos básicos em tecnologia são exigências do mercado para o acesso dos futuros auditores. Como habilidades, o mercado da auditoria deseja um profissional capaz de desenvolver atividades em equipe e possuir boa comunicação.
Nessa perspectiva, aliada à necessidade de adequar seus projetos pedagógicos, esta é uma oportunidade para que os cursos de graduação em Ciências Contábeis reflitam sobre seus conteúdos curriculares, em especial, à disciplina de auditoria independente, proporcionando um olhar promissor para os acadêmicos que sonham em tornar-se auditor.
Como bem disse o professor Eliseu Martins, "é importante realmente mencionar que ainda existe, e fortemente, no mundo profissional, a ideia de que a academia é uma coisa e que o mundo real da prática é outro".